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O homem que escuta as estrelas

Há mais de trinta anos esquadrinhando o Cosmo em busca de seres inteligentes, o radioastrônomo Frank Drake está convencido de que a humanidade está perto de descobrir sinais de extraterrestres.

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h38 - Publicado em 30 abr 1997, 22h00

Rowilson Quinete

Se algum dia um extraterrestre telefonar para a Terra, Frank Drake, com certeza, atenderá à ligação. Há quase quatro décadas o cientista americano, de 67 anos, mantém seus ouvidos voltados para as estrelas, esperando um sinal dos homenzinhos verdes. A investigação começou em 1959, num radiotelescópio que conseguia captar apenas uma faixa de rádio por vez. Ele escolheu duas estrelas próximas e apurou a audição. Em Tau-Ceti, completo silêncio. Ao voltar o radiotelescópio para Epsilon Erandi, um ruído…. Seria assim tão fácil se comunicar com ETs? Infelizmente, era engano. A ligação vinha da Terra. Drake não perdeu as esperanças. Atualmente ele comanda o Projeto Phoenix, que rastreia milhões de canais de rádio em busca de uma mensagem das estrelas que venha resolver uma das perguntas mais antigas da humanidade: estamos realmente sozinhos no Universo?

Quando Drake atendeu o telefone para dar esta entrevista exclusiva à SUPER, em sua casa na Califórnia, ainda não eram os extraterrestres. Mesmo assim, de muito bom humor, ele contou como vão as coisas para o investigador de plantão número 1 em assuntos extraterrenos. A seguir, os principais trechos da entrevista:

SUPER: Por que alguém se interessaria por seres extraterrestres?

Quando completei oito anos de idade, meus pais me disseram que existiam outros planetas além do nosso. Fiquei impressionado. Minha dedução lógica foi que também existiriam outras pessoas vivendo nesses planetas. A astronomia causa grande impacto na imaginação infantil quando ela é bem ensinada. Foi o que aconteceu comigo. Vários anos mais tarde, em 1958, fui nomeado para controlar o radiotelescópio de Green Bank. Lá comecei a rastrear possíveis sinais vindos de outros planetas. Nunca mais desisti da idéia.

SUPER: Por que ninguém pensou em rastrear o espaço antes?

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Foi somente em 1958 que a tecnologia dos radiotelescópios permitiu que imaginássemos a possibilidade de nos comunicar com outras civilizações por meio de ondas de rádio. Criamos o Projeto Ozma, o primeiro programa que direcionou um telescópio para ouvir as estrelas. Mesmo assim, não era uma tarefa muito fácil. O equipamento só conseguia captar uma freqüência por vez. Para se mudar a freqüência, demorávamos semanas para readaptar o aparelho. Era uma trabalheira infernal.

SUPER: E qual a melhor forma de conseguir contato? Há alguma freqüência especialmente boa para isso?

A primeira decisão foi que deveríamos nos ater a freqüências de onda entre 1 000 e 10 000 megahertz. Essa área é a mais silenciosa do Universo, com menos interferências. Como naquela época só podíamos escolher uma freqüência por vez, escolhemos a do hidrogênio, 1 420 megahertz, com 21 centímetros de onda. Hidrogênio é a substância mais abundante no Universo, e creio ser lógico que uma civilização que queira se comunicar com outra através do espaço se utilize dessa freqüência. Atualmente temos milhões de canais que rastreiam o espaço. Contudo, acredito que 1 420 megahertz continua sendo a melhor freqüência para uma civilização que esteja procurando se comunicar.

SUPER: Isso parece um tanto antropocêntrico. Por que supor que outras civilizações têm um processo lógico idêntico a dos seres humanos?

