Corações trocados
Com as novas técnicas de cirurgia, nenhum órgão é insubstituível - exceto, por enquanto, o cérebro.
Numa época em que o mundo inteiro vibrava com a conquista do espaço, uma proeza da Medicina conseguiu ganhar o centro das atenções. No dia 3 de dezembro de 1967, o cirurgião sul-africano Christiaan Barnard trocou o coração doente do comerciante Louis Washkansky, de 54 anos, pelo de uma moça de 24, que tinha morrido num acidente de carro. Washkansky sobreviveu apenas 18 dias – o suficiente para tornar Barnard um herói tão festejado quanto os astronautas mais famosos. Seu segundo transplante, em janeiro de 1968, foi bem mais feliz. O dentista Philip Blaiberg ficou 594 dias com um coração alheio.
Ainda em 1968, o brasileiro Euríclides de Jesus Zerbini fez a primeira operação desse tipo na América do Sul. Os transplantes enfrentaram, no início, o problema da rejeição – os mecanismos de defesa do corpo vêem o coração novo como um invasor e o atacam. A rejeição só foi superada em 1978, com a ciclosporina, uma droga mais eficaz do que as anteriores para neutralizar a reação do sistema imunológico ao órgão transplantado. Hoje em dia, os transplantes de coração são um procedimento de rotina. Em 75% dos casos, os pacientes sobrevivem por mais de cinco anos depois da operação.
Visão renovada
Você já viu algum anúncio pedindo doadores de córnea? Esse é um ato de generosidade que não custa nada, pois só se realiza depois da morte. Para quem recebe, é o único meio de recuperar a visão perfeita depois de uma doença ou lesão na membrana transparente que recobre a parte de fora do olho. Trata-se de uma das raras partes do corpo humano que podem ser transplantadas sem risco de rejeição, pois não tem um suprimento próprio de sangue. Por isso os anticorpos e as células do sistema imunológico, que circulam no sangue, não atingem o tecido recebido. Feita pela primeira vez em 1905 pelo oftalmologista austríaco Edward Zirm, a operação depende de doadores que autorizam a retirada da córnea. Há atualmente 25 000 brasileiros com doenças na córnea na fila de espera para fazer o transplante.
Reciclagem de órgãos
O primeiro órgão humano a ser transplantado com sucesso foi o rim. Em 1954, cirurgião americano Joseph Murray transferiu um rim de um irmão gêmeo para o outro, que não tinha nenhum dos dois funcionando. No caso, tanto o doador quanto o receptor tinham o mesmo código genético, o que reduziu o risco de rejeição. O fígado só foi transplantado em 1967. No mesmo ano ocorreu também a primeira troca bem-sucedida de pâncreas. O transplante de pulmão teve de esperar até 1982 para ser feito com sucesso e, mesmo assim, de somente um deles. O transplante duplo de pulmões veio a acontecer somente em 1986. Cinco anos antes, em 1981, os cirurgiões americanos Norman Shumway e Bruce Reitz tinham conseguido o primeiro transplante múltiplo de órgãos, envolvendo um coração e um pulmão. O paciente sobreviveu dezoito meses. Uma façanha e tanto.
O coração artificial
É um dos desafios mais apaixonantes da Medicina. Um passo decisivo foi dado em 1982, com a estréia do Jarvik-7, que recebeu o nome do seu criador, o médico americano Robert Jarvik. O paciente viveu 112 dias com ele. Mas o Jarvik-7 utiliza ar comprimido bombeado de fora, impedindo o paciente de sair do quarto do hospital. Aparelhos mais modernos funcionam com uma bateria interna. Só que ela precisa ser recarregada após algumas horas. Atualmente, os corações artificiais são usados apenas durante a espera por um transplante.