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Árvores da vida

Em geral, enxerga-se a floresta, raramente as árvores que a compõem. Mas alguns belos e históricos exemplares que sobrevivem em vários países, remanescentes de tempos mais felizes, mostram que elas também têm identidade.

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h58 - Publicado em 30 set 1990, 22h00

A vida sem elas é impossível, um dia sem vê-las é assustador. Dão sombra, ar fresco e beleza a qualquer paisagem. Nada representa melhor a natureza que essas majestosas soberanas do reino vegetal—as árvores. De fato, assim como o homem é o organismo mais complexo e evoluído do reino animal, as árvores simbolizam o máximo da evolução vegetal. Se não podem andar como os animais, em compensação podem fabricar o próprio alimento. É o conhecido processo da fotossíntese, pelo qual transformam energia solar, gás carbônico e água em substancias nutritivas e oxigênio. Graças a essa capacidade, as plantas não dependem dos animais para sobreviver. Na verdade, são a fonte básica da cadeia alimentar dos seres vivos. Foi o surgimento dos vegetais, sintetizadores de oxigênio, que tornou possível a vida animal.

Mas, se as árvores são responsáveis pela preservação do homem, este nem sempre se preocupa em cuidar de suas protetoras. Raízes, troncos, folhas, flores e frutos têm sido indistintamente transformados em alimento, madeira, papel e medicamentos. Nesse processo, esqueceu- se o valor da árvore viva, que só começou a ser resgatado nos anos recentes, com a eclosão dos movimentos em defesa da natureza. No entanto, por motivos variados, certos exemplares conquistaram a simpatia humana e mereceram uma atenção que, em geral, não é dada a florestas inteiras. Por exemplo, o grande cipreste mexicano da aldeia de Tula, com 42 metros de diâmetro, ou a velha figueira de 22 metros de altura da Rua Haddock Lobo, no Jardim América, em São Paulo. “Essa atitude é prova de que o homem não é só destruidor”, opina o engenheiro agrônomo Antonio Luiz Gonçalves, do Instituto de Botânica de São Paulo. “É também o único animal que preserva a vida dos mais fracos.”

Tal esforço, porém, nem sempre é bem-visto por alguns pesquisadores. Eles argumentam que esse tipo de preservação tem muito pouco valor em termos científicos, pois os exemplares, na maioria das vezes, são figuras decadentes que representam mal a forma da espécie. As variedades de árvores que hoje vivem e se multiplicam no planeta são as que conseguiram sobreviver às sucessivas mudanças das condições naturais ao longo dos quase 400 milhões de anos transcorridos desde o aparecimento dessas formas vegetais de vida. “A natureza é uma fotografia do momento e as árvores preservadas servem como documento histórico de milhões de anos de evolução”, justifica Gonçalves. A primeira grande alteração climática a devastar as primitivas florestas ocorreu há cerca de 300 milhões de anos, quando a temperatura da Terra caiu e o ar ressecou, transformando ricas vegetações nos atuais depósitos de carvão mineral. Nessa época, os vegetais se reproduziam exclusivamente por esporos (células reprodutivas), constituindo o antigo embrião das árvores—os chamados fetos arbóreos do grupo das pteridófitas, que se tornaram o protótipo das árvores. “São as samambaias arbóreas, um primeiro ensaio tão bem-sucedido que permanece até nossos dias”, explica o engenheiro agrônomo. Depois, há 200 milhões de anos, surgiram as gimnospermas, capazes de se reproduzir por meio de sementes. Nesse grupo estão as araucárias, os pinheiros e os ciprestes, entre outros. Árvores floridas, com sementes dentro de frutos, vieram a formar, há menos de 100 milhões de anos, o terceiro e último grupo, o das angiospermas, que constituem a maior parte das árvores existentes.

