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O último mundo: Plutão

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h50 - Publicado em 27 jul 2009, 22h00

O mais distante, menor, mais escuro, mais frio e possivelmente o mais estranho dos planetas, Plutão é membro único de sua categoria entre os planetas. Não é constituído basicamente por rochas, como Mercúrio, Vênus, Terra e Marte, mas também não é uma esfera gigante de gás, como Júpiter, Saturno, Urano e Netuno. Muitos cientistas pensam que ele pertence a uma classe de pequenos corpos celestes, inteiramente feitos de diversas substâncias geladas. Habitantes da fronteira do sistema solar, eles ganharam recentemente o nome coletivo de anões de gelo, dos quais Plutão seria o maior e mais conhecido. Por sua distância e por sua órbita extravagante – que o faz cruzar com Netuno no espaço -, Plutão não tem atmosfera permanente, como os outros planetas. O ar plutoniano, composto de metano e nitrogênio, só é um gás enquanto o planeta está próximo do Sol, como acontece agora, pela primeira vez, desde que esse mundo foi descoberto, em 1930. Mas, como o fim do século marca o início do inverno, o frio logo fará com que a atmosfera comece a cair para a superfície como exótica nevasca. Os astrônomos baseiam essa bizarra previsão no fato de que Plutão dá uma volta ao Sol a cada 248 anos, e começa a se afastar do centro do sistema solar.

Desse ponto de vista, o planeta se comporta um pouco como os cometas, que também são periodicamente descongelados pelo calor do Sol (é a matéria gasosa assim criada que dá forma às suas caudas). Nenhum outro corpo celeste – com exceção de certas luas, como Tritão, satélite de Netuno – exibe fenômeno tão radical. Alguns cientistas afirmam que apenas isso justificaria uma viagem a Plutão, embora haja pouca chance de os governos liberarem verba para tal empreendimento. Um dos que se esforçaram para realizá-lo foi Robert Staehle, 37 anos, do Laboratório de Jatopropulsão, de Pasadena, Califórnia, associado à agência espacial americana, NASA.

Plutão era (e ainda é) o único planeta virgem do sistema solar: nunca recebeu a visita de uma nave espacial. “Isso me aborrecia”, diz Staehle, sonhando com uma sonda rápida, pequena e barata, capaz de viabilizar a viagem. Teve o cuidado, assim, de consultar o próprio descobridor do planeta, o astrônomo americano Clyde Tombaugh, então aos 87 anos. Formalmente, pediu ao velho mestre permissão para visitar “seu” planeta. Em seu escritório na Universidade Estado do Novo México, Tombaugh respondeu bem-humorado: “Dou boas-vindas à idéia, mas lembro que será uma viagem longa e fria”.

Foi um sinal verde importante, pois Tombaugh, desde 1930,tornara-se uma lenda viva. Ele não havia simplesmente tropeçado em Plutão. Havia empreendido uma verdadeira caçada, usando como guia frias fórmulas matemáticas, deduzidas a partir do tortuoso curso de Urano. Esse planeta desobedecia às leis da gravitação, aparentemente porque um outro planeta, ainda não avistado, o arrastava para fora da órbita normal. E não seria tarefa fácil encontrar o responsável pelo desvio – que se resumia a poucos milhares de quilômetros, quase nada comparado às imensas distâncias em questão.

 

 

A mais pálida estrela brilha 4 000 vezes mais

Descoberto acidentalmente pelo inglês William Herschel, em 1781, Urano estava duas vezes mais longe que o mais distante planeta conhecido então, Saturno. Este situa-se, em média, a cerca de 1,4 bilhão de quilômetros do Sol e Urano, a quase 2,8 bilhões de quilômetros. No furor que se seguiu à descoberta de Herschel, os astrônomos rastrearam e, em 1845, acabaram achando outro mundo desconhecido, Netuno. Mesmo isso, porém, não explicou por completo a órbita uraniana, e a caçada recomeçou. Para citar apenas um caso ilustre, o americano Percival Lowell empe-nhou-se nela sem trégua, mas em vão, até a morte, em 1916.

