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Rumo às luas

Os planos dos exploradores espaciais incluem a conquista dos satélites de Júpiter e Saturno, a descoberta de uma nova Terra e, claro, o contato com alienígenas.

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h32 - Publicado em 30 nov 2002, 22h00

Flávio Dieguez

Desde que o astronauta russo Yuri Gagarin passeou pela primeira vez acima da atmosfera, há 45 anos, permanecendo 108 minutos no espaço, cerca de 700 homens e mulheres não apenas repetiram a sua proeza como ampliaram progressivamente o tempo de permanência em órbita. Da marca de apenas algumas horas, nas duas primeiras décadas da corrida espacial, dezenas de astronautas fizeram papel de cobaia para demonstrar que a humanidade pode, sim, viver e trabalhar no vácuo. Nos próximos dez anos, tecnologias cada vez mais sofisticadas prometem nos aproximar ainda mais da grande aventura do século XXI: a colonização de outros mundos, da Lua para Marte e daí para os estranhos e fascinantes satélites dos planetas gigantes mais próximos, Júpiter e Saturno.

Portanto, prepare-se. Esta década está destinada a ver uma espetacular revoada de naves de última geração, cujo objetivo é examinar cada centímetro dos corpos celestes mais próximos. Seu objetivo central, como sempre, é a busca do conhecimento. Mas não só: as expedições estarão de olho em locais para a instalação de colônias humanas e em depósitos minerais que as futuras empresas espaciais possam explorar.

Um dos projetos mais ambiciosos é a chamada iniciativa de sistemas nucleares, da Nasa, que quer criar minirreatores atômicos para gerar energia no espaço. As naves geralmente funcionam graças à luz solar, transformada em eletricidade por seus painéis. Mas Júpiter e Saturno ficam bem longe do Sol; melhor recorrer à energia atômica. Em parte, essa tecnologia já foi usada em duas naves recentes: a Galileo, atualmente estacionada acima de Júpiter, e a Cassini, que faz um tour pelas luas de Saturno. A Cassini causou sensação em janeiro deste ano pelas fotos espantosas que enviou do satélite jupiteriano Europa, onde parece haver um imenso oceano de água salgada, coberto de gelo.

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Se a Cassini confirmar essa hipótese agora, pode ressuscitar o projeto da nave Europa Orbiter, desenhada para estacionar acima dessa lua saturnina e observá-la de uma altitude de apenas algumas centenas de quilômetros. Seu propósito: procurar micróbios alienígenas. Achar um ET, mesmo que microscópico, é um dos sonhos dourados da humanidade. A Orbiter está suspensa por falta de verba, mas a Nasa não desistiu de construí-la e espera fazer o lançamento até 2010.

Enquanto isso, os tecnólogos poderão aprimorar seu know-how do espaço desenvolvendo uma estação espacial que possa ficar estacionada a 1,5 milhão de quilômetros da Terra (em comparação, a atual Estação Espacial Internacional fica a meros 300 km da superfície terrestre). A pretensão é montar um posto avançado – a uma distância três vezes maior que a da Lua à Terra – e aí instalar oito telescópios tão potentes quanto o Hubble, capazes de virar o cosmo do avesso. O maior problema é que, a essa distância, a estação seria bombardeada por altas doses de radiação. Seus tripulantes poderão acabar torrados se não estiverem protegidos por um escudo de grande eficiência. Essa é uma prioridade máxima dos 100 cientistas que estudam o projeto.

Quanto aos telescópios, o primeiro a ser construído será o James Webb, cuja missão é, simplesmente, ser o sucessor do Hubble. Será quase duas vezes maior que seu antecessor (terá 4 m de comprimento contra 2,40 m) e novas atribuições. Sua visão, por exemplo, será ajustada para ver principalmente ondas de calor. Elas serão captadas por uma lente incrível, composta de vários pedaços “dobráveis”. Chegando à estação espacial, essas partes se encaixarão automaticamente umas às outras até alcançar seu diâmetro real, que será de 6 m, gigantesca para um telescópio espacial. Outra curiosidade é que o instrumento terá de ficar sempre congelado a 240ºC negativos: isso porque, como ele enxerga calor, a sua própria temperatura poderia criar um “ruído” de fundo, prejudicando a qualidade das imagens.

