Assine SUPER por R$2,00/semana
Continua após publicidade

A Lua está enferrujando. Mas o que explica isso?

Sem oxigênio, o ferro lunar não deveria se deteriorar como ocorre na Terra. Mas cientistas já têm algumas hipóteses para explicar o fenômeno.

Por Bruno Carbinatto
Atualizado em 10 jul 2023, 18h20 - Publicado em 8 set 2020, 17h51

Quando uma equipe de cientistas analisou os dados da sonda indiana Chandrayaan-1, que orbitou a Lua em 2008, eles tiveram que checar os resultados duas vezes. Isso porque os pesquisadores encontraram indícios de ferrugem na nossa vizinha cósmica – a mesma ferrugem que observamos em objetos velhos de ferro aqui na Terra. Mas há um problema: a Lua não possui oxigênio, que é essencial para o processo de deterioração do ferro. Como ela está enferrujando, então?

Em estudo publicado na revista Science Advances em 2020, pesquisadores americanos exploram esse mistério e suas possíveis explicações. Tudo começou quando cientistas da Universidade do Havaí estavam analisando os dados obtidos pela nave Chandrayaan-1, da Agência Espacial Indiana, que estudou o astro por dois anos. Foi essa mesma missão que encontrou água congelada na Lua, assim como uma outra variedade de minerais em sua superfície.

Nessa análise, porém, os cientistas encontraram indícios de hematita (Fe2O3) nos polos lunares, o que é bastante estranho. O mineral é formado através da oxidação do ferro em contato com água e com o oxigênio – e, embora a Lua esteja repleta de rochas contendo ferro metálico e sabemos com certeza que também há água por lá, ela não possui atmosfera, e, portanto, não possui oxigênio. O mistério logo chamou atenção de outros astrônomos, que foram convidados para analisar o caso na nova pesquisa.

“No início, eu não acreditei totalmente. [A ferrugem] não deveria existir com base nas condições presentes na Lua”, explica, em comunicado, Abigail Fraeman, cientista do Laboratório de Propulsão a Jato da Nasa. “Mas, desde que descobrimos água na Lua, alguns vinham especulando que poderia haver uma variedade maior de minerais do que imaginamos, caso essa água tivesse reagido com as rochas.”

Continua após a publicidade

A existência de ferrugem é comum na Terra, que é repleta de ferro, oxigênio e água, e também em alguns meteoritos que reúnem esses três elementos. Em Marte, a oxidação do ferro em um passado distante, em que havia água e oxigênio na sua superfície, foi responsável por dar a cor avermelhada tão característica do planeta.

A Lua, porém, não parecia ser um ambiente propício para se enferrujar, e não só pela falta de água e oxigênio, mas também porque ela é bombardeada por átomos de hidrogênio que vêm do Sol. Quando um átomo de ferro da Lua interage com um desses hidrogênios visitantes, ele acaba ganhando um elétron, em um processo que é conhecido como redução. É o oposto do que acontece na formação da ferrugem, que é um processo de oxidação – quando o ferro interage com um outro átomo que vai tirar elétrons dele, como é o caso dos átomos de oxigênio. Isso deixa a existência de ferrugem na Lua ainda mais intrigante, já que o ferro, em geral, passa por redução no satélite, e não oxidação.

A explicação

Segundo a equipe, o que pode explicar a existência de óxidos de ferro na Lua é o oxigênio da própria Terra. Sim, a Lua pode não ter uma atmosfera própria, mas traços residuais de oxigênio são levados ao satélite através da magnetosfera, uma extensão do campo magnético terrestre causada pela radiação solar.

A magnetosfera se estende até a Lua, levando consigo um pouco do oxigênio presente em nossa atmosfera superior. Um indício de que esse fenômeno é de fato o responsável pela oxidação do ferro lunar é que a hematita foi encontrada concentrada em regiões próximas da Lua, enquanto seu lado mais distante tinha pouca ferrugem.

Continua após a publicidade

Além disso, em alguns períodos, como na Lua cheia, a magnetosfera bloqueia 99% do vento solar que atinge a Lua, reduzindo assim a quantidade de hidrogênio que chega a superfície do satélite. O hidrogênio, como dito, causa o efeito de redução no ferro, o oposto da oxidação. Sem a presença desses átomos, o ferro lunar acaba reagindo com o oxigênio residual que vem da Terra, formando, assim, a ferrugem.

Mas ainda há um terceiro ingrediente faltando na história: a água. Embora já se saiba que ela exista, só encontramos gelo na Lua em algumas regiões, todas afastadas de onde há ferrugem. Por quê? Os cientistas especulam que, talvez, essas moléculas de água acabam sendo espalhadas pelo satélite por partículas que bombardeia a Lua em alta velocidade, e assim retiram o H2O debaixo da superfície e permite que ela encontre o ferro em outras regiões.

Assim, em condições especiais, os três elementos (ferro, oxigênio e água) podem se encontrar na Lua e formar a ferrugem. “Esta descoberta vai remodelar nosso conhecimento sobre as regiões polares da Lua”, disse, em comunicado, o professor Shuan Li, que foi o primeiro a observar os indícios de hematita nos dados lunares. “A Terra pode ter desempenhado um papel importante na evolução da superfície da Lua.”

As hipóteses, porém, ainda não muito recentes, e novos estudos deverão ser feitos para testar se essa combinação incomum de fato pode acontecer no nosso satélite. E um outro mistério ainda permanece: a ferrugem foi encontrada também nas partes mais distantes da Lua, mesmo que em pouca quantidade. Nessas áreas, teoricamente, a magnetosfera terrestre não conseguiria alcançar. Então como o oxigênio foi parar lá? Ainda não sabemos.

Continua após a publicidade

“Creio que esses resultados indicam que há processos químicos mais complexos acontecendo em nosso Sistema Solar do que conhecíamos até então”, disse Vivian Sun, da Nasa. “Poderemos entendê-los melhor quando enviarmos futuras missões à Lua para testar essas hipóteses.”

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

A ciência está mudando. O tempo todo.

Acompanhe por SUPER.

MELHOR
OFERTA

Digital Completo
Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 2,00/semana*

ou
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba Super impressa e tenha acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 12,90/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$96, equivalente a R$2 por semana.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.