Te vejo na rede
Fáceis de usar, os programas de bate-papo com imagens entram para a rotina dos internautas e ameaçam o lugar do velho telefone.
Gabriela Aguerre
O convite para o aniversário de 26 anos da gaúcha Lenara Verle, no dia 9 de outubro, já dava pistas de que a festa não seria convencional. Chegou por correio eletrônico. Até aí, tudo bem. Só que o texto vinha em inglês, o endereço era virtual e havia treze horários diferentes, considerando o fuso de várias cidades mundo afora. Lenara estava convidando os amigos para uma ciberfesta. A comemoração só foi possível porque os convidados todos estavam equipados com computador, claro, e mais o que começa a ser chamado de webtelefone, ou seja, um programa que possibilita a ligação telefônica e a transmissão de vídeos via Internet. Ah, e todos também tinham minicâmeras de vídeo acopladas ao micro (webcams). Assim, podiam mostrar a cara na festa, quer dizer, no computador da aniversariante.
Embora pareça original, a ciberfesta de Lenara está deixando de ser privilégio de internautas avançados e pode se tornar corriqueira. Cerca de 1 milhão de brasileiros já têm programas de webtelefonia, embora a maioria ainda não possua webcams. Mas isso está mudando. Neste último semestre de 1998, uma das maiores lojas de informática de São Paulo, a Plug Use, tem vendido entre 500 e 700 unidades das pequenas câmeras por mês. O principal motivo de tamanha adesão a uma tecnologia tão recente é o preço. Quem tem um computador bem equipado e está ligado à Internet não precisa gastar nem 200 reais para ter em casa essa versão do telefone visual de Os Jetsons, a popular série de TV dos anos 60. Tudo bem, ele ainda é precário, é verdade, principalmente por causa da imagem que se movimenta lentamente. O interlocutor, do outro lado, fica parecendo um robô. Isso, porém, como você vai ver nesta reportagem, também deve mudar logo, logo.
Desafio da imagem será vencido
Ver o interlocutor é, sem dúvida, o maior ímã da telefonia pela Internet. “A visão é um sentido fundamental nas relações interpessoais”, filosofou, num e-mail enviado à SUPER, o estudante uruguaio Andres Richero, 23 anos, que ficou entusiasmado quando conheceu os programas de videoconversa. “Com eles, a gente consegue uma sensação de proximidade muito maior do que com o e-mail ou o chat”, explica. Chat, você sabe, são esses grupos de conversa da Internet nos quais as pessoas se comunicam ao vivo umas com as outras por mensagens escritas.
Contraditoriamente, ao menos por enquanto, a imagem é também o principal ponto fraco do novo meio. Enquanto a televisão transmite 30 quadros por segundo, a tela do computador de quem tem uma linha de telefone comum (a grande maioria dos brasileiros) mostra, em média, 3 quadros por segundo, ou dez vezes menos. O resultado é um descompasso grande entre o que você ouve e o que vê. Seu interlocutor pode passar alguns segundos com a cara congelada e a boca aberta, embora o som de sua fala continue rolando, naturalmente. Tudo porque o tráfego de texto, imagem e som sobrecarrega a rede telefônica. Ela não suporta tanta informação em tempo real.
Mas estão surgindo alternativas. No dia 1º de outubro, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), órgão do governo federal, autorizou a comercialização de acesso à Internet via cabo – o mesmo sistema usado por algumas distribuidoras de televisão por assinatura. O serviço já começou a ser oferecido em Vitória, Espírito Santo. Logo deve se espalhar pelas capitais. Com ele, a qualidade da Internet fica igualzinha à da televisão.
E quem não tiver acesso ao cabo ainda terá uma chance, embora não tão eficiente, para melhorar o desempenho do webtelefone. A chamada Rede Digital de Serviços Integrados (RDSI), que fornece linhas domésticas digitais (como as dos celulares da Banda B), começa a se tornar realidade. Em Belo Horizonte, ela foi inaugurada há quatro meses e cerca de 1 000 linhas já estão instaladas. Em São Paulo e em Salvador está em teste, com apenas algumas linhas implantadas. A principal vantagem da novidade é que a velocidade de transmissão de dados vai aumentar muito, chegando a 128 quilobits por segundo, quatro vezes mais do que se pode alcançar hoje.
