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Como funciona um rodeio?

Importado dos EUA nos anos 80, o rodeio leva às arenas mais público do que o futebol coloca nos estádios. Veja como funciona este esporte arriscado.

Por Gabriela Aguerre e Ivonete Lucirio
Atualizado em 11 nov 2016, 19h27 - Publicado em 12 dez 2006, 22h00

Abre-se a porteira. O touro escapa feito um dragão enfurecido, corcoveando e soltando baforadas pelas ventas. Sobre seu lombo, o homem se segura como pode, com o braço levantado, a respiração presa, as esporas sem ponta batendo nos flancos do animal. Durante 8 segundos, o público vibra numa torcida unânime para o representante da espécie humana. Até que toca a sirene: peão e montaria se separam. Como o peão não se espatifou na arena, a audiência aclama o herói, sem pensar na pobre coluna do boiadeiro nem no incômodo que o animal possa estar sentindo com a cinta de lã que lhe aperta o ventre. Isso não importa. O que interessa é o show.

A cena acima se repete com freqüência cada vez maior no interior do Brasil. Segundo a Federação Nacional do Rodeio Completo, as 1 200 competições realizadas no Brasil em 1997 reuniram 24 milhões de espectadores – 7 vezes mais que os jogos do Campeonato Brasileiro de Futebol daquele mesmo ano. Em Barretos, interior de São Paulo, acontece a Festa do Peão de Boiadeiro, a maior do país, com uma multidão de adeptos do estilo country acompanhando aos gritos o duelo entre homens e bichos. Apeie nas páginas seguintes para ver e entender, em detalhe, esse espetáculo que reúne habilidade, coragem, poeira e um bocado de adrenalina.

Se ficar o bicho pula

Por ser a mais perigosa, a prova de montaria em touro, ou bullriding, é a mais empolgante

Arena das feras

Prova de resistência

Como em toda prova de montaria, o peão tem que se manter 8 segundos sobre o animal. Só assim ele ganha uma nota, que varia de 0 a 100 – a soma dos pontos dados pelos dois juízes. Quanto mais o touro corcovear e o peão esporear, maior a nota.

Equipamento de luta

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• O sedém é uma tira feita de lã ou de rabo de cavalo. Atado à virilha do bicho, estimula os pulos.

• Com uma luva, o peão segura a corda americana (de náilon ou rami, uma fibra vegetal), presa no touro.

• Para não ferir, a espora não tem pontas nem gira quando é esfregada no animal.

• O colete é fundamental porque protege o tronco do peão ao descer ou cair.

Botando pra quebrar

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Um estudo do preparador físico Denilson Santiago, da Federação Nacional do Rodeio, mostra que são freqüentes as distensões enquanto o peão está montado, e as torções e fraturas quando ele cai.

Tipos de acidentes mais freqüentes:

Fratura – 56%

Torção – 30%

Distensão muscular – 14%

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Gigante com chifres

É preciso muita força e agilidade para dominar o touro, que pode ser 15 vezes mais pesado que o peão.

Raças: nelore, holandês, caracu, red bull.

Peso: de 600 a 1 100 quilos.

Comprimento: 2,3 metros.

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Altura: 1,6 metro.

Tranco pesado

Cada pulo do animal é sentido pela coluna do peão como se ele tivesse caído sentado no chão. A repetição dos impactos pressiona os discos gelatinosos que separam as vértebras, principalmente as da região lombar. Por isso, é comum ele ter hérnia de disco.

E o bicho, o que pensa?

“Os homens se divertem às custas do sofrimento do animal”, afirma a veterinária Irvênia de Santis Prada, da Universidade de São Paulo. “Além da dor física, eu estou convencida de que o barulho, as luzes, e as cordas causam estresse.” O ponto mais polêmico é o sedém, a faixa amarrada perto da virilha do touro e do cavalo para fazê-los pular. Mas, segundo um laudo da Universidade Estadual Paulista (Unesp), a amarra não causa lesão alguma. Só que, para Irvênia, mesmo sem machucados aparentes é impossível provar que o bicho não sinta dor. De acordo com ela, o sistema nervoso dos bovinos e dos eqüinos é parecido com o humano. E um homem, com uma faixa espremendo o baixo-ventre, ficaria incomodado. Os organizadores dos rodeios se defendem: “Todo dono de tropa quer que seu animal permaneça saudável”, diz Flávio Silva Filho, presidente do grupo Os Independentes, que organiza a festa de Barretos. Para ele, o touro e o cavalo pulam porque o sedém incomoda, como um relógio apertado demais. “Esses bichos são mais bem tratados do que os que não participam de competições”, diz.

