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Conheça o odderon: a partícula que não é partícula “detectada” pelo LHC

Trata-se de uma quase partícula: ele não é uma partícula, mas pode ser interpretado matematicamente como uma. Entenda.

Por Bruno Vaiano Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 10 set 2020, 14h38 - Publicado em 3 abr 2019, 16h01

Um grupo de mais de 100 pesquisadores de oito países, trabalhando com um detector chamado “Totem” no Grande Colisor de Hádrons (o famoso LHC), encontrou evidências da existência de uma partícula chamada odderon – que, na verdade, não é uma partícula, e sim algo chamado quase partícula. Segundo os próprios envolvidos na detecção, as evidências são preliminares, isto é: o odderon é possível, mas ainda não é uma certeza absoluta.

O LHC, vale refrescar a memória, é um túnel de 27 km de circunferência na fronteira da França com a Suíça usado para acelerar prótons à velocidade de luz – e então arremessá-los uns contra os outros. 

Você não entendeu nada do que está escrito acima? Ótimo, sinal de que você não é pós-graduado em física de partículas. Vamos explicar o que aconteceu com calma.

Começando pelo começo: você é feito de átomos. Átomos de hidrogênio, oxigênio, carbono, nitrogênio e outros elementos comuns da tabela periódica. São 7000000000000000000000000000 deles, para ser mais preciso –pois átomos são coisas realmente muito pequenas. Vai um bocado deles em um único ser humano.

Por muito tempo, os cientistas pensaram que os átomos eram as menores coisas que existiam. Que nada podia ser menor que um átomo. “Átomo”, em grego antigo (ἄτομος), significa “indivisível”.

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Na virada do século 19 para o 20, descobrimos que os átomos, na verdade, são só a porta de entrada para um mundo ainda mais microscópico.

Experimentos feitos por nomes familiares da aula de Química, como J. J. Thomson e Ernest Rutherford, revelaram que o dito cujo é composto de três unidades menores: os prótons e nêutrons (que ficam juntos em um minúsculo miolo chamado “núcleo”), e os elétrons (que ficam na periferia, circundando o núcleo).  

Achou que era tudo? Bem, não é. Em idos da década de 1970, descobrimos que os prótons e os nêutrons são compostos cada um por três unidades ainda menores, chamadas quarks – o nome foi tirado, muito adequadamente, de um dos romances modernistas psicodélicos de James Joyce.

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Os quarks que interessam para nós existem em duas variedades: up e a down. Dois ups e um down fazem um próton, dois downs e um up fazem um nêutron. Receita simples. 

Por enquanto, não há nenhum motivo para acreditar que um quark possa ser subdividido, de maneira que ele ganhou o rótulo de “partícula fundamental”. Quer dizer: fundamental mesmo. Do mesmo jeito que os gregos achavam que os átomos eram; absolutamente indivisível. 

Há outras 16 partículas fundamentais, a maior parte das quais, ao contrário dos quarks, não faz parte do nosso cotidiano. Essas partículas são descritas em pormenores por uma teoria chamada Modelo Padrão, e físicos altamente especializados as estudam com auxílio de máquinas como o LHC.

A função do LHC é acelerar prótons a uma velocidade próxima da luz, e então arremessá-los uns contra os outros. Quando eles trombam, o choque não é limpo como de duas bolas de bilhar. Lembra mais o encontro de duas coisas gosmentas – como águas vivas, para pegar emprestada a metáfora do astrofísico Paul Sutter.   

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Essa “gosma”, que dura frações de segundo, é caótica. Um monte de partículas misteriosas do Modelo Padrão, que não fazem parte do nosso cotidiano, aparecem graças à energia altíssima do impacto – e essa é a única oportunidade que temos de estudá-las.

Por isso, o LHC possui detectores extremamente sensíveis, que geram uma montanha de dados sobre as colisões. Os físicos mergulham nesses dados e isolam o que interessa.

Acontece que nem todos os prótons atirados pelo LHC fazem esse foguetório todo quando colidem. Alguns dão uma fina um no outro e acabam se desviando, sem desmanchar. Na década de 1970, físicos previram um fenômeno que poderia ocorrer quando um próton dá uma dessas esbarradas de leve em outro próton: o odderon.

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Para explicá-lo, precisamos voltar um pouquinho. Lembra que cada próton é feito por três quarks? Então: esses quarks se mantém unidos porque estão colados um no outro por partículas chamadas glúons. O nome vem do inglês para “cola”, mesmo: glue.

Quando dois prótons passam de raspão um no outro, eles podem trocar glúons. Se eles trocarem um número ímpar de glúons, teremos um odderon (odd, em inglês, significa ímpar).

Mas, SUPER, calma lá: você não tinha dito que o tal do odderon é uma partícula? Por que então você está dizendo agora que o odderon é uma coisa que acontece com outras partículas?

É o seguinte: do ponto de vista matemático, é mais fácil calcular as propriedades de um odderon se você tratá-lo como uma partícula, não como um acontecimento. Lembre-se: tudo que nós estamos explicando em palavras, os físicos entendem na forma de números. E, às vezes, atalhos e truques matemáticos deste tipo facilitam as coisas de um jeito incompreensível para um leigo.

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Não é tão estranho assim: é como fingir que as piadas do seu tio são boas para não arranjar confusão na ceia de Natal.

Isso torna as piadas do seu tio quase piadas, da mesma maneira que o odderon é uma quase partícula. Elas são mesmo piadas boas? Não, não são. Mas fica mais fácil de lidar com a ceia de Natal assim, porque ela já é confusa o suficiente por si só (agradeço novamente o astrofísico Paul Sutter pela metáfora).

Inferir que um odderon realmente aconteceu é muito difícil. Você precisa ter em mãos dados de centenas de colisões entre dois prótons – e também entre um próton e um antipróton (que é tipo a gêmea má do próton). Depois, você compara esses dados e vê se algumas inconsistências podem ser explicadas pela ocorrência de um odderon. Para os gênios que quiserem entender melhor, o artigo científico está aqui.

Como já dissemos no começo do texto, as evidências são preliminares. Mas, seja ou não seja um odderon o que rolou no LHC, agora você já sabe o que é um. Não se preocupe: ele não vai revolucionar a física de partículas. Só tornar o mundo microscópico ainda mais estranho do que já é.

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