“Só com essas linhas as imagens vão atingir os 15 quadros por segundo”, diz Marcos Rosenthal, da Picture Tel, uma empresa que faz produtos para aumentar a velocidade dos programas de videoconversa. Nos Estados Unidos, onde várias cidades já têm Internet por cabo e telefone digital, os telefonemas com imagens estão virando uma mania. “Dentro de dois anos, você vai olhar um monitor e não vai saber se é micro ou televisão. Aí, o telefone com imagem será regra e não exceção”, prenuncia Dagoberto Hajjar, diretor de Internet da Microsoft, que faz o Netmeeting, um dos programas de webtelefonia.
Tem muita gente apostando na previsão de Hajjar. Entre eles, a gaúcha Lenara e sua ciberturma, que, longe de se incomodar com as imperfeições da tecnologia, querem mais é aproveitar o que ela já tem de bom. “Eu cultivo relacionamentos com gente do outro lado do mundo não só trocando idéias, mas vendo, olhando para os meus amigos”, diz Lenara. Na festa de outubro, ela recebeu até flores virtuais. Dos Estados Unidos.
A gaúcha Lenara comemora seu aniversário com uma festa no apartamento de Porto Alegre, onde recebeu alguns amigos reais…
…E outros virtuais, como o americano Ed Stastny, que está a milhares de quilômetros de distância, na cidade de Omaha, em Nebraska
Videofone não vingou
Aparelhos com cara futurista foram superados pelas novidades da Internet.
Quando os primeiros videofones apareceram no mercado, poucos anos atrás, parecia que o futuro tinha chegado de vez. O telefone iria ganhar uma tela de televisão e não íamos falar mais “alô, quem fala?”, porque já veríamos quem estaria no outro lado da linha. Mas o videofone foi uma moda que não pegou. Por um fator fundamental: para funcionar, precisa que a pessoa do lado de lá tenha um equipamento idêntico. E ele custa caro, cerca de 1 400 reais. Para piorar, a qualidade da imagem deixa a desejar, mostrando de um a dez quadros por segundo, contra os 30 quadros da TV. A telefonia pela Internet carrega a vantagem de que, hoje, quase todo mundo tem computador em casa.
O problema da imagem? Anda existe, mas caminha para uma solução com as linhas telefônicas digitais.
Câmera assusta os mais acanhados
Mesmo sem uma câmera de vídeo ligada ao computador, você pode participar de festas como a de Lenara. O problema é que só vai ver as pessoas do lado de lá. Ninguém verá você. Já tem até um nome para isso: no jargão da Internet, quem não tem webcam é conhecido como lurker, ou escondido. Em geral, é como lurker que a maioria dos adeptos da webtelefonia entra na brincadeira e isso não acontece por acaso. Conseguir um programa para usar a Internet como telefone é a coisa mais fácil do mundo. E você pode fazê-lo até sem gastar nenhum tostão.
Muita gente copia os softwares oferecidos para testes na Internet e, quando vence o prazo de experimentação, corre a copiar outro, de outra empresa. Mas isso não pode ser feito indefinidamente, pois as empresas percebem a malandragem e impedem que você continue tendo acesso aos seus produtos. Então, o jeito é comprar um deles (veja preços e características de alguns abaixo), o que pode ser feito pela própria rede, com pagamento por cartão de crédito.
Só com o programa instalado já dá para fazer ligações. Você poderá ouvir o interlocutor do outro lado, mas, em vez de falar, terá de escrever as mensagens, como num chat. Para falar de verdade, só com o microfone. Com programa, câmera e microfone instalados, você faz de tudo: fala, ouve, vê e é visto. Caso não tenh a quem chamar, mas queira conhecer gente nova, alguns programas mostram uma espécie de lista telefônica na qual aparecem os e-mails dos seus usuários. Tem gente que gosta disso e nem se incomoda de ter o próprio nome, endereço eletrônico e às vezes até idade, gostos e hábitos também divulgados entre os usuários do programa. Se for o seu caso, prepare-se. Toda vez que você se conectar, vão chover telefonemas de estranhos. “Eu acho divertido. Sempre tem alguém diferente com quem posso conversar”, disse à SUPER o paulistano Emerson Palácio, 28 anos.
Palácio é bem o tipo que gosta de computadores. Trabalha com eles, dando suporte técnico em uma empresa de informática. Aí chega em casa e relaxa na frente de uma telinha. Mas nem todo mundo é assim. Muitos abominam a idéia de ter a privacidade exposta à visitação. Para sorte desse pessoal, há programas que dão a opção de esconder o próprio e-mail da lista. Ele só aparece na tela do interlocutor.
