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Deriva Continental

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Um blog para terráqueos e terráqueas interessados no que aconteceu nos 4,5 bilhões de anos em que não estiveram por aqui. Feito pela Sociedade Brasileira de Geologia (SBG) em parceria com a Super.
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Nos Bastidores da Terra: Geóloga Explica a Formação do Petróleo

Uma série de fatores e eventos devem ocorrer para a formação, armazenamento e extração do ouro negro.

Por Olívia Maria Cordeiro de Oliveira (Universidade Federal da Bahia)
Atualizado em 11 ago 2023, 17h03 - Publicado em 11 ago 2023, 17h02

Este é o 30º texto do blog Deriva Continental 

O petróleo é fascinante por diversos motivos: a complexidade de sua formação, capacidade de ser armazenado na crosta terrestre, seu caráter energético, e potencial impacto ambiental. Sua cadeia é representada pela exploração, produção, transporte, refino e distribuição.

Nos países em desenvolvimento, o acesso a esse tipo de energia pode promover facilidades e melhor qualidade de vida. Além de ser uma fonte de combustível para o transporte, o petróleo também está presente em diversos produtos químicos, medicamentos e até itens de papelaria. Além disso, as reservas de petróleo são atrativas para investimentos dos países mais ricos.

Disposição irregular pelo planeta

O petróleo começa com a formação das bacias sedimentares, cujo requisito básico é a disponibilidade de área para a acumulação de sedimentos (material desagregado e transportado por rios, geleiras, vento e mar). A Terra possui sete grandes placas tectônicas e algumas microplacas. Seu movimento ao longo da história geológica é responsável pela formação das principais bacias sedimentares (espaços que abrigam sedimentos) em todo o mundo. Elas ocorrem tanto em terra quanto nos oceanos.

Representação das principais placas tectônicas e suas áreas abrangentes ao redor do mundo.
Representação das principais placas tectônicas e suas áreas abrangentes ao redor do mundo. (USGS/Wikimedia Commons)

As rochas sedimentares são formadas após o intemperismo e erosão de rochas pré-existentes, quando diferentes tamanhos de grãos (sedimentos) são transportados, depositados, compactados – e, posteriormente, solidificados. Essas rochas são compostas por sedimentos de matéria orgânica ou inorgânica (fragmentos de minerais, por exemplo). As rochas de granulação fina (folhelhos, argilitos, margas etc.) são depositadas em ambientes de baixa energia e apresentam uma maior quantidade de matéria orgânica. Já as rochas sedimentares formadas em ambientes de alta energia possuem uma quantidade reduzida de matéria orgânica.

Infográfico mostrando intemperismo, erosão, transporte e deposição de sedimentos.
Desenho esquemático mostrando intemperismo, erosão, transporte e deposição de sedimentos para formação de rochas sedimentares. (Pesquisamaneira/Blogspot/Reprodução)

A possibilidade da formação de diferentes tipos de rochas sedimentares nos leva à compreensão do modelo de sistema petrolífero, que pode ser entendido como um conceito unificador que envolve elementos e processos com funcionamento simultâneo. Esses elementos incluem rochas geradoras do petróleo (maturas), rochas-reservatório (onde o óleo irá se acumular), rochas selantes (rochas que irão impedir que o petróleo migre, permitindo que se acumule em algum local) e trapas (estruturas geológicas que hospedam/configuram a acumulação do petróleo). Os processos são representados pela migração do óleo e/ou gás e pelo sincronismo dos eventos geológicos que vão permitir a sua geração e posterior acumulação.

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Infográfico dos diferentes sistema petrolífero.
Exemplos sistema petrolífero com diferentes tipos de trapa – (a) trapa estrutural em anticlinal, (b) trapa associada à falha e (c) trapa estratigráfica associada à discordância. (TEIXEIRA et al. (2000)./Reprodução)

As rochas geradoras são aquelas de granulação fina, contendo matéria orgânica e capazes de gerar hidrocarbonetos líquidos ou gasosos, desde que atendam aos seguintes critérios:

  • Devem conter uma quantidade mínima de matéria orgânica, estabelecida de acordo com a classe de rocha;
  • A qualidade da matéria orgânica presente na rocha deve ser adequada para a geração de hidrocarbonetos;
  • A matéria orgânica deve ter passado por um processo de soterramento necessário para atingir uma paleo temperatura mínima (maturação), suficiente para sua transformação em petróleo ou gás.

Após a geração do petróleo, ele migra para as rochas reservatório, que possuem porosidade e permeabilidade suficientes para armazenar e permitir a circulação de hidrocarbonetos – como os arenitos, calcarenitos, folhelhos e carbonatos fraturados. 

O petróleo apenas se mantém nessas rochas-reservatório caso seja impedido de migrar pelas rochas selantes, impermeáveis, e aliadas às estruturas geológicas (dobras, falhas, diápiros), estratigráficas (variações litológicas) ou hidrodinâmicas (fluxo descendente de água), intituladas de trapas (ou armadilhas).

A migração é o processo pelo qual os hidrocarbonetos produzidos nas rochas geradoras se movem em direção às rochas reservatório, onde podem ser acumulados nas armadilhas geológicas. Durante a migração, os hidrocarbonetos podem percorrer grandes distâncias, sendo influenciados por fatores como a permeabilidade das rochas e a pressão dos fluidos. 

Já o sincronismo é o fenômeno que faz com que as rochas geradoras, reservatórios, selantes, trapas e migração se originem e se desenvolvam em uma escala de tempo e espaço compatível, permitindo a formação de um sistema petrolífero. Ou seja, é a sincronia entre os diferentes elementos e processos que permite a formação e acumulação de hidrocarbonetos em uma determinada região. A falta de quaisquer uma dessas condições ao longo do processo geológico impede a formação de acumulações de petróleo. 

