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Lua vermelha: a jornada da URSS para (quase) pisar lá primeiro

Foi por muito pouco. Negado durante décadas, os soviéticos quase conseguiram a primazia no envio das primeiras missões tripuladas ao nosso satélite natural.

Por Salvador Nogueira
Atualizado em 7 jul 2020, 15h45 - Publicado em 17 jul 2019, 17h15

Se tudo tivesse corrido conforme os planos soviéticos, o primeiro homem a pisar na Lua teria sido o cosmonauta Alexei Leonov, no ano de 1968. Três anos antes, o projetista-chefe do programa espacial da União Soviética, Sergei Korolev, havia recebido autorização oficial do governo para executar o projeto, que envolvia a construção de um superfoguete e de espaçonaves capazes de levar um único tripulante ao solo lunar.

Enquanto os americanos tocavam seu programa lunar diante dos olhos do mundo todo – com todas as tentativas frustradas e dificuldades naturais –, os soviéticos mantiveram o seu em total sigilo. Por décadas, chegaram até a negar que tivesse existido qualquer esforço para levar uma nave tripulada à Lua. Mas os documentos da época, liberados após o fim da Guerra Fria, mostram que não só a disputa existiu como quase terminou em vitória para os vermelhos.

O programa ficou conhecido apenas pela sigla N-1/L-3. O N-1 era um foguete de alta capacidade capaz de impulsionar veículos tripulados à órbita lunar, era uma espécie de Saturn V russo. Já sob a designação L, havia três veículos-base, L-1, L-2 e L-3. O L-1 era uma nave tripulada que apenas contornaria a Lua, enquanto as séries L-2 e L-3 seriam usadas para colocar cosmonautas na Lua. Tanto o L-1 quanto o L-2 eram versões adaptadas do projeto básico da Soyuz, espaçonave desenvolvida por Korolev para operações orbitais que até hoje segue em uso.

As cápsulas do tipo L-1 eram versões ligeiramente encolhidas da Soyuz, que podiam ser lançadas para a Lua com foguetes já disponíveis na União Soviética desde 1964, como o Proton. Mas as naves L-2 e L-3 precisariam esperar pelo desenvolvimento do gigante N-1.

A L-2 era uma espécie de Soyuz vitaminada, capaz de transportar dois cosmonautas até a órbita lunar, fazendo as vezes da cápsula Apollo americana. E o L-3 era um módulo de pouso com capacidade para apenas um cosmonauta, que teria de descer sozinho até a Lua. Os planos previam os primeiros voos-teste para 1966, e as missões reais de órbita e pouso aconteceriam entre 1967 e 1968.

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Limitado, o módulo lunar soviético L-3 tinha um terço da massa de seu equivalente americano.

Hoje, até os especialistas russos concordam que o plano soviético era cheio de falhas e muito arriscado. Mas até 1965 ninguém – dentro ou fora da União Soviética – pensava assim. A ideia por trás do programa era apenas chegar lá primeiro, não chegar lá melhor, então qualquer esforço – e risco – estava valendo. Afinal, os soviéticos permaneciam invictos na corrida espacial, não tendo perdido um único marco importante para os americanos.

As coisas só foram se complicar mesmo no fim de 1965, quando Korolev teve diagnosticado um câncer de cólon. Foi internado, tratado e operado. Em janeiro de 1966, morreu sem ver um único teste de suas criações lunares.

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O programa do foguete N-1 continuava em desenvolvimento, mas os avanços eram lentos. Já o L-1 estava bem adiantado e diversos protótipos chegaram a ser lançados. O mais intrigante deles, em setembro de 1968, promoveu a primeira visita às cercanias da Lua por habitantes da Terra – só que eram tartarugas, moscas, bactérias, sementes e plantas. Detalhe: elas voltaram à Terra em segurança, pavimentando o caminho para um futuro voo circunlunar tripulado. Provavelmente teria acontecido se os americanos não tivessem se antecipado e lançado a Apollo 8 na direção da Lua, em dezembro daquele ano (leia mais na pág. 24). Depois disso, só um pouso lunar tripulado poderia servir aos soviéticos, e eles decidiram concentrar os esforços no N-1.

A corrida entrava em seu momento decisivo. No início de 1969, o gigante N-1 finalmente estava pronto para um voo-teste. Às 9h18 da manhã do dia 21 de fevereiro, o foguete se desprendeu da base e subiu, deixando atrás de si uma elipse de fumaça branca. O sonho durou 68,7 segundos, até que vibrações anômalas e um incêndio fizeram o comando abortar a missão e explodir o N-1, a 30 quilômetros de altitude.

 

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(Divulgação/NASA)
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Uma segunda tentativa ainda seria conduzida em 3 de julho daquele ano, mas os resultados não foram muito diferentes. Depois de 50 segundos de voo, o enorme N-1 ficou fora de controle e teve de ser destruído no ar.

Apenas 13 dias depois, partia do Centro Espacial Kennedy, na Flórida, a missão americana Apollo 11. Em 20 de julho, Neil Armstrong e Edwin “Buzz” Aldrin fincariam a bandeira americana na superfície lunar, marcando a definitiva virada dos Estados Unidos na corrida espacial (leia mais sobre ela na pág. 30). O N-1 ainda teve dois voos de teste, em 1971 e 1972, ambos fracassados, antes de o programa ser suspenso pelos soviéticos em 1974 e cancelado sumariamente, de forma melancólica, dois anos depois.

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