Placebo pode ser o melhor remédio
A ciência acreditava que uma pílula de açúcar não fazia efeito em nosso corpo. Mas agora estudos mostram que o placebo pode acabar com dores e sensações ruins
Felipe Fregni*
Placebo é definido na medicina como droga ou intervenção que não tem efeito direto em doenças. É a simulação de um remédio – como pílulas de açúcar, por exemplo. Desde a metade do século 20, médicos e pesquisadores recorrem a ele em testes de drogas e tratamentos. Se os remédios tiverem resultados melhores do que o placebo, sinal de que a pesquisa é promissora.
Uma nova leva de estudos, no entanto, tem mostrado que o placebo não serve só para pesquisas de medicamentos – também pode ter efeito significativo sobre as doenças. Um exemplo: pacientes com a síndrome do intestino irritável, doença que leva à inflamação do intestino, melhoraram com acupuntura placebo (agulhas falsas que não perfuram a pele). E o índice de melhora variou de acordo com a atenção que os pacientes receberam do médico – quem ganhou mais melhorou mais. Há até casos de cirurgia em que o placebo funcionou. Em outro estudo, pacientes com artrose que passaram por uma operação placebo (com pequenas incisões, mas sem ação médica) tiveram os mesmos resultados que pacientes que passaram por uma operação real.
É verdade que a melhora pode estar relacionada à evolução natural das doenças. Mas existem teorias que explicam a influência do placebo. Quando alguém toma uma pílula de açúcar acreditando que aquilo é remédio, surge a expectativa de melhora. Mudanças na área do cérebro que processa as emoções podem influenciar outros processos do corpo, como o nível dos hormônios, o sistema imunológico e o sistema nervoso periférico. Ou seja: a expectativa de melhora pode mudar a percepção de dor, aliviar uma inflamação de pele ou reduzir o tremor causado por mal de Parkinson.
Existe um fenômeno que ajuda a entender isso: o fenômeno da atenção seletiva. Em guerras, soldados feridos só começam a sentir a dor de um membro dilacerado quando a batalha acaba, porque a atenção antes estava toda concentrada no conflito. É por isso que tomar o placebo pode ajudar um paciente: a expectativa de melhora desviaria a atenção de dores e emoções negativas. É uma forma de trocar a rede de neurônios em atividade, daquela associada a doenças para aquela associada ao bem-estar. O que dá força a essa teoria é a comprovação recente de que o efeito placebo desaparece sempre que é bloqueada a atividade do córtex pré-frontal – uma área que pode ser descrita como coordenadora do cérebro, por controlar nossa cognição, emoção e ação.
Se uma pílula de açúcar ou uma agulha falsa não fazem mal e têm efeitos tão poderosos, por que não prescrever placebos? A principal barreira é ética: se o médico disser ao paciente que vai prescrever placebo, o tratamento não funciona. O que já dá para explorar é a ação do médico. Se o tratamento for dado com mais atenção e orientação, maior será o efeito. E, no futuro, poderemos usar as pesquisas com placebo para aproveitar o efeito terapêutico da expectativa de melhora.
* Felipe Fregni é professor-assistente de neurologia da Harvard Medical School.Os artigos aqui publicados não representam necessariamente a opinião da SUPER.