Idade, batalhas sangrentas e democracia: como os animais escolhem seus líderes?
Do matriarcado até os Jogos Vorazes, esses animais têm maneiras criativas para resolver quem é o chefão de seus grupos. Conheça algumas delas.
Tal como nas sociedades humanas, vários grupos de animais também decidem por um único líder para representar as vontades das nações (neste caso, das manadas, colmeias e cardumes). Com a diferença que não há voto em urna eletrônica ou papelzinho: os bichos têm maneiras bastante criativas, e nem sempre democráticas, de eleger seus “presidentes”.
Por exemplo: assim como acontece entre humanos, alguns grupos de animais preferem coroar os mais velhos como seus representantes. Em várias famílias selvagens, por outro lado, o governo é exclusivamente feminino. Veja alguns exemplo abaixo.
Sucesso das nonnas
As baleias orcas seguem a mesma política que as famílias italianas: quem manda é a nonna, a avó.
Nos bandos das baleias assassinas, a líder é sempre a matriarca mais velha, que pode guiar o grupo por até 50 anos após ter seu último filhote – a expectativa de vida desses cetáceos chega à casa dos 90. Por serem as mais velhas, essas vovós têm a responsabilidade de ensinar aos seus descendentes tudo sobre sobrevivência: desde de como caçar até onde ir para encontrar mais comida.
Mesmo depois de passarem pela menopausa, essas líderes ainda são extremamente importantes para a sobrevivência do bando – alguns estudos já demonstraram como elas são essenciais para a sobrevivência de seus netinhos.
Os elefantes africanos também são adeptos da política matriarcal. São as fêmeas mais velhas que cuidam da manada.
As elefantas podem viver até seus 60 anos, e são especialmente habilidosas em reconhecer os rugidos de leões perigosos e proteger seu grupo de ataques. Segundo um estudo no Parque Nacional Amboseli, no Quênia, elas também utilizam sua memória de elefante [alerta de trocadilho intencional] para mapear a paisagem e guiar a família até recursos essenciais, como comida e água.
Vence a melhor
Por mais que o filme de animação Madagascar tenha te apresentado ao “rei Julien” como líder dos lêmures, o mais provável é que, na natureza, esse personagem seja uma rainha. Esses animais vivem em grupos mistos, de até 25 indivíduos. Para colocar ordem na bagunça e garantir um prato de comida, as fêmeas são extremamente agressivas – tanto com as outras fêmeas quanto com os machos.
Acontece que os lêmures machos são bem mais submissos e correm do confronto. Alguns preferem até mesmo passar por um jejum intermitente em vez de confrontar uma fêmea com fome. Afinal, ao evitar interações antagônicas com elas, esses machos podem melhorar suas chances de reprodução.
Já as hienas são as “meninas malvadas” da natureza. O critério de eleição é similar à classificação de grupinhos sociais no ensino médio: quem é a mais popular vence.
O único probleminha é que a posição na hierarquia é ditada desde o nascimento e é inflexível. A rainha então é uma nepo-baby, que herda o cargo e os conhecimentos da mãe – similarmente à uma aristocracia. As fêmeas alfa e seus filhotes têm o melhor acesso a comida e apoio social, garantindo sua saúde e maior sucesso reprodutivo. Isso reforça sua posição dominante, com os machos ocupando uma posição inferior.
Jogos vorazes
A coroação das abelhas é bem mais brutal, e segue o mesmo princípio que os Jogos Vorazes: quem continuar viva até o final, leva o trono.
Depois que a última rainha morre, as abelhas operárias correm contra o relógio para decidir sua sucessora. Todas as larvas recém nascidas são alimentadas com uma espécie de suco real – uma substância produzida pelas próprias operárias – até o terceiro dia de vida. Para se qualificar para a disputa, algumas dessas larvas devem continuar se alimentando do “banquete real” por mais tempo. São elas que podem virar rainhas.
Mas nem tudo é mel. Acontece que mais de uma abelha é mantida na dieta da realeza, e por isso algumas delas ainda precisam passar por uma batalha final. As rainhas lutam pelo trono da colônia com a principal arma: um jato de fezes. A lutadora atingida é imobilizada pelas operárias, permitindo que sua rival a ataque.
Isso tudo acontece com as abelhas Apis mellifera, as mais comuns. Em outras monarquias abelhudas, as regras podem ser mais distópicas ainda. Para descobrir mais sobre você pode clicar aqui.
Líderes pacifistas
Nossos primos evolutivos, os macacos bonobos, também são liderados pelas mulheres, mas neste caso é mais como uma bancada feminista. Nas sociedades desses primatas, as fêmeas decidem a rotina do grupo e se alimentam primeiro, até porque são elas que organizam as refeições. O conflito é muito menos comum em comparação aos chimpanzés, nossos parentes briguentos.
