Evanildo da Silveira
Quando a estação russa Mir se espatifou nas águas do Pacífico Sul, em março deste ano, encerrou-se uma história de 15 anos de pesquisas espaciais. Lançada em 19 de fevereiro de 1986, ela serviu de laboratório para mais de 20 000 sessões de experimentação científica e recebeu 62 astronautas de 12 países, a um custo total de 4,2 bilhões de dólares.
Para a maioria dos especialistas o balanço final é bem positivo – a começar pelo desenvolvimento da Estação Espacial Internacional, sua sucessora. A experiência adquirida na Mir revelou-se fundamental no novo projeto. “A maioria dos experimentos esteve voltada para os efeitos da ausência de gravidade nos organismos vivos: vegetais, animais e o próprio homem”, afirma o físico Odylio Aguiar, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), sediado em São José dos Campos, SP. “São trabalhos importantes, pois a ausência de gravidade será um dos principais desafios a enfrentar em futuras viagens para outros planetas.”
Destacam-se, portanto, os dois recordes de permanência no espaço batidos por cosmonautas russos. O primeiro foi registrado em 21 de dezembro de 1988, quando Vladimir Titov e Musa Manarov completaram 366 dias em órbita – marca superada por Valery Polyakov, que, em 8 de março de 1995, completou 14 meses no espaço.
Mas o resultado mais relevante talvez tenha sido demonstrar que o ser humano pode cultivar sua própria comida fora de casa. “Os astronautas da Mir cultivaram duas gerações e meia de vegetais a partir da semente, provando que as plantas se desenvolvem e reproduzem normalmente no espaço”, diz Robert E. Cleland, da Universidade de Washington, em Seattle, integrante do Conselho Americano de Pesquisas e Estudos Espaciais.
A chamada ciência básica também foi beneficiada. Para Bernard Zappoli – responsável pelos experimentos a bordo da Mir para a Cnes, agência espacial francesa –, os testes com fluidos supercríticos representaram um grande avanço. Essas substâncias, que podem se comportar tanto como líquidos quanto como gases, revelaram um novo mecanismo de transferência de calor. “É um estudo importante, pois trata-se de um mecanismo fundamental, até então mascarado pelo modo como ocorre nas condições atmosféricas da Terra”, afirma Zappoli.