As angiospermas se dividem em duas classes: as mais complexas são as monocotiledôneas, que incluem palmeiras, bananeiras, bambus e dracenas; e as dicotiledôneas, mais numerosas, que incluem carvalhos, ipês e jequitibás. Todas essas classificações podem parecer simples passatempos de botânicos excêntricos pois, afinal não é difícil reconhecer uma árvore quando se está diante de uma. Entretanto, estudos mais profundos demonstram que a estrutura anatômica de certas árvores não se diferencia muito de alguns arbustos, trepadeiras ou ervas. Assim, a partir do estudo das relações evolutivas e genéticas, o conceito de árvore passou a se associar a uma planta que renova seu crescimento a cada ano, sustenta-se com um caule simples recoberto por tecidos mortos, ditos suberificados e, na maioria das espécies, produz ramos secundários, mais conhecidos como galhos. Para crescer, as pontas dos galhos e das raízes possuem os chamados tecidos meristemáticos, compostos por células que se dividem.

O crescimento na largura é causado por outros meristemas entre a madeira e a casca. Em coníferas (árvores em forma de cone) e dicotiledôneas é fácil observar os anéis concêntricos do caule, que indicam suas idades. Desse modo, as raízes se estendem menos ou mais profundamente pelo solo, captando água e nutrientes (a seiva bruta) e por efeito, evitando a erosão. O tronco e os galhos funcionam como vasos sangüíneos, levando a seiva do solo às folhas, as quais agem como uma espécie de célula solar, que capta a luz do sol para a fotossíntese. O processo pelo qual a seiva sobe até as folhas, sem contar com uma bomba eficiente como o coração dos animais, é uma das proezas evolutivas desses vegetais. Devido à propriedade que as moléculas de água têm de ficar fortemente unidas, elas formam uma grande corrente até o topo da árvore. Assim, à medida que uma molécula evapora na superfície da folha, outra é empurrada para o seu lugar. A grande maioria das espécies de árvores faz parte da vegetação de lugares com índices de chuva ao redor de 700 milímetros por ano. Algumas espécies, como os juazeiros do Nordeste brasileiro, estão adaptadas a climas semidesérticos, mas é nas regiões tropicais, com grande quantidade de chuva, que elas aparecem em grande variedade e abundância. “Com o calor, as reações químicas se aceleram, o que permitiu o surgimento de plantas mais evoluídas, no caso as monocotiledôneas”, ensina o engenheiro agrônomo Gonçalves.

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Por essa razão, o Brasil apresenta uma das floras mais ricas do mundo, com muitas árvores belas e valiosas. Perobas, cerejeiras, mognos, imbúias, cedros e jacarandás, entre outras, são alguns exemplos de árvores com madeira de boa qualidade para uso nobre, isto é, para a fabricação de móveis finos. “Não admira sermos o único país do mundo com nome de árvore”, lembra ele. De fato, os colonizadores portugueses chamaram sua colônia de Brasil em referência à estranha árvore de miolo cor de brasa (daí o nome pau-brasil) encontrada por aqui. Já os indígenas a denominavam Pindorama que, no idioma tupi, quer dizer “terra das palmeiras”, plantas que embora pertençam a outro grupo botânico, têm o porte de árvore.

A presença das árvores na cultura dos vários povos é sinal de reverência a esses impressionantes vegetais. Não há livro sagrado que não se refira a um símbolo inspirado nelas. Da árvore genealógica hebraica, à qual pertence Jesus Cristo, até as folhas de palmeira e oliveira que celebraram a passagem do Messias por Jerusalém, a Bíblia está cheia delas. Antes, os gregos já cultuavam em sua mitologia as figuras dos sátiros e das ninfas, os espíritos das árvores. Os antigos sacerdotes druidas (no velho idioma céltico, “aqueles que conhecem o segredo do carvalho”), que habitaram a região da Inglaterra há 23 séculos, também cultuavam a floresta, oferecendo-lhe sacrifícios humanos. Não é preciso ser tão radical hoje em dia para defender a natureza, mas seria o caso de pelo menos aprender com os druidas que a boa árvore é a árvore viva.

Para saber mais:

As verdades do verde

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(SUPER número 7, ano 3)

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