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Abandonada, a maior concentração de pinturas rupestres das Américas pede socorro

O Parque Nacional da Serra da Capivara, que deve ser homenageado na cerimônia de encerramento da Olimpíada, está às moscas.

Por Helô D'Angelo Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 11 mar 2024, 11h19 - Publicado em 18 ago 2016, 19h30

Ecologia e história são os dois grandes temas dos Jogos Olímpicos de 2016. No encerramento do evento, que acontece no próximo domingo (21), esse fio condutor deve continuar presente: a apresentação vai contar com uma homenagem ao Parque Nacional da Serra da Capivara. Além de ser uma reserva natural que mistura a caatinga à mata atlântica, o local é também a maior concentração de pinturas rupestres das Américas – e Patrimônio Cultural da Humanidade pela Unesco desde 1991. 

Mas o problema é que o parque está praticamente abandonado: sem recursos sequer para pagar os funcionários ou para cuidar das pinturas rupestres, a área está prestes a perder a proteção ambiental e arqueológica que existe desde os anos 70. A situação está tão ruim que a maior defensora do local, a arqueóloga Niède Guidon, já ameaçou largar tudo se algum dinheiro não fosse repassado pelo governo. Foi ela que pressionou o Estado a criar o parque, em 1978, e que dirige tudo por lá desde então – hoje, aos 83 anos, ela pode dizer que dedicou a vida ao lugar.

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O Parque Nacional da Serra da Capivara fica em São Raimundo Nonato, a cerca de 500 quilômetros de Teresina, no Piauí. Faz todo o sentido que ele seja considerado um Patrimônio Cultural da Humanidade: com uma área de 135 mil hectares, a Serra abriga mais de 900 sítios arqueológicos, sendo que 500 deles têm pinturas rupestres. São mais de 30 mil dessas antigas marcas da passagem humana, que retratam dança, caça de vários animais e outras atividades cotidianas daquela época. Também há cerâmicas, fósseis de animais já extintos e o crânio de Zuzu, de 12 mil anos – o mais antigo do Brasil.

No meio de tudo isso, foram descobertos restos de duas fogueiras: uma de 22 mil anos e outra de 50 mil. Esses achados, de 2003, deram o que falar na comunidade científica, porque contestam a hipótese de que os seres humanos chegaram às Américas pelo Estreito de Behring, entre a Rússia e o Alasca – e que só teriam alcançado a América do Sul há apenas 13 mil anos. No lugar, Niède Guidon propôs outra ideia – a de que alguns homens teriam entrado aqui pelo Oceano Atlântico e povoado a região há mais de 50 mil anos.

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Já deu para entender por que o parque é tão importante. No início, o local tinha uma estrutura impecável para cuidar de tudo: quatro carros para fazer rondas no local, 270 funcionários e uma guarita a cada 10 Km – com 28 guardas. 

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Mas, de uns tempos para cá, a Serra da Capivara tem perdido seus recursos. Ela é gerida pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), órgão federal, e pela a Fumdham (Fundação Museu do Homem Americano), criada por Niède em 1986. Essa combinação de administração pública e privada, incomum para parques nacionais, foi aos poucos dificultando os repasses de dinheiro do governo para a Serra.

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Hoje, restam 36 funcionários (só em julho, 27 foram demitidos), apenas um veículo para as rondas e só quatro guaritas funcionando. Sem a segurança de antes, as sedes foram invadidas e saqueadas, e Niède chegou a ser ameaçada de morte por caçadores que, antes da crise, eram mantidos afastados da Serra. Para piorar, a equipe é insuficiente para fazer a manutenção dos sítios arqueológicos onde estão as pinturas rupestres – se nada for feito, a infiltração das cavernas pode acabar apagando a arte nas paredes.

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A solução está longe de aparecer. Em fevereiro, a Justiça Federal determinou provisoriamente que o governo federal, o Ibama e o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) repassassem R$ 4,49 milhões para o parque – e deu, também, um ano para que o ICMBio traçasse um novo plano de administração. Mas o parque continuou em apuros.

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Na última quarta (17) – um dia depois de Niède Guidon ter anunciado que desistiria de tudo se o parque não recebesse algum dinheiro -, o ministério do Meio Ambiente anunciou que doaria R$ 1 milhão para ajudar a Serra. Mas “só” isso não deve durar muito: segundo a Fumdham, nas condições ideais de segurança e manutenção, o parque gasta cerca de R$ 250 mil por mês.

Agora, é esperar os desdobramentos dessa história – e cruzar os dedos para que o encerramento da olimpíada ajude as pessoas a voltar a atenção para a Serra da Capivara.

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