Eles podem não ter a lógica humana mas, se são bons cientistas, devem saber as mesmas coisas que nós sabemos. A freqüência do hidrogênio é a mais econômica e mais eficiente para transmissões espaciais por estar localizada nessa faixa silenciosa. Todos os nossos satélites, países e televisões a exploram. Outras civilizações, se estiverem no mesmo nível de desenvolvimento tecnológico que nós, devem saber a mesma coisa, não importa qual a sua lógica.

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SUPER: A busca de sinais de ETs não pareceu loucura na época em que começaram as suas pesquisas? Como a comunidade científica via isso?

Sofri muito no princípio. Naquela época as ciências planetárias estavam engatinhando. Nenhuma nave tripulada havia ido ao espaço. Mesmo a superfície da Lua era uma incógnita para nós. Quando comecei a vasculhar o espaço em busca de seres extraterrestres, fui considerado um completo lunático por vários outros cientistas. Até então, a moda era o estudo dos planetas do Sistema Solar, a formação das galáxias e a teoria do Big Bang. É engraçado, mas a ciência também é vinculada a modismos. Num certo momento, é moda se estudar tal assunto, depois isso é considerado desinteressante. Veja o que aconteceu com a busca dos extraterrestres. Nas décadas de 20 e 30, o astrônomo Percival Lowell (1855-1916) afirmava que havia seres inteligentes em Marte. Quando se descobriu que tudo não passava de uma farsa, a busca de vida fora do nosso planeta se tornou um tabu na comunidade científica. Acreditava-se que esses estudos eram brincadeiras de mau gosto, coisa de impostores como Lowell. Foi muito difícil conseguirmos verbas para os projetos de rastreamento de Green Bank. Durante dois anos de trabalho, foram gastos 2 000 dólares. Uma quantia irrisória. Usamos apenas 200 horas de radiotelescópios. Mesmo assim, não faltou quem criticasse nosso projeto como desperdício de dinheiro público.

SUPER: Como se financia o seu projeto?

Várias pessoas contribuem com somas expressivas. Do governo, não recebemos nada. Quando o Projeto SETI (Search for Extraterrestrial Inteligence) foi inaugurado, em 1992, o Congresso dos Estados Unidos deveria financiar o projeto com uma verba de 10 milhões de dólares por ano, até 2001. Por uma decisão política, eles desistiram antes de o SETI completar um ano. Hoje, nossas contribuições somam 8,5 milhões de dólares anuais. O Projeto Phoenix, do qual faço parte, fica com a maior parte do bolo, 4 milhões de dólares.

SUPER: É possível encontrar sinais de civilizações inteligentes só com esse dinheiro?

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Estamos vasculhando centenas de milhões de freqüências em cada um dos quatro telescópios que fazem parte do projeto atualmente. Quando começamos, há mais de trinta anos, havia apenas nós, o Projeto Ozma 2 e os russos. Outros foram conduzidos mais tarde, em diferentes países. Hoje, temos sessenta pessoas trabalhando no mundo inteiro. Dois aparelhos estão nos Estados Unidos, outro em La Plata, na Argentina, e o último em Porto Rico, no Caribe. Tenho expectativas de encontrar sinais de vida inteligente nos próximos vinte ou trinta anos. É uma previsão bastante viável, se considerarmos que já foram encontrados 134 sinais que poderiam ser indícios de civilizações tecnologicamente avançadas.

SUPER: E alguns desses sinais podem realmente ser de extraterrestres?

A maioria deles são provenientes da própria Terra, de nossos satélites de televisão, de rádio e de outras interferências. Alguns são realmente estranhos, mas não podemos afirmar nada de conclusivo. Trata-se de casos em que não houve repetição do sinal. Ou seja, só o recebemos uma vez e não houve tempo para confirmarmos com outros telescópios. Há a possibilidade desses sinais serem causados pela grande distância entre o ponto de origem e a Terra. Quando estamos focados numa estrela distante, o movimento da Terra em relação a essa estrela muda rapidamente. Isso causa uma distorção no recebimento da freqüência, chamado Efeito Doppler. Este efeito é parecido com o ruído de um trem. Quando ele está se aproximando, seu ruído é agudo. Quando o trem passa e se distancia, o ruído torna-se mais grave. O mesmo ocorre nas transmissões de sinais de rádio que captamos. O radiotelescópio pode se confundir neste processo causando interpretações errôneas.