Não fosse isso, talvez o engenheiro paulistano André Hübner, 28 anos, nem tivesse adotado a webtelefonia. “Eu não sou adepto de chats. Prefiro conversar com meus amigos”, explica Hübner, que costuma ligar a camerazinha para ser visto por dois brasileiros lurkers, velhos conhecidos seus, que moram nos Estados Unidos e ainda não instalaram webcam. Na casa de André, quem curte mesmo ficar na frente da câmera é o filho dele, de 3 anos. Do outro lado da linha, a avó coruja, habitante de um bairro distante, se derrete com as estripulias do neto. Se hoje, com todos os defeitos que a tecnologia carrega, já se vêem cenas assim, imagine como não vai ser quando a questão da transmissão de imagem estiver solucionada.
Semanalmente, o engenheiro paulistano André Hübner usa a webtelefonia para falar com amigos em Nova York…
…Enquanto o filho dele, Guilherme, de 3 anos, se diverte fazendo poses na frente da câmera de vídeo
A serviço do anonimato
Sistema americano socorre o navegante que deseja falar sem ser notado.
Alguns fanáticos pelos chats olham enviezado para a webtelefonia porque ela mostra a cara ou a voz do usuário. Esse pessoal preza muito o anonimato. Muitos gostam de mentir o sexo ou a idade, o que fica difícil com o novo meio. O pior, porém, é que, quando você faz um telefonema usando esses programas, seu e-mail aparece na tela do interlocutor.
Para resolver ao menos esse último detalhe embaraçante, a empresa americana AT&T criou um serviço, o Chat’n Talk. É um site que faz a ligação pela pessoa, o que mantém o seu endereço eletrônico em sigilo. Mas é preciso que as duas pontas da conversa tenham outra linha telefônica, além da que faz ligação com a Internet.
O serviço custa 15 centavos de dólar por minuto e só vale para Estados Unidos, incluindo Alaska e Havaí.
Para começo de conversa
Veja qual é o equipamento mínimo necessário para aderir à webtelefomania.
Modem de 28,8 quilobits por segundo mais kit multimídia
ou modem de voz de 33,6 quilobits por segundo
Configuração Pentium ou Pentium II, com processador de, pelo menos, 133 MHz
50 MB de espaço livre no disco rígido conector serial universal, para ligar a webcam
1 megabyte de memória de vídeo
32 megabytes de memória RAM (quanto mais, melhor)
Se você tiver um Mac…
A configuração terá de ser igual ou superior à do Power Mac 7600. Também será necessário um modem com voz, caso sua máquina não o tenha. E atenção para as webcams, que são específicas.
WebCam II
Este modelo da Creative Labs captura imagens com uma boa resolução.
Preço: 190 reais
QuickCam
A marca mais popular das webcams, da Connectix, tem modelos para PC ou Mac.
Preço: 249 reais
Microfone
Se o seu micro não tiver microfone embutido, você terá de comprar um, como este, da Quick Shat.
Preço: 10 reais
Turbine o micro para a brincadeira
Conheça alguns programas de videoconversa.
Vejo você também
Mais conhecido pela sigla ICUII, que, em inglês quer dizer I see you too. É um dos programas com melhor definição de vídeo.
Onde encontrar: https://www.icuii.com
Preço: 24,95 dólares
Opção prática
O Netmeeting não é vendido. Ele vem junto com a versão mais completa e moderna do navegador Internet Explorer 4.0.
Informações: https://www.microsoft.com/netmeeting
Preço: não tem
Para o seu lado criativo
Além do básico, o programa VDONet traz recursos para você produzir e enviar seu próprio videoclipe para os amigos.
Onde encontrar: https://www.clubvdo.net
Preço: 49 dólares
Eu te vejo, você me vê
Em inglês, see you see me, ou, resumindo, CUSeeMe. Permite colocar na tela, ao mesmo tempo, imagens de doze interlocutores. Mas você só fala com um de cada vez.
Onde encontrar: https://www.wpine.com/products/cu-seeme/
Preço: 69 dólares
Pacote completo e barato
Além do programa, o Kit Video Fone, da Compaq, traz uma webcam e o cabo de conexão dela com o micro.
Compaq: 0800 153015
Preço: 125 reais