Finalmente, quatorze anos mais tarde, Tombaugh daria conta do recado. Era, então, um jovem de 24 anos, e trabalhava no Observatório Lowell, no Arizona. Encontrou o esquivo planeta com obstinada persistência, procurando o mundo perdido onde as fórmulas indicavam que estaria – e até onde nada se esperava achar. Além disso, saber onde olhar não bastava. Era preciso poder ver o débil ponto de luz que seria Plutão, deslizando a passo de lesma – devido à sua grande distância – contra o fundo imóvel das estrelas. Para isso, o astrônomo contou com um dispositivo alemão, com o qual pôde sobrepor fotos tiradas em noites diversas. Isso denunciou o movimento do corpo remoto.

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Tombaugh gastou quase um ano em tediosas comparações de imagens, pois Plutão tem um brilho 4 000 vezes menor que o da mais pálida estrela visível a olho nu. Mas o achado compensou o esforço pelas extravagâncias que revelaria. A começar pela órbita, que em outros planetas tem a forma de uma elipse, mas bem-comportada, praticamente circular. A elipse plutoniana, em vez disso, estica-se exageradamente além da órbita de Netuno, num de seus extremos, enquanto no outro encurta-se a ponto de cortar a trajetória daquele planeta (veja o mapa). A distância de Plutão ao Sol, dessa forma, varia muito mais que o normal, entre um mínimo de 4,5 bilhões de quilômetros e um máximo de 7,4 bilhões de quilômetros.

Como se isso não bastasse, sua trajetória também é inclinada, passando, às vezes, bem ao norte (“acima”) do resto dos planetas, e às vezes, bem ao sul, num ângulo de 17 graus. É como se algum cataclismo, no passado, o tivesse arrancado do eixo natural. O próprio eixo de rotação do planeta é inclinado em nada menos que 58 graus – ou duas vezes e meia a inclinação da Terra, que é de 23 graus. Nos quarenta anos seguintes, usaram-se os maiores telescópios do mundo para tentar discernir traços na superfície daquele minúsculo objeto, menor até que a Lua. Mas nada se via, além da cor, entre verde e rosa, e vagos pontos escuros. Estes últimos ajudaram a medir a rotação do planeta, de 6,3 dias (terrestres). Apenas nos anos 70, sensíveis detectores de infravermelho confirmaram a suspeita de que havia metano na superfície.

 

 

O maior dos satélites, em termos comparativos

Descoberta ainda mais excitante, feita em 1978, por James Christy, trabalhando no Observatório Naval Americano, em Washington, foi a de que Plutão tinha um satélite, mais tarde batizado de Caronte. De acordo com a mitologia grega, esse era o nome do barqueiro que levava as almas ao Hades, o inferno, governado pelo deus Plutão. Nenhuma outra lua é tão grande comparada ao planeta a que pertence, pois Caronte tem um diâmetro de 1184 quilômetros, mais da metade do de Plutão, com 2 336 quilômetros. A Lua é o segundo maior satélite em termos comparativos, com um diâmetro quatro vezes menor que o da Terra.

“Não há outro par como Caronte e Plutão”, diz Alan Stern, planetologista do Instituto de Pesquisas do Sudoeste, em San Antonio, Califórnia. “Eles têm dimensões tão semelhantes que, na verdade, constituem um planeta duplo.” Os dois corpos também giram quase colados – algo como 20 000 quilômetros, enquanto a Lua gira a 380 000 quilômetros da Terra. Isso significa que em alguns momentos um faz eclipse sobre o outro em seqüência, fornecendo dicas importantes sobre sua natureza. Tais eclipses ocorrem apenas uma vez a cada 124 anos, e Stern nota que, por sorte, a última vez que isso aconteceu foi durante a guerra civil americana, na década de 1860.

Assim, 124 anos depois, já em época atual, teve início uma nova sessão de eclipses, estendendo-se de 1985 a 1990. Fotografados e examinados, os eclipses levaram à descoberta, por exemplo, de que Caronte é coberto primariamente de gelo de água, a uma temperatura de -182°C. Já os componentes básicos de Plutão incluem gelos de metano, nitrogênio e monóxido de carbono. Note-se que tais gelos são bem menos firmes que o de água, e ao contrário deste não formam estruturas como escarpas e penhascos. O que se sabe sobre a aparência do planeta e sua lua foi recentemente resumido num mapa esboçado por Richard Binzel e Eliot Young, do Instituto de Tecnologia de Massachusetts.