SUPER: Dá para acreditar que já fomos visitados?

Não creio. Nunca foi achado nada de conclusivo que nos levasse a acreditar nessas pessoas que afirmam ter sido seqüestradas ou que mantiveram contato com seres extraterrestres. São crendices populares, nada mais. Nunca foi encontrada qualquer prova. Todos esses estranhos seqüestros ocorrem à noite, quando a vítima está so- nhando. Já investiguei alguns casos. Acho que essas pessoas têm problemas psicológicos.

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SUPER: Além de procurar sinais alienígenas, nós também estamos enviando sinais ao espaço?

A televisão é nossa maior mensagem. Todas as emissões de rádio e televisão são lançadas no espaço e viajam na velocidade da luz. Enviamos uma mensagem específica em 1974, quando foi reinaugurado o radiotelescópio de Porto Rico. Enviamos a mensagem para a Constelação de Hércules. Não por acreditar que existam aliens por lá, somente porque a posição do radiotelescópio à uma hora da tarde daquele dia tornava aquela constelação a mais repleta de estrelas que podíamos sintonizar. A mensagem continha um sistema numérico binário, a fórmula química do DNA e o número 4 bilhões, que é o número de ligações de DNA que possuímos em cada célula do nosso corpo. Novamente é difícil saber se algum ser será capaz de reconhecer esta mensagem. Contudo, como ainda não conseguimos encontrar nenhum homenzinho verde, temos que apostar em alguma forma de comunicação. Creio que a melhor forma de enviarmos mensagens é através de imagens. Mesmo nesse caso, estaremos considerando que os extraterrestres sejam dotados de olhos para ver essas imagens.

SUPER: O senhor é autor da famosa equação sobre a probabilidade de se encontrar civilizações que se comunicam fora da Terra (veja quadro `a esquerda). Recentemente, alterou alguns termos dessa equação. Por quê?

Principalmente em função da descoberta de novos planetas. Os cientistas encontraram tantos planetas em tão pouco tempo que parece que o número de estrelas capazes de conter planetas em sua órbita é maior do que se imaginava anteriormente. Eu mantenho, isto sim, os outros números, mesmo sabendo que alguns deles são simples especulações.

SUPER: Tais como?

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Na equação existem inúmeras variáveis aleatórias, como a incidência de planetas que podem conter vida e onde ela realmente foi capaz de se desenvolver. Não há como estipular números reais para essas variáveis, já que ainda não conhecemos bem outros sistemas solares. Apesar desses problemas, permaneço com a certeza de que devem existir pelo menos 100 000 planetas na Via Láctea que possuam seres inteligentes.

SUPER: Essa cifra parece muito otimista. Se possuímos tanta inteligência em nossa Galáxia, por que nenhuma delas conseguiu ainda colonizar toda a Via Láctea?

Talvez porque as viagens intergaláticas sejam mais complicadas do que imaginamos. Creio que uma viagem intergalática possa ser muito perigosa para qualquer civilização, independentemente do grau de desenvolvimento tecnológico em que ela se encontre. Um exemplo: numa viagem estelar, um meteorito do tamanho de uma bola de pingue-pongue pode destruir uma nave espacial. Basta que esta nave esteja viajando a uma velocidade considerável, algo próximo à velocidade da luz. Um choque nessa velocidade seria fatal. Temos também de considerar que, caso a teoria de Einstein esteja certa, não podemos viajar a uma velocidade maior que a luz. Se isso for verdade, as viagens intergaláticas se tornariam inviáveis por causa das enormes distâncias.