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O objetivo de tudo isso é complementar o trabalho do Hubble, que era, principalmente, observar o Big Bang, a explosão que deu origem ao universo, há 13,5 bilhões de anos. Daqui para a frente, o James Webb tentará entender o que veio depois do Big Bang: o nascimento e a evolução das galáxias e, em particular, a história da nossa própria galáxia, a Via Láctea. Dentro dela, o alvo é decifrar o nascimento e a evolução das estrelas e de seus planetas. Ou seja, ele vai buscar outros sistemas solares, distintos do nosso. Essa concatenação é perfeita, com um telescópio dando seguimento à tarefa do anterior.

Terra 2 – A missão

Mas, então, qual seria o próximo passo? A resposta da Nasa é um novo instrumento, programado, em princípio, para levantar vôo por volta de 2015. Ele é conhecido, atualmente, pela sigla TPF, que, em inglês, significa descobridor de planetas terrestres. É que a sua especialidade já não será observar sistemas solares inteiros, como o James Webb: o TPF, em vez disso, poderá discernir cada planeta individualmente, mesmo que seja um mundo relativamente pequeno – vale dizer, do tamanho da Terra. É até possível que o TFP, depois de levantar vôo, por volta de 2015, possa ver continentes nesses longínquos irmãos da Terra. É uma perspectiva fascinante, que promete nos dar uma idéia mais precisa sobre o aparecimento da vida em outros lugares do cosmo. Se encontrarmos muitos planetas parecidos com a Terra nesses outros sistemas solares, é possível que alguns deles sejam habitados por criaturas um pouco mais avançadas do que simples bactérias.

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Apesar do grande entusiasmo que esses projetos provocam, a grande estrela da pesquisa espacial, ao longo desta década, deverá mesmo ser Marte, nosso vizinho mais próximo dentro do Sistema Solar e o único, até onde se sabe, que poderia oferecer condições confortáveis para possível colonização pelo homem. Diversos projetos estão, atualmente, em andamento com vistas à conquista do chamado planeta vermelho. O projeto mais adiantado é o da nave Mars Express, de responsabilidade dos países europeus, por meio da agência espacial européia, a ESA. Com lançamento previsto para os próximos 12 meses, ela está sendo preparada para estacionar na órbita de Marte e, lá de cima, analisar a superfície marciana. Mas não apenas isso: ela também deverá carregar um módulo de aterrissagem, o Beagle-2. Trata-se de uma sonda teleguiada, capaz de se desprender da nave-mãe e pousar na superfície.

O principal objetivo da Mars Express é entender por que Marte é tão desértico, hoje em dia, embora haja sinais muito fortes de que já teve água em abundância e, talvez, multidões de bactérias proliferando em seus mares. O único jeito de descobrir, dizem os cientistas, é fazer uma análise química detalhada do solo marciano. Para isso, a nave usará um “espião”, chamado Spicam. Trata-se de um sensor que capta radiação ultravioleta e infravermelha emitida pela superfície marciana e, por meio delas, poderá decifrar as reações químicas que estão ocorrendo lá embaixo. Já se sabe que Marte é “enferrujado” – quer dizer que suas rochas e solos tendem a reagir fortemente com o oxigênio (vem daí, inclusive, a sua característica aparência avermelhada). O problema consiste em estudar as reações químicas e tentar descobrir como surgiu essa tendência.

Toupeira marciana

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Outro instrumento interessante da nave é o Marsis, uma espécie de radar que pode ser sintonizado para detectar água. Dito de outra maneira, ele pode verificar se existe água escondida no subsolo marciano. Já não há muita dúvida de que as moléculas de H2O rolaram pelas planícies vermelhas. Mas o Marsis poderá confirmar se parte dessa água ainda está lá – e apenas escorreu para debaixo do solo. O radar poderá fazer essa verificação até a uma profundidade de 5 km. É o que diz o seu criador, o físico italiano Giovanni Picardi, da Universidade La Sapienza, em Roma. “Esse tipo de sondagem foi tentada uma só vez antes no espaço”, diz ele. “Foi num experimento bem-sucedido durante o programa Apollo” (dirigido à conquista da Lua na década de 70). Picardi explica que o radar poderá ver a grande profundidade graças às ondas emitidas pela antena do instrumento, com 40 m de diâmetro. As ondas do radar são parecidas com as de rádio, e isso lhes dá grande capacidade de atravessar rochas.