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Brilho ofuscante do pólo sugere estações do ano

“Nosso mapa mostra que o pólo sul de Plutão tem um brilho ofuscante”, diz Binzel, que daí tira conclusões fascinantes. Para ele, o brilho indica algum tipo de geada, e geada recente, caso contrário estaria coberta de poeira. Portanto, deve haver mudanças climáticas ao longo do ano plutoniano, mais ou menos como as estações do ano, na Terra. Se for assim, a temperatura sobe quando o planeta está mais perto do Sol, o que ocorreu, pela última vez, em 1989. Então, o gelo da superfície evapora, formando a atmosfera que agora se vê. Depois, quando a distância ao Sol aumenta, uma parte ou toda a atmosfera congela-se e cai sobre a superfície.

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Binzel, porém, alerta para um fato notável. “Se os plutonianos existem, só vêem neve uma vez a cada 248 anos terrestres, que correspondem a um ano de Plutão.” A estranha atmosfera temporária consiste em um fino cobertor de ar, cujo peso é 100 000 vezes menor que o da Terra, mas pode estender-se pelo espaço até Caronte, envolvendo-o.

Novos assaltos aos mistérios de Plutão continuam a ser feitos com instrumentos sempre mais precisos. Mas embora a quantidade de informações deva crescer, nos próximos anos, só uma sonda espacial poderá responder a perguntas mais dramáticas. Uma delas diz respeito aos vulcões, como os divisados no satélite netuniano Tritão pela sonda americana Voyager, em 1989 (SUPE-RINTERESSANTE ano 8, n? 3). Imagina-se que em Plutão possa haver erupções de neve derretida de nitrogênio ou metano. Outra dúvida é se a superfície do planeta é inteiramente plana, ou exibe algum tipo de formação, como rachaduras, elevações e assim por diante. É possível mesmo que existam outras luas à sua volta, escuras e pequenas: como se viu nas últimas décadas, todos os planetas distantes têm mais luas do que se podiam ver antes dos voos espaciais.

O mesmo se pode dizer a respeito dos anéis, que apenas as sondas puderam revelar em Júpiter, Urano e Netuno. Nada impede que eles existam também em Plutão. Em resumo, não se pode prever o que um possível vôo a Plutão revelaria, diz Richard Terrile, um dos cientistas empenhados em concretizar tal missão. “Minha experiência me diz que apenas uma coisa é certa: ficaremos surpresos com o que vamos encontrar. Os planos já esboçados prevêem o lançamento de duas espaçonaves, que chegariam ao destino um ano depois da outra. Assim se resgistrariam os fenômenos em dois momentos, obtendo compreensão muito mais acurada sobre sua natureza. As duas naves devem passar bem perto de Plutão e Caronte, o bastante para ver detalhes de até 800 metros de diâmetro. Elas não terão mais que 1,5 metro cada, e seus geradores (alimentados por desintegração radioativa de plutônio) não terão potência maior que a de uma lâmpada comum de 60 watts. As naves têm de ser pequenas para não gastar muito combustível, ou não aumentar muito o tempo de vôo. Basta notar que sua duração prevista é de seis a oito anos, mesmo no caso de pequenas naves. Se fossem um pouco mais sofisticadas – capazes de orbitar Plutão, por exemplo, em vez de passar por ele num rápido rasante – teriam uma jornada de pelo menos dezoito anos. E elas têm de alcançar Plutão logo, insistem os cientistas, se é que se pretende chegar lá antes que o ar vire gelo.

Os instrumentos só vão começar a funcionar dezoito meses antes de chegar ao alvo, e uma vez lá terão poucas horas nas vizinhança de Caronte e Plutão para executar a parte mais promissora do trabalho. Em razão da grande distância envolvida, do pequeno tamanho das antenas e da pouca energia disponível, as mensagens para casa não poderão superar uma fotografia por dia. Feito isso, as visitantes prosseguirão rumo às estrelas. Embora curta, a visita vai alcançar a meta, aposta Terrile. “A NASA tem a chance de ir novamente até a fronteira. Agora mesmo essa fronteira está a 6,5 bilhões de quilômetros”. E a muitos milhões de dólares além, se poderia acrescentar. Mas Terrile não se deixa abater por isso. “É para lá que estamos indo”.

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