As fêmeas dominantes, embora menores que os machos, frequentemente intervêm como pacificadoras. Mas, quando têm a escolha, os bonobos são amantes, não lutadores. O contato íntimo é comum, e as fêmeas usam o sexo para reduzir tensões com machos (e também com outras fêmeas) – os próprios mascotes do “faça amor, não guerra”.
Regime violento
Os chimpanzés são o oposto do pacifismo. Os títulos de poder não são hereditários, e por isso os primatas machos constantemente se desafiam em batalhas, buscando um confronto direto para provar quem é o mais forte. Os alfas tem apenas um objetivo: ter acesso às fêmeas férteis para conseguir ser o pai da maior quantidade de macaquinhos possível.
A ordem é mantida a partir do controle de necessidades básicas, como a comida e a limitação dos direitos de acasalamento de outros machos.
Os gorilas-da-montanha também seguem uma estrutura parecida: o macho mais forte é o líder do bando. Porém, ele conta com alguns capangas para ajudá-lo a governar. O “número dois” do grupo costuma ser responsável por fechar a fila, ou seja, fica de guardião para ter certeza que todos os membros da família estão seguindo viagem. Mas ele não parece ser o preferido das fêmeas.
O número 3 é um guarda costas do líder, e, ao contrário do seu anterior, é um garanhão. Por fim, o quarto fecha a trupe dos seguranças. Por mais que a hierarquia seja bem definida, ainda existem desafios, e caso algum dos outros machos ganhe uma luta com algum dos líderes, substitui o perdedor no cargo.
O rei da selva também tem que lutar para manter seu trono. Os leões filhotes machos constantemente desafiam os líderes do grupo – o que justifica a expulsão deles por volta dos três aninhos.
Sozinhos e abandonados, esses bebês devem procurar novos grupos de leões para desafiar e tentar roubar a coroa. A dominância felina vem com algumas alegrias, como a prioridade no acasalamento, liderança e tomada de decisões. Além do mais delicioso: prioridade na hora do almoço.
Campanha de vereador
Alguns chimpanzés menores e menos agressivos se tornam líderes por meio da formação de coalizões, em vez de usar a força.
No Parque Nacional Gombe Stream, na Tanzânia, um chimpanzé manteve seu status de alfa criando laços com os outros, limpando seus pelos e interagindo mais com eles, formando assim uma aliança interpartidária. Alguns chegaram a fazer carinho em filhotes, algo semelhante a políticos que beijam bebês em suas campanhas políticas. Por meio de bondade e estratégias sociais, conquistam lealdade e os benefícios do poder, como acesso a comida e oportunidades de acasalamento.
Regimes democráticos (na medida do possível)
O perdiz-vulturino, uma ave grande e distinta nativa das savanas da África Oriental, depende do trabalho em grupo para sobreviver, já que sua plumagem vibrante facilita a caça por predadores.
Pesquisadores descobriram que a direção do grupo é determinada pelas ações dos membros dominantes. Quando esses dominantes monopolizavam uma área rica em alimentos, os subordinados trabalhavam juntos para mover o grupo para outro local, forçando os dominantes a abandonar a fonte de comida para o benefício coletivo. Ou seja, a decisão de onde o grupo vai depende de um consenso entre todos, e um número maior de subordinados pode facilmente superar a preferência dos dominantes.
O processo de “votação” dos macacos tonkeana é parecido. Tudo começa quando um grupo se aproxima de uma área de frutas. Quando um macaco quer ir para um determinado local, ele dá um passo na direção desejada, para e olha para trás para ver se os outros o estão seguindo. Outro macaco que prefere outro local faz o mesmo.
Assim, os macacos “votam” ao se juntar a um dos dois concorrentes, com base nas preferências e relacionamentos dentro do grupo. A votação termina quando o macaco para de olhar para o grupo. Os macacos que votaram na rota não escolhida se juntam aos outros e seguem para o local escolhido pelo maior número de membros.
As baleias cachalote também são democráticas. Elas vivem em grupos divididos por sexo, com as fêmeas formando grupos de cerca de 20 indivíduos, que permanecem unidas por longos períodos. Os machos visitam as fêmeas ocasionalmente, por poucas horas.
A sociedade das cachalotes parece funcionar por consenso, em vez de uma liderança hierárquica. Quando viajando em grandes grupos e em busca de fontes de alimento que mudam rapidamente, as decisões sobre a direção a seguir podem ser cruciais, especialmente para evitar predadores como orcas. Elas podem levar cerca de uma hora ou mais para decidir uma simples mudança de direção, tornando o processo democrático “lento e desordenado” (parece até a eleição americana).
Revolução ou transição?
Já os peixes-palhaço – o famoso Nemo – transferem poder de uma maneira única. A fêmea é o maior peixe do grupo, e quando ela morre, o maior macho da comunidade muda de sexo para se tornar a nova fêmea reprodutora. Essa transição de poder é parte da biologia dos peixes-palhaço e é irreversível. Diferente, não?