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Primeiras análises de DNA de vítimas de Pompeia revelam identidades surpreendentes

Erros sobre o sexo, os relacionamentos e a origem dos cadáveres mostram o quanto os conhecimentos sobre a cidade estão contaminados por valores e expectativas dos arqueólogos.

Por Bela Lobato
10 nov 2024, 12h00

Um momento dramático que ficou para sempre congelado no tempo: uma família de quatro pessoas se abrigava debaixo de uma escada enquanto uma chuva de cinzas e pedregulhos vulcânicos incandescentes caía sobre a cidade de Pompeia. Ou pelo menos é essa a história que foi contada nas últimas décadas.

Quase dois mil anos depois, o primeiro estudo do DNA dessas vítimas revela que a interpretação de algumas cenas famosas de Pompeia está longe da realidade.

Nessa “família”, por exemplo, foi possível analisar o DNA completo de três dos quatro integrantes, já que o material genético da quarta pessoa foi insuficiente. Os três eram do sexo masculino, inclusive a suposta mãe. E eles não têm laços de parentesco.

É a primeira vez que pesquisadores conseguem recuperar o DNA antigo de vítimas de Pompeia.

Vamos recapitular: em 79 d.C., a cidade na Itália, foi atingida por um terremoto e pela erupção violenta do vulcão Vesúvio. Os dois fenômenos provocaram chuvas de rochas e inundaram a cidade com cinzas vulcânicas. Além de matar instantaneamente cerca de 20% dos 13 mil habitantes, esse material todo formou uma crosta ao redor das pessoas.

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Por dentro da superfície, os corpos se decompuseram, e as estruturas ficaram parcialmente ocas. Em 1863, o arqueólogo Giuseppe Fiorelli desenvolveu uma tecnologia para preencher essas cascas com gesso, como se elas fossem moldes. 

Além de permitir observar detalhes da anatomia e do posicionamento das pessoas, esses moldes de gesso também encapsularam alguns restos mortais mais resistentes, como ossos. Foram esses ossos que foram recuperados de dentro de moldes antigos e permitiram a análise do DNA antigo.

Na pesquisa, publicada no último dia 7 na revista Current Biology, os pesquisadores divulgaram análises sobre o sexo, a ascendência e os laços familiares de cinco indivíduos.

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Os resultados revelam que algumas das histórias contadas durante décadas sobre essas pessoas não estão corretas ou não são tão simples quanto se acreditava. Isso porque elas levavam em conta principalmente a aparência externa, e uma interpretação livre do contexto. 

Outro exemplo: há uma cena de uma pessoa adulta com uma criança no colo. Por causa do bracelete do adulto, um item que marcaria a feminilidade, a interpretação mais comum é a de que seria uma mulher segurando um filho ou filha. O DNA revelou que o adulto de bracelete era do sexo masculino e não tinha relação de parentesco com a criança.

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Em outro achado, duas pessoas foram encontradas deitadas em uma posição que era interpretada como um abraço. As duas foram julgadas como mulheres, e seriam, então, mãe e filha, irmãs ou amantes. Mas a análise genética revelou que uma das pessoas era do sexo masculino – excluindo pelo menos duas das interpretações comuns. 

Foto de moldes de gesso de pessoas que morreram em Pompéia.
Duas pessoas que eram consideradas irmãs, mãe e filha ou amantes. Até que se descobriu que uma delas era do sexo masculino. (Parque Arqueológico de Pompéia/Reprodução)

O estudo também apontou a diversidade étnica dos habitantes de Pompeia, com fortes traços genéticos de imigrantes do leste do Mediterrâneo e do norte da África. Para os pesquisadores, isso reforça a mobilidade geográfica e a natureza multicultural do Império Romano no começo da Era Comum.

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Para os autores, o estudo ilustra como as narrativas baseadas em evidências limitadas refletem a visão de mundo dos pesquisadores, e não são necessariamente confiáveis. Eles consideram também que, no passado, a necessidade de criar histórias sobre as pessoas pode ter levado à manipulação de poses e posicionamentos para corroborar uma versão.

“Essas descobertas desafiam interpretações de longa data, como a associação de joias à feminilidade ou a interpretação da proximidade física como um indicador de relações biológicas.”, escreveram os pesquisadores. “Em vez de estabelecer novas narrativas que também podem deturpar as experiências vividas por essas pessoas, esses resultados incentivam a reflexão sobre as concepções e a construção de gênero e família em sociedades passadas, bem como no discurso acadêmico.”

“As descobertas demonstram a importância da integração da análise genética com informações arqueológicas e históricas para enriquecer ou corrigir narrativas construídas com base em evidências limitadas”, disse Alissa Mittnik, coautora do estudo, em comunicado

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