O resto do trabalho será realizado pelo módulo de aterrissagem, o Beagle 2. Esse nome é o mesmo que tinha o navio no qual o naturalista inglês Charles Darwin viajou pelo mundo no século XVIII, na pesquisa que o levaria a criar a teoria da evolução. Evolução tem a ver com vida e o papel do Beagle será procurar pistas de algum tipo de organismo em Marte. Para checar esse ponto, pretende-se que o módulo faça algo inédito na história da exploração espacial: escavar um outro mundo. Ele deve soltar no solo um aparelho capaz de rastejar e abrir buracos num raio de 3 m em torno do Beagle. Essa maquininha já está sendo chamada de toupeira, um nome muito adequado. Deverá ser esperta o suficiente para se esgueirar debaixo das pedras, embora faça isso com a lerdeza de uma lesma: vai se mover a apenas 6 m por hora.

De qualquer forma, ele terá, na ponta da sua pá escavadeira, uma pequena cavidade para guardar as amostras de solo que for tirando. Também poderá coletar material com a ajuda de um raspador de rochas, cuja tecnologia foi inspirada nos motores de dentista. Foi desenvolvido por pesquisadores da Universidade de Hong Kong, China. Seu alvo será a poeira que costuma aderir às rochas marcianas. Se, nas amostras colhidas, houver restos de compostos de carbono – um indício forte de atividade vital –, eles poderão ser detectados pelas análises químicas que o Beagle está bem equipado para fazer.

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Além das Mars Express, há diversas outras missões cujo objetivo é descer em outros planetas. Cabe mencionar as sondas espaciais NetLander, desenvolvidas na Europa. Deverão voar somente em 2008 e levarão quatro módulos de aterrissagem em Marte. As quatro devem pousar simultaneamente em diferentes regiões do planeta. Sua missão será medir uma possível atividade sísmica no planeta. Se ela registrar algum abalo, é sinal de que Marte não está ainda geologicamente morto, como a Lua.

Outra missão importante será a da BepiColombo, nome de uma nave que os europeus pretendem lançar com destino a Mercúrio. Se tudo der certo deverá aterrissar em 2012 no lado escuro e frio do planeta. Do outro lado, permanentemente exposto ao Sol, a temperatura seria fatal para qualquer visitante, mesmo que seja feito de metal. A sonda usará flashes de luz para fotografar a superfície. Um pequeno rover (um robô sobre rodas) vasculhará o terreno em volta e uma toupeira, similar à do Mars Express, escavará o solo até a profundidade de alguns metros.

Jóquei de cometa

Por fim, vale a pena registrar uma ousadia sensacional, programada para acontecer já a partir de janeiro de 2003: trata-se da sonda européia Rosetta. Vai ser a primeira nave a orbitar o núcleo de um cometa, o 46 P/Wirtanen. A nave poderá chegar, em alguns momentos, a apenas 1 km do núcleo cometário. Com isso, será possível medir sua densidade e analisar o material do qual ele é composto. Os instrumentos da Rosetta fornecerão uma espécie de radiografia interna do cometa. Aliás, a Rosetta também poderá observar de perto dois asteróides relativamente próximos da Terra, chamados Otawara e Siwa. Não por acaso se espera que a nave demore oito anos para fazer suas visitas e ainda leve mais dois fazendo análises. Não está descartada, além disso, a possibilidade de ela tentar pousar no pequeno astro de cauda. Esse módulo aterrissador pesaria 100 kg e deverá, literalmente, “pular” sobre o cometa. Para não cair desse “cavalo chucro”, poderá se agarrar à superfície usando três grandes pernas de aranha.

Em seguida, ainda fincaria um arpão no solo, capaz de, definitivamente, ancorar o módulo ao núcleo cometário.

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