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Mais um limite terá sido superado

Com ganhos cada vez menores nas marcas olímpicas, a ciência reconhece que o corpo humano está atingindo o máximo da sua capacidade

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h09 - Publicado em 31 jul 2000, 22h00

Eduardo Azevedo

Corredores prontos para a largada. Concentração. Todos, dentro e fora da pista, ouvem o disparo. É a senha que transforma em movimento a energia e a técnica armazenadas em anos de treino. De casa, você acompanha a trajetória daqueles corpos perfeitos. Divide a sua atenção entre quem está na frente e um pequeno marcador, com algarismos que se mexem no canto do vídeo. Você torce. No instante em que o primeiro atleta romper a fita, esse número precisa ser menor do que um outro que está parado marcando o recorde mundial. Se valer a torcida, você, o atleta, a platéia no estádio, o locutor da TV, todos vão vibrar e sorrir. Mais um limite terá sido superado. A humanidade dormirá tranqüila. Ufa! A evolução da espécie continua.

De todas as facetas das Olimpíadas, nenhuma se compara ao recorde. Se é difícil saber se hoje somos mais inteligentes ou mais criativos do que no passado, no esporte essa dúvida não existe. O atual campeão dos 100 metros rasos, Maurice Greene, deixaria Thomas Burke, vencedor dos 100 m na primeira olimpíada moderna, em Atenas-1896, comendo poeira mais de vinte metros atrás. O barão de Coubertin, quando ressuscitou os Jogos Olímpicos há mais de um século, já sabia que sua empreitada tinha tudo a ver com o irresistível impulso da humanidade a sempre superar a si mesma. Entre as frases que carimbou para a eternidade, uma vem do latim: “Citius, altius, fortius.” Tradução: mais rápido, mais alto, mais forte.

Mas até quando conseguiremos nos superar? Quanto mais poderemos saltar, correr, pular e nadar? Será que estamos atingindo nosso limite? Há quem pense que sim. “Nosso corpo chegou a um tal grau de desenvolvimento que fica difícil imaginar grandes avanços daqui para a frente”, diz à SUPER o fisiologista Turíbio Leite de Barros, da Universidade Federal Paulista (Unifesp). A julgar pelas últimas Olimpíadas, Turíbio está certo. O número de recordes caiu de 75 em Seul-88 para meros treze em Atlanta-96.

Quando se fala em preparação, é difícil imaginar o que ainda pode ser feito para aumentar o potencial dos atletas sem ferir as leis esportivas com artifícios como o doping. Alguns órgãos do corpo já estão evoluídos até demais. O coração de um competidor profissional consegue bombear no máximo 42 litros de sangue por minuto, enquanto no cidadão comum a média é de 20 litros. Pensar em elevar ainda mais esse ritmo seria insano. Nenhum coração agüentaria bombear 60 litros a cada minuto – um litro por segundo. Isso exigiria artérias e ventrículos de elefante. Quanto aos músculos, mesmo que seja possível aumentar ainda mais sua capacidade, os ossos não superariam a pressão extra. Vale lembrar que o atual desenvolvimento muscular dos atletas já é suficiente para causar rupturas freqüentes de tendões e fraturas nas competições olímpicas.

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Cérebro faz diferença

Mesmo com tantos obstáculos, a esperança resiste. Alguns especialistas acham que ainda há espaço para evolução na parte biomecânica. O modo como os movimentos são executados tem impacto direto no rendimento do atleta. É algo, portanto, que pode ser aperfeiçoado. No salto em altura, por exemplo, houve uma revolução na metade do século. Alguns competidores perceberam que, ao pular de costas, jogando primeiro o tronco e depois as pernas, poderiam atingir uma altura maior. Cláudio Gil Araújo, coordenador médico da delegação brasileira que competiu em Seul-88, justifica a teoria citando o tenista brasileiro Gustavo Kuerten. Mesmo sem ser um prodígio em músculos, Guga é capaz de golpear a bolinha com mais força que qualquer halterofilista. “Ele pode até não saber nada de física, mas está executando um movimento perfeito do ponto de vista mecânico”, afirma Araújo.

A cabeça também pode ajudar. Estudos publicados pela Universidade do Arizona, nos EUA, indicam que os atletas que participam das provas de tiro ao alvo e de arco e flecha apresentam uma migração da atividade cerebral do hemisfério esquerdo (mais racional) para o direito (mais irracional) logo antes de cada prova. O atleta age por impulso, sem pensar, e por isso é tão rápido. A ciência poderia progredir no estudo do cérebro, proporcionando uma coordenação maior entre os neurônios e as fibras musculares. Isso melhoraria a precisão e a velocidade de cada resposta física. Em Sydney, os supercampeões tentarão derrubar alguns recordes. Se não conseguirem, todos nós ficaremos um pouco frustrados. Mas, se tiverem sucesso, saberemos que ainda não chegamos ao limite.

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Quando esporte não é saúde

Altos, fortes e vencedores. Os atletas olímpicos têm sua imagem associada imediatamente à saúde. Porém, isso nem sempre é verdade. O atletismo de competição pode acarretar tantos problemas quanto o sedentarismo. Para o fisiologista Turíbio Leite de Barros, da Universidade Federal Paulista, surgem vários distúrbios quando o corpo é forçado além de seus limites. “Ele se equilibra numa fronteira muito pequena entre o desempenho máximo e o excesso de esforço”, afirma.

Este dilema físico fica claro nas provas de velocidade. A musculatura cresceu tanto nos corredores modernos que o resto do corpo muitas vezes não suporta a arrancada, com rompimentos de tendões e até de ossos.

Os sintomas do supertreinamento nem sempre são evidentes, o que faz com que os competidores continuem se exercitando sem se dar conta do risco que correm. Os sintomas são insônia, irritabilidade, alterações no ciclo menstrual das mulheres e diminuição da produção dos glóbulos brancos, com aumento do número de doenças e infecções. Em alguns casos mais graves, o atleta passa a apresentar arritmia cardíaca e, em última instância, o coração pode até parar de funcionar. “O atleta não é um modelo de saúde”, resume Turíbio. “Ele, aliás, não busca saúde, busca dinheiro.”

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