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Na falta de insetos, as flores estão evoluindo para se autofertilizar

Estudo mostra que o tamanho das flores e a quantidade de néctar na violeta dos campos diminuíram devido ao declínio no número de polinizadores.

Por Caio César Pereira
Atualizado em 8 jan 2024, 17h08 - Publicado em 5 jan 2024, 19h21

Você provavelmente já ouviu falar sobre como a extinção das abelhas ocasionaria o colapso de diversos ecossistemas. Como esses insetos são alguns dos principais responsáveis pelo polinização – que é o processo de reprodução sexuada das plantas angiospermas –, o sumiço levaria a um efeito dominó catastrófico. 

Isso não é ficção científica. O número desses insetos (e de outros polinizadores) já está diminuindo por causa, por exemplo, do uso indiscriminado de pesticidas em plantações.

E a notícia é que, com menos desses veículos de pólen voando por aí, a seleção natural entrou em ação: algumas plantas estão desenvolvendo adaptações para se reproduzem consigo mesmas, sem a necessidade de polinização.

Árvores não conseguem se aproximar para fazer sexo. Sabe como é: as pobrezinhas estão enraizadas. Então, elas têm o hábito de enviar o gameta masculino pelo correio, embutido no pólen. O correio, claro, são os animais. 

Flores vistosas e a substância açucarada conhecida como néctar atraem insetos, pássaros e até morcegos. O pólen gruda nesses bichinhos quando eles visitam as flores e se espalha por aí conforme eles passam de árvore em árvore para se alimentar. Isso permite que as plantas façam oba-oba e gerem sementes com variabilidade genética.

Na ausência de bichinhos, o jeito é se resolver no amor próprio. Toda angiosperma pode, em tese, fazer sexo com si mesma e gerar descendentes idênticos. É a autofecundação. Funciona assim: a flor é o órgão reprodutor e possui duas estruturas: o androceu (órgão genital masculino) e o gineceu (órgão reprodutor feminino).

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No androceu se encontram os estames, estrutura onde fica o pólen. No gineceu, temos o estigma, que recebe os grãos de pólen quando um polinizador pousa na flor para se alimentar do néctar. Na autofecundação, o vento faz o serviço de soprar o pólen de uma flor para dentro do estigma desta mesma flor. 

O problema aqui, é que como a planta só pode usar seus próprios genes para a produção das sementes, ela fica cada vez mais vulnerável a doenças e outras intempéries do ambiente conforme faz clones. A função do sexo é justamente gerar variabilidade para combater essas ameaças. 

Curioso a respeito de como essas mudanças aconteceram de forma tão rápida, Pierre-Olivier Cheptou, pesquisador e ecologista da Universidade de Montpellier, na França, liderou uma pesquisa que mostrou como as plantas têm evoluído para não depender de polinizadores para se reproduzir.

 

 

Publicado no periódico New Phytologist Foundation, o estudo de Cheptou e sua equipe focou em uma planta chamada violeta dos campos. Eles compararam sementes de exemplares coletados na França nos anos 90 com plantas atuais. Ao cultivar ambas as sementes, os pesquisadores descobriram algo que faria Darwin se orgulhar.

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As novas plantas tiveram um aumento na capacidade de autofecundação de até 27% em comparação com as plantas antigas. E não só isso. As plantas mais novas também apresentaram uma diminuição do tamanho de suas flores e na produção do néctar.

Para testar a hipótese de que essa diminuição no tamanho e néctar atraiu menos abelhas, os pesquisadores colocaram colmeias em cercadinhos com os dois tipos de violetas (novas e antigas). E não deu outra. As abelhas realmente preferiam as violetas mais antigas, que eram um pouco maiores e tinham mais néctar.

Vamos explicar o mecanismo por meio do qual a seleção natural atua, neste caso. Fabricar néctar e fazer flores grandonas é um dispêndio de energia. Se houvesse abelhas para atrair, esse dispêndio valeria a pena: as plantas mais chamativas e nutritivas acabariam espalhando mais pólen e se reproduziriam mais.

Os descendentes dessas plantas carregariam os genes dos pais. Portanto, também cresceriam para se tornar árvores com flores nutritivas e vistosas. Enquanto isso, plantas com flores menores não atrairiam tantos polinizadores, se reproduziriam menos e acabariam eliminadas da população.

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Em uma situação em que há poucos polinizadores, investir em flores e néctar não garante mais sucesso reprodutivo. Se as árvores com flores boas e as árvores com flores medíocres estão tendo um sucesso reprodutivo parecido, o placar de descendentes empata.

Isso gera um ciclo vicioso, em que as flores oferecem cada vez menos néctar, atraindo cada vez menos insetos, o que por sua vez deixa as flores ainda mais magrinhas… Enquanto isso, plantas boas em autofecundação se espalham.

E como nada é tão ruim que não possa piorar, o aquecimento global também mexe com crescimento das plantas. Como o calor acelerar o crescimento das flores, elas acabam murchando mais cedo, o que diminuí a janela de tempo em que os polinizadores conseguem o néctar.

Mas ainda há esperança. Uma pesquisa conduzida na Universidade de Michigan, nos EUA, mostrou que algumas plantas estão no caminho oposto, crescendo e investindo em cada vez mais mecanismos para atrair mais abelhas e outros polinizadores. Está dada a largada para a corrida pela melhor adaptação darwiniana ao século 21. 

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