Morte brutal de faraó egípcio é revelada por imagens de tomografia
Múmia de Seqenenre Taa II foi revisitada por um estudo da Universidade do Cairo – que descobriu que o final do líder foi mais sangrento do que se imaginava.
O faraó egípcio Seqenenre Taa II – o Bravo – teve uma passagem curta pelo trono. Ele governou a porção sul do império entre 1.558 a 1.533 a.C, mas foi morto em combate quando tinha por volta dos 40 anos. Isso aconteceu porque, durante seu governo, egípcios tinham de lidar com uma presença incômoda: a dinastia dos hicsos. Vindos da Ásia, os estrangeiros controlaram por um século (de 1.650 a 1.550 a.C) a parte norte do Egito. Enquanto isso, exigiam tributos da parte sul do reino – e faziam, vez ou outra, algumas exigências absurdas.
Segundo relatos encontrados em papiros, Seqenenre Taa II se revoltou contra os invasores após receber uma reclamação peculiar. O rei hicso, que morava no norte, se queixava de que o barulho dos hipopótamos que viviam em um tanque sagrado em Tebas, no sul, estava perturbando seu sono. A acusação trazia uma exigência: a tal piscina devia ser destruída.
Havia, porém, um detalhe nessa história. O rei hicso vivia na capital Avaris, distante nada menos que 644 quilômetros da fonte de barulho. A demanda ultrajante – que, ao mesmo tempo, era um ataque direto aos egípcios – motivou uma série de conflitos, chefiados por Seqenenre Taa II.
Foi durante uma dessas tentativas de tirar os invasores a força que o faraó perdeu a vida. Sua múmia foi descoberta e estudada pela primeira vez ainda em 1886. O mau estado do corpo sugeria que o embalsamamento foi feito às pressas, sem seguir a risca os protocolos corriqueiros de mumificação.
Exames de raios-X, feitos em 1960, indicaram que Seqenenre Taa II teria morrido após receber golpes severos na cabeça. Uma das hipóteses, até então, é que ele havia sido capturado durante uma batalha e executado por alguma liderança do povo hicso. Outra dizia que ele poderia ter sido alvo de um golpe, armado pelos próprios egípcios.
Mas novas análises, concluídas recentemente por pesquisadores da Universidade do Cairo, sugerem que as últimas horas do faraó tiveram um desfecho bem mais brutal. Seqenenre teria sido morto no campo de batalha, após ser cercado e golpeado por inimigos com espadas, machados e lanças.
“As mãos deformadas sugerem que o faraó provavelmente foi preso amarrado”, dizem os cientistas que assinam as descobertas, publicadas num artigo da revista científica Frontiers in Medicine. A pesquisa se baseia em imagens 3D feitas por tomografia computadorizada e na análise de armas comumente usadas pelos hicsos no período.
As lâminas causaram cicatrizes profundas: um machado ou espada abriu um corte de 7 centímetros na testa, enquanto outros golpes perfuraram a região dos olhos e bochechas. Há evidências de que um dos ataques, feito com lança no topo do crânio, foi severo o suficiente para dilacerar o cérebro.
“Em uma execução convencional de um prisioneiro amarrado, apenas um agressor costuma atacar – possivelmente de ângulos diferentes, mas não com armas diferentes”, argumenta Sahar Saleem, radiologista que liderou o estudo, em um comunicado. “A morte de Seqenenre foi uma execução cerimonial”.
De acordo com os cientistas, há sinais de que, durante a preparação do corpo, tentou-se disfarçar as marcas que as armas inimigas deixaram no crânio do faraó. As novas imagens mostram que os restos mortais estavam embaralhados dentro da múmia: além de ossos estarem fora do lugar, a cabeça estava descolada do corpo. Havia, ainda, resquícios de cérebro ressecado no lado esquerdo do crânio, indicando problemas no manuseio do cadáver.
Apesar da morte trágica do líder – e de o estopim da guerra envolver um imbróglio com uma piscina – o início da rebelião contra os hicsos marca um ponto importante da história egípcia. Com a morte de Seqenenre Taa II, os conflitos contra os invasores ganham corpo durante o reinado de seu sucessor, Ahhotep I. O filho dele, Ahmose I, foi quem concluiu a expulsão dos hicsos e unificou novamente o Egito. Tem início, assim, o Novo Reinado, fase próspera entre os séculos 16 e 11 a.C que marcam o auge do império egípcio.