Oxigênio: O velho e o novo se fundem na Galáxia
A astrônoma brasileira Beatriz Barbuy descobriu cientificamente que a produção de oxigênio teria sido alta logo no início da vida da Galáxia.
A o respirar, promovemos o encontro de dois elementos químicos que a Galáxia (ou a Via Láctea) produziu em idades muito diferentes: o velhíssimo oxigênio do ar, gerado nas primeiras estrelas, oxida o jovem ferro da hemoglobina formado em gerações mais recentes. Essa e a tradução simplificada de um importância descoberta da astronomia Beatriz Barbuy, do instituto Astronômico de Geofísico da Universidade de São Paulo. De acordo com seu trabalho, a taxa de produção de oxigênio teria sido alta logo no inicio da vida da galáxia, tendo caído drasticamente com o passar do tempo. Alguns astrônomos já haviam suspeitado desse fato há cerca de vinte anos, mas esbarraram na grande dificuldade de avaliar corretamente a quantidade de oxigênio.
Apesar de essa quantidade ser vinte vezes maior que a do ferro no sol, o oxigênio deixa apenas fracos e raros sinais de sua presença, se comparado com a exuberante “impressão digital” que o ferro deixa na luz solar. O sucesso do achado de Beatriz Barbuy foi possível graças às refinadas técnicas que ela usou nos telescópios do consorcio europeu E (European Southern Observatory), no Chile, para realçar os sinais de oxigênio presente na luz das estrelas e também ao poderoso software que desenvolveu para diagnosticar as atmosferas estrelares. A atmosfera de um estrela contém muitos outros elementos pesados chamados de “metais” pelos astrônomos, mais o oxigênio e o ferro são os mais importantes. A partir deles se pode inferir a quantidade dos outros. O oxigênio é produzido por estrelas de grande massa, como, por exemplo, Rigel, Antares e Betelgeuse. Ao final de sua evolução, essas estrelas têm uma estrutura analógica à de uma cebola, rica em hidrogênio na camada externa, Helio na seguinte, carbono, nitrogênio e oxigênio na outra até chegar ao caroço central, de ferro.
Quando explodem na forma de supernovas, elas lançam as camadas exteriores para o espaço, enquanto o caroço de ferro se transforma em estrela de nêutrons ou buraco negro. A supernovas 1987A, por exemplo, ejetou 1,6 massas solares de oxigênio e somente 0,07 massas solares de ferro. Essas supernovas vivem pouco e explodem logo depois de terem se formado. O ferro, por outro lado, é produzido em estrelas de pequena massa, pertencentes a sistemas duplos, como é o caso de Sirius. A componente que hoje é Sirius B deve ter nascido com menos de 8 massas solares. Ao morrer, ela deve ter perdido parte de sua massa, transformando-se numa anã branca com 1,05 massas solares
Quando Sirius A evoluir, parte de sua massa será capturada por Sirius B. Então, a anã branca poderá ultrapassar seu limite de estabilidade (1,4 massas solares) e explodir em forma de supernovas. Daí resultará uma nuvem de níquel-56 radioativo que vai destruir tudo num raio de mais de 10 anos-luz (Sirius está a 8,6 anos luz de nós). O níquel-56, por sua vez, se transformará em cobalto-56 e este, em ferro-56. Essas estrelas de pequena massa e, por isso, o ferro demorou mais para surgir na galáxia que o oxigênio. Ao que tudo indica, portanto, quando a Via Láctea nasceu, no halo galáctico surgiram grandes estrelas que logo explodiram gerando muito oxigênio. O gás que não havia se transformando em estrela entrou em colapso em direção ao centro, dando origem ao bojo e depois à parte velha do disco. O colapso deve ter sido muito rápido, em torno de 2 ou 3 bilhões de anos. Por isso, essas estruturas da galáxia são pobres em ferro. A partir daí, começaram a explodir as estrelas de massas intermediarias, de modo que as populações estelares que se formaram no disco jovem e nos braços espirais já apresentam grande quantidade de ferro. A descoberta de Beatriz Barbuy é uma peça arqueológica de primeira ordem para se rastrear a atividade metalúrgica da galáxia.