Subestrelas: Finalmente uma anã marrom em carne e osso
Caso se confirme a impressão de que o objeto detectado seja uma anã marrom, estaremos diante da possibilidade de um grande avanço científico.
Ronaldo Rogério de Freitas Mourão
Anãs marrons são singulares corpos celestes que não são planetas nem chegam ao status de estrelas. Uma anã marrom será sempre um astro relativamente frio, com temperatura superficial em torno de 1000 graus Kelvin (mais ou menos 700 graus centígrados). O Sol, uma estrela, tem temperatura de 6 000 graus Kelvin (cerca de 5 700ºC); Júpiter, um planeta, o maior de todos, tem mais ou menos 96 graus Kelvin (quase 100 centígrados negativos).
Subestrelas, as anãs marrons foram previstas teoricamente, mas jamais haviam sido registradas concretamente. Tendo em vista a baixa temperatura e a baixa luminosidade, não é fácil detectar sua presença por qualquer dos métodos utilizados pela astronomia para observar os corpos celestes. Na verdade, só podem ser observadas através de telescópios ou sondas espaciais sensíveis às ondas infravermelhas.
Dois grupos principais de estrelas de baixa massa têm sido relacionados pelos astrônomos. O primeiro compreende os sistemas de duas estrelas, uma das quais é a companheira da estrela invisível, detectada apenas pela perturbação que provoca no movimento da outra. Em virtude de sua temperatura muito baixa, essa companheira só emite radiação no infravermelho, o que toma muito difícil sua observação. O caso mais célebre é o da companheira da estrela Van Biesbroech 8, observada com aparente sucesso pelos astrônomos do Observatório Naval do Arizona, em 1985.
Denominada VB8-B, teve medidas a temperatura, luminosidade e massa. Durante algum tempo discutiu-se se seria um planeta ou uma anã marrom, até que, em 1987, observações precisas realizadas no Observatório Europeu Austral, no Chile, deixaram claro que essa companheira não existe. O outro grupo é o das estrelas isoladas de baixa massa e luminosidade, que tem na LHS-2924 uma boa representante.
Em novembro do ano passado, ao estudarem anãs brancas (estrelas de baixa luminosidade, temperatura de superfície relativamente alta e densidade extremamente alta), os astrônomos americanos Benjamin Zuckerman, do Departamento de Astronomia da Universidade da Califórnia, e Eric Becklin, do Instituto de Astronomia da Universidade do Havaí, descobriram que a estrela Giclas 29-38 parece emitir um excesso de radiação em infravermelho. Estimaram, então, sua temperatura superficial em 1 200° Kelvin.
Situada a 45 anos-luz da Terra (mais de 400 trilhões de quilômetros), essa estrela tem uma massa situada entre 4% e 8% de massa solar — a incerteza da refletida provém da imprecisão dos modelos teóricos aos quais foram comparados os dados de observação. Ora, um objeto celeste com massa superior a 1 % de massa solar deixa de ser um planeta; mas abaixo de 8% de massa solar não chega a ser uma estrela propriamente dita. Um objeto celeste nesses limites de massa solar pode queimar hidrogênio lentamente, durante bilhões de anos, e jamais alcançar o estado estacionário no qual as reações termonucleares chegam ao estágio terminal.
Talvez Zuckerman e Becklin tenham descoberto um ponto especial do gráfico da evolução estelar. Caso se confirme a impressão de que o objeto detectado por eles seja uma anã marrom, estaremos diante da possibilidade de um avanço científico comparável ao que seria proporcionado pela identificação de um novo sistema planetário — ou talvez ainda mais. Essa descoberta pode completar a teoria sobre a origem e a evolução de estrelas e planetas no Universo. Vai contribuir enormemente para que se compreenda como uma estrela em formação se condensa a partir de uma nuvem de gases. Por outro lado, ajudará também a saber quando e como a matéria interestelar é capaz de se aglutinar para formar outra estrela, um planeta ou os anéis de fragmentos como os cinturões de asteróides ou, ainda, os cometas. Finalmente, a descoberta e a determinação da frequência dessas estrelas tênues e de massa reduzida permitirão determinar a massa das galáxias e resolver, enfim, o grande problema da massa faltante do Universo — uma quantidade de massa que a teoria diz que deve existir, mas ninguém conseguiu ainda dizer onde está.