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Ralph Appelbaum

O designer americano conta como vem ajudando a tirar a imagem sisuda dos museus com atrações típicas de uma superprodução

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h37 - Publicado em 30 set 2001, 22h00

Rodrigo Cavalcante

Ralph Appelbaum é uma espécie de Steven Spielberg dos museus modernos. Com uma equipe de mais de 80 profissionais, que inclui arquitetos, historiadores e até paleontólogos, ele ajudou a mudar a imagem carrancuda dos espaços da história. A velha idéia do museu como um mausoléu, cheirando a poeira e formol, foi trocada pela de um programa repleto de imagens, som e muita emoção. “O design e a tecnologia ajudam o visitante a se sentir vivendo o passado”, diz Appelbaum. “É como se ele saísse da platéia e entrasse no palco, com a diferença que aquele espetáculo é real.”

Para provocar essa imersão, ele montou uma réplica climatizada da floresta amazônica no Hall da Biodiversidade do Museu de História Natural de Nova York e recriou a mesma atmosfera do campo de concentração de Auschwitz no Museu do Holocausto, em Washington, fazendo com que os visitantes se sintam fragilizados como os prisioneiros – é comum encontrar pessoas chorando na saída. “O design tem que ajudar a contar uma história, uma experiência única”, diz Appelbaum, que já participou de cerca de 100 projetos em mais de 50 cidades em todo o mundo – no ano passado, ele foi um dos consultores do projeto do Memorial do Rio Grande do Sul, em Porto Alegre.

Super – Alguns dos seus projetos usam atrações típicas de um filme de Hollywood para atrair o público. Isso não transforma os museus num imenso parque de diversões?

Tradicionalmente, o papel de um museu tem sido o de preservar e conservar o patrimônio. Hoje, eles são mais do que isso. São espaços que usam a tecnologia e outros recursos para contar uma história. É preciso reconhecer que a tecnologia ajudou a democratizar o acesso à informação. Enquanto, no passado, museus eram elitistas, visitados por uma minoria intelectual, hoje qualquer pessoa é bem-vinda a um museu. Desde que a história seja contada com profundidade, não vejo nenhum problema em usar recursos tecnológicos para atrair o público. Até mesmo porque vivemos numa era de grande competição pelo tempo das pessoas. Mesmo assim, museus sempre terão uma diferença fundamental dos filmes de Hollywood e de parques temáticos: eles contam histórias reais, que não podem ser imaginadas pelos melhores escritores de ficção.

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Como se projeta um novo museu?

Tudo começa com muita pesquisa, colaboração de especialistas, enfim, busca de informação. O que nós fazemos é transformar essa informação em uma narrativa e depois essa narrativa em uma experiência de imersão. A arquitetura e o design do museu são fundamentais para provocar essa experiência. Museus modernos, na maioria das vezes, são museus de interpretação, precisam de um contexto, de um entorno. São mais parecidos com uma peça de teatro com a diferença de que você pode caminhar pelo palco.

No Museu do Holocausto, em Washington, o que você fez para conseguir essa imersão?

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É claro que é impossível transmitir a experiência de um prisioneiro de um campo de concentração. Mas podemos aproximar o visitante de tudo o que aconteceu. Viajamos para Auschwitz com o desafio de transportar essa experiência no tempo e no espaço, trazendo evidências do que aconteceu. Fotografias, sapatos dos prisioneiros e o ambiente físico do museu ajudam nessa imersão. Tive o cuidado de não retratar o holocausto apenas do ponto de vista das vítimas ou dos nazistas, mas de um terceiro participante do crime: a testemunha que viu tudo passivamente. Do projeto inicial à inauguração foram cinco anos de trabalho.

Na década de 90, surgia um museu a cada mês no Japão. Depois do Guggenheim de Bilbao, na Espanha, eles proliferam por toda a Europa e outros países. Há espaço para todos?

Acho até que não temos museus suficientes. Enquanto as sociedades produzirem coisas de valor e as pessoas permanecerem curiosas diante do mundo natural, é nossa responsabilidade criar espaços para compartilhar tudo isso com as futuras gerações. Além do mais, a criação de museus como o de Bilbao é mais do que a criação de um museu, é o nascimento de uma nova arquitetura e o renascimento de uma cidade, uma oportunidade de atrair as pessoas de volta para o centro urbano. Museus tornam a vizinhança segura, atraem lojas, restaurantes e pessoas para relaxar, numa convivência pacífica. Estamos falando do renascimento de espaços sociais, da arquitetura e da qualidade de vida que vem com tudo isso. O curioso é que, no fundo, os museus continuam bem próximos da sua origem.

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Como assim?

Na Grécia Antiga, o museu era a casa das musas. As musas eram as deusas da memória, que dormiram com Zeus por nove dias e geraram nove filhas. Uma delas era responsável pela poesia, outra pela música, outra pela arte e assim por diante até a nona. Em Atenas, no século IV a.C., alguém que fosse para um museu deveria evocar o espírito das musas para escutar música, olhar objetos de arte, falar com filósofos. O mesmo acontece quando as pessoas vão para o Guggenheim de Bilbao ou outro belo museu no mundo.

Como você começou a projetar museus?

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No final dos anos 60 entrei para o Corpo de Paz da ONU e fui para os Andes peruanos, onde vivi três anos. Lá, trabalhava com artesãos e pude acompanhá-los pelas montanhas fazendo o artesanato, decorando os objetos, em suma, vendo todo o significado que havia por trás daquilo. Quando via o mesmo objeto exposto num museu apenas com uma linha de texto dizendo o que era e de onde era, percebia que o objeto não tinha uma voz. Eu sabia que havia um contexto maior oculto naquele objeto. Naqueles anos, senti que, com as técnicas da comunicação moderna, o objeto poderia ter a voz de quem o fez, de como foi feito e do seu significado. Voltei para os Estados Unidos e notei que os museus também estavam preocupados em enriquecer a apresentação do que era exposto. Comecei a participar de alguns projetos e não parei mais.

Você trabalhou no Memorial do Rio Grande do Sul, em Porto Alegre, e esteve no Brasil em outras oportunidades. O que acha dos museus brasileiros?

Recentemente, vi a mostra Brasil 500 Anos e fiquei impressionado com a diversidade artística e o design das exibições. Achei o design extraordinário e senti que a comunidade de museus no Brasil está cada vez mais competente. Gostamos também do espírito de colaboração. A diversidade das pessoas e a vitalidade da cultura nos fez sentir em casa.

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O que difere os seus museus de outros projetos?

Sinceramente, não costumo pensar nisso. Tenho uma equipe muito dedicada e maravilhosa, que atua em diversas áreas. Acho que as pessoas percebem que queremos que elas sintam a mensagem do museu da forma mais direta. Elas respondem visitando, retornando, tendo prazer e, às vezes, sentindo-se um pouco donas do museu, comprando um livro ou ajudando na sua manutenção. O mais extraordinário que um museu pode alcançar é quando o visitante se torna mais que um visitante. Ele se sente responsável em preservar aquilo não só para ele, como para os seus descendentes que ele nem irá conhecer.

rcavalcante@abril.com.br

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