SUPER: Não poderíamos supor que pelo menos algumas dessas civilizações extraterrestres tenham conseguido desenvolver uma tecnologia paralela, que encurtasse as viagens espaciais?

Nunca foi provado que essa teconologia seja viável do ponto de vista das leis da Física aplicada. De qualquer maneira, resta ainda o problema da energia despendida numa viagem deste porte. Ela será imensamente maior do que a energia necessária para se colonizar os planetas próximos. Veja: uma pequena espaçonave, locomovendo-se a um décimo da velocidade da luz, requer o mesmo montante de energia que nosso planeta inteiro produziu no último milênio. É muita energia. Viagens intergaláticas são muito onerosas. Mesmo uma civilização mais avançada pode preferir colonizar somente o seu próprio sistema solar, o que custaria um centésimo da energia necessária para colonizar outros sistemas próximos.

SUPER: Se a vida está tão disseminada quanto o senhor acredita, não seria de se supor que estaria correta a teoria panspermista, segundo a qual a origem dos microorganismos existentes na Terra é originária do espaço?

Nesses assuntos, sou um conservador. Não existe qualquer prova científica para esta afirmação. Alguns planetas possuem consideráveis chances de formar vida sem precisar de ajuda externa como faz crer a teoria da Panspermia. Na Terra, a evolução das espécies começou logo depois da formação do planeta. Se tivéssemos um longo período, digamos de 1 bilhão de anos, sem que nenhum microorganismo tivesse sido encontrado e, depois, começassem a aparecer indícios de bactérias, eu poderia considerar esta teoria viável. Contudo, nós sabemos que a vida aqui começou muito cedo, há 3,8 bilhões de anos. Seria muito improvável que meteoritos pudessem trazer vida tão depressa. Há muitas evidências que demonstram que a vida se originou na Terra, por conta própria.

SUPER: Será que ainda podemos encontrar vida no nosso Sistema Solar?

Não existe a menor chance de encontrarmos inteligência extraterrestre no nosso Sistema Solar. Podemos encontrar sinais de fósseis microscópicos. Na lua de Júpiter, Europa, há boas chances de encontrarmos microorganismos vivos nos mares submersos debaixo da calota polar que envolve a superfície daquele satélite. Não acredito que possamos encontrar nada em Vênus. Sua temperatura, muito quente, não permitiria. Titã, a lua de Saturno, é muito fria e sua composição química me parece muito estranha para conter qualquer tipo de organismo. A Nasa está desenvolvendo o projeto de uma sonda para a exploração de Europa. A sonda deve ser capaz de produzir calor e derreter a calota polar até encontrar água. Existem ainda muitos problemas com um empreendimento deste porte. Contudo, é um projeto promissor. Realmente acredito que isso será viável para a próxima década.

SUPER: Qual o seu maior sonho como astrônomo?

Sentar um dia na frente de um televisor e assistir a um programa de TV emitido por seres extraterrestres.

SUPER: Isso não parece um pouco improvável? O senhor. acha que os ETs têm uma televisão?

É o meu sonho. Quem pode criticar um sonho?

As chances de os ETs terem telefone

A equação de Drake prevê a quantidade de civilizações na Via Láctea capaz de se comunicar

Representação do número de estrelas na Via Láctea.

Estimativa: 200 bilhões.

Fração de estrelas com planetas orbitando ao seu redor.

Estimativa: 0,5.

Fração de planetas por estrela capazes de ter vida.

Estimativa: entre 1 e 5.

Fração de planetas onde a vida se desenvolveu.

Estimativa: entre 0,1 a 1,0

Fração de planetas onde a inteligência pôde se desenvolver.

Estimativa: 1,0.

Fração de civilizações que se comunicam.

Estimativa: entre 0,1 a 0,9.

Fração de tempo em que essa civilização enviou sinais.

Estimativa: 0,000001.

Pelas contas de Drake, existem 100 000 civilizações.

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