A humanidade está criando centenas de novas espécies no mundo
Aceita que dói menos: somos os vilões do meio ambiente. Mas, acredite se quiser, nosso modo de vida predatório tem um efeito colateral surpreendente - a criação de novas espécies
Durante a Segunda Guerra Mundial, os londrinos usavam os túneis do metrô para se abrigar das bombas alemãs. Lá dentro, porém, havia outro inimigo: hordas de mosquito esfomeados e prontos para o ataque. Só que não eram mosquitos comuns – eles haviam nascido nos túneis úmidos do metrô e, ao contrário dos insetos de superfície, só se alimentavam de sangue humano. Cinquenta anos depois do fim da guerra, cientistas da Universidade de Londres decidiram estudar os mosquitos misteriosos, e perceberam que eram uma espécie totalmente diferente dos encontrados na superfície. É isso mesmo: sem querer, nós criamos uma nova espécie. E ela não é a única.
Estamos carecas de saber que os seres humanos estão acabando com os ecossistemas e extinguindo milhares de espécies. Isso é verdade: nos últimos 12 mil anos, pelo menos 1.359 espécies de animais e plantas desapareceram da face da Terra. Se continuarmos no ritmo atual, as previsões são de que, em um futuro próximo, metade das espécies que existem hoje sejam aniquiladas.
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Mas calma: a natureza não é tão frágil quanto parece. De acordo com um novo estudo da Universidade de Copenhagen, os seres vivos não desistem da vida fácil assim. Tentando se agarrar à sobrevivência, centenas de espécies acabam se adaptando e criando mecanismos para vencer as mudanças que nós, seres humanos, impomos aos seus hábitats naturais – um processo chamado especiação.
Existem várias formas de fazer isso. Uma delas é a domesticação: pegar um animal selvagem para criar em casa, como aconteceu com os cachorros há cerca de 15 mil anos. Ao cruzar os indivíduos com traços mais desejáveis para, digamos, ser uma companhia em casa – como o tamanho e o temperamento, por exemplo -, acontece a especiação. Outro jeito de de fabricar uma espécie é trocar o hábitat de animais e plantas – nessa situação, tanto os seres locais quanto os estrangeiros precisam se adaptar para sobreviver.
E por fim, existe um terceiro jeito de criar espécies: criar novos hábitats. Isso acontece principalmente nas cidades, onde os seres humanos abrem túneis, constróem prédios e acabam com áreas verdes, o que obriga as espécies a encontrar novas formas de conseguir abrigo, alimento e espaços para a reprodução. Foi isso que aconteceu com os mosquitos em Londres: eles se desenvolveram para se alimentar apenas de sangue humano, já que essa era a única comida que entrava nos túneis do metrô.
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De acordo com o estudo da Universidade de Copenhagen, esses processos de especiação têm sido feitos aos montes pelos seres humanos. Os cientistas não têm um número exato, mas sabem que pelo menos 891 espécies de plantas e animais foram realocadas, e 743 foram domesticadas – e que ao menos 40 das plantas mais importantes para o consumo humano foram criadas artificialmente.
Mas, se a gente cria tantas espécies novas, qual o problema de as antigas serem extintas? Não é como se a gente estivesse fazendo uma reposição? Não exatamente. Para começar, as espécies mais velhas carregam milhões de anos de história evolutiva em seus genes – se elas forem extintas, toda essa adaptação desaparece com elas. As adaptações forçadas pelos seres humanos, ao contrário, só servem para os seres vivos sobreviverem nas novas condições impostas. E tem mais: se um animal chave como um lobo ou um tubarão for extinto, todo o ecossistema ao redor dele entrará em colapso – não importa quantas espécies novas aparecerem para substituí-los.