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Com jeito caipira

Inventado no Brasil, o cutiano, uma prova a cavalo, não existe nos rodeios internacionais

Cavalo na mira

Contando os pontos

No cutiano, o peão também precisa ficar em cima do cavalo por 8 segundos. Mas o que conta ponto são as esporeadas que ele dá no animal. Cada um dos 3 juízes da prova dá notas de 0 a 100, avaliando a montaria e o cavaleiro. A nota intermediária é a que vale.

Peão a cavalo

• A mão de apoio segura as rédeas, formadas por duas tiras de corda de sisal.

• Os pés apoiados nos estribos ajudam a manter o equilíbrio.

• É usado o mesmo tipo de sedém do bullriding, preso na virilha do animal.

• O arreio é de couro, tipicamente brasileiro.

O jeito americano

Sela

Também chamada de saddle bronc, é a modalidade mais antiga nos EUA. O peão se apóia nos estribos, senta sobre uma sela e se segura num cabo de 1,20 metro de comprimento.

Bareback

É o teste que exige maior preparo físico. Sem estribos, o único apoio é uma pequena alça, onde o peão se segura. Sobre uma sela pequena, fica quase deitado nas costas do cavalo.

Saltador ágil

Menor e mais leve do que o touro, o cavalo se agita com vigor na arena.

Raças: árabe, crioulo, manga-larga e quarto-de-milha.

Peso: 400 quilos.

Comprimento: 2,3 metros.

Altura: 1,6 metro.

No Velho Oeste ele nasceu

O rodeio surgiu nas fazendas, como atividade de exibição e disputa entre os trabalhadores depois da lida. Foi assim no Oeste americano, em 1867, com os caubóis, que passavam o tempo livre brincando de montaria e laço. Foi assim também em Barretos, no interior de São Paulo, cuja atividade econômica principal é a agropecuária. O primeiro registro de rodeios na cidade é de 1955. Enquanto o gado era levado das fazendas para os frigoríficos, os peões competiam entre si “para sair da rotina”, conta Flávio Silva Filho, do grupo Os Independentes. No começo, as competições eram realizadas em circos improvisados, e o cutiano era a prova da moda. Só nos anos 80 é que a coisa pegou fogo. Regras e estilos foram copiados do rodeio americano e descobriu-se um filão comercial. Caipira virou country, peão virou caubói. Para quem acha que o rodeio daqui é igual ao ianque, um aviso: “Os brasileiros se divertem muito mais que os americanos”, diz Jerry Beagley, caubói do Kansas que presta consultoria aos rodeios brasileiros.

Capturado pelo pescoço

O laço de bezerro, ou calf roping, é uma imitação da rotina do trabalho nas fazendas

A presa ao lado do predador

Ganha o mais rápido

Três juízes cronometram o tempo da prova. Vale a marcação intermediária e ela não pode ser maior que 2 minutos. Se o laçador sair do boxe antes do bezerro, é punido com 5 segundos a mais na contagem do tempo final.

Dois contra um, em sintonia fina

A modalidade nasceu com os americanos que precisavam laçar bois adultos. Como a missão era difícil para um homem só, trabalhava-se em dupla. Na prova, é usado um boi jovem, mas de uma raça que tenha chifres, com média de 2 anos e peso de 90 a 150 quilos.

1. O cabeceiro é o laçador que deve pegar a cabeça. Ele é o primeiro a sair em disparada atrás do boi.

2. O peseiro, que deve laçar os pés traseiros do animal, sai logo após o cabeceiro.

3. Esta é a posição final, com os laçadores de frente um para o outro e as cordas que prendem o boi esticadas.

Com sotaque americano, uai

A indumentária é de caubói: calça jeans importada, chapéu made in Texas, e fivela com a inscrição Champion Bullriding. Mas por dentro da roupa, o peão é bem brasileiro. Rogério Ferreira, campeão de montaria em touro, que compete no circuito de Las Vegas, EUA, nasceu em São João das Duas Pontas, interior de São Paulo. Mal sabe falar inglês. Ele é um exemplo do mingau de culturas que embala o rodeio praticado aqui no Brasil. “A Festa do Peão é um evento mundial”, analisa a antropóloga Maria Celeste Mira, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, que está trabalhando em uma tese sobre rodeio. Essa festa tem, sim, características do rodeio original praticado nos EUA, “mas isso não tira a brasilidade das nossas competições”, diz a pesquisadora. A cultura local é perceptível nas tradicionais modas de viola sertanejas, na religiosidade, no uso do tradicional berrante e nas comidas típicas. Entretanto, o know-how americano entra de novo nas refinadas estratégias de marketing para a venda de cds, roupas de grife e acessórios, importados ou nacionais.

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