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Como encontrar petróleo

O explorador de petróleo deve ter o treinamento acadêmico especializado nas geociências e o desenvolvimento da criatividade por meio do pensamento visual. As ferramentas tecnológicas também ajudam as equipes dedicadas a todo o processo exploratório.

Seja uma busca para produção em terra (onshore) ou no mar (offshore), é necessária uma interpretação exploratória com base em trabalhos de campo e estudos geofísicos. A existência do “ouro negro” naquele ambiente, portanto, poderá ser confirmada com a perfuração de poço(s), somada às informações obtidas com a perfilagem geofísica, com os dados coletados diretamente das rochas perfuradas e amostradas, bem como dos fluidos ali inerentes. Para a definição de uma acumulação petrolífera, esses elementos devem ser agora caracterizados.

Produção de petróleo onshore.
(Lorenrudenko/Freepik)
Produção de petróleo offhore.
(Preechab/Freepik)

Caracterização da cadeia de petróleo

A cadeia do petróleo é composta por atividades que podemos agrupar em três segmentos principais: upstream, midstream e downstream. Vamos explicar: o segmento upstream inclui exploração e produção de petróleo e gás; o segmento midstream é caracterizado pelo transporte e refino; e o segmento downstream inclui o armazenamento e a distribuição de petróleo bruto e produtos refinados. 

Imagem do primeiro poço comercial de Petróleo no Brasil.
(Arquivo Petrobras/Reprodução)

As operações upstream envolvem a exploração e produção (E&P) de petróleo, cujo foco se inicia na descoberta desse recurso no subsolo da Terra. A atividade de exploração é caracterizada pela pesquisa efetuada por companhias em uma determinada região, muitas vezes auxiliada por estudos científicos vinculados a instituições de ensino superior. Levantamentos geológicos e geofísicos são fundamentais nessa fase. 

A etapa de produção (primária, secundária ou terciária), também chamada de explotação, é representada pela extração do óleo ou gás – seja em bacias terrestres (onshore) ou em bacias marinhas (offshore) – e envolve o uso de tecnologia cada vez mais avançada, com equipamentos especializados e profissionais altamente qualificados, auxiliados por modelos científicos cada vez mais sofisticados. A etapa de perfuração de poços (verticais ou direcionais) é necessária para o processo exploratório (seja para a descoberta ou delimitação das jazidas) e fundamental para a etapa de explotação (para o estabelecimento da malha de produção). 

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A etapa de midstream inclui o transporte e o devido armazenamento, antes de se iniciar a etapa de refino. Essa fase envolve a retirada do petróleo do subsolo terrestre e o conecta aos usuários finais, requerendo infraestrutura especial capaz de transportar com segurança os recursos extraídos, muitas vezes por longas distâncias (aumentando o risco de acidentes e impactos ambientais), até o ponto onde a matéria-prima será refinada e transformada em produto (gasolina, diesel, combustível de avião, produtos petroquímicos etc.). Como o petróleo possui características intrínsecas, as refinarias também são construídas de forma diferenciada, com capacidades para receber diferentes tipos de matéria prima. 

As etapas que caracterizam a fase downstream englobam o armazenamento e a distribuição de petróleo. Após o refinamento e processamento dos produtos finais, estes são acondicionados de acordo com suas características e entregues aos consumidores. Isso pode envolver o transporte do petróleo para postos de combustíveis ou o engarrafamento de gás butano para utilização doméstica ou industrial. As empresas que fornecem serviços de transporte e armazenamento de produtos de petróleo e gás são reconhecidas como operadoras intermediárias. 

O papel da Petrobras

A Petrobras, ao longo de mais de 80 anos desde a descoberta do Campo de Candeias, na Bahia,desempenhou um papel fundamental nas descobertas de petróleo no Brasil por meio da exploração e produção em várias bacias sedimentares do país – tanto em áreas terrestres, quanto em áreas marítimas.

Mapa das principais bacias sedimentares/petrolíferas (onshore e offshore) brasileiras.
(Celso Luchesi (1998)/Reprodução)
Infográfico sobre a exploração, transporte e armazenamento do petróleo.
(Olívia Maria Cordeiro de Oliveira/Reprodução)

Uma das descobertas mais significativas foi a do pré-sal, uma sequência de rochas sedimentares composta principalmente por carbonatos e folhelhos gerados em lagos (lacustres), localizada abaixo de uma extensa camada de sal na margem continental do sudeste brasileiro.

Modelo esquemático de perfuração offshore para produção de petróleo no pré-sal.
(Cola da Web/Reprodução)

A participação de outras empresas na exploração e produção de petróleo no Brasil, em decorrência da quebra do monopólio, ocorrida em 1997 com a promulgação da Lei do Petróleo e da criação da Agência Nacional do Petróleo e Biocombustíveis (ANP) como agência reguladora, tem trazido benefícios significativos para a pesquisa e a pós-graduação, especialmente nas universidades brasileiras. Esses investimentos têm impulsionado a pesquisa científica e tecnológica nas instituições de ensino e pesquisa brasileiras, fortalecendo a formação de pessoal qualificado e contribuindo para o desenvolvimento de um sólido parque tecnológico.

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Apesar do reconhecimento da importância da exploração e produção de petróleo, especialmente no contexto brasileiro, com suas extensas reservas comprovadas, é crucial compreender a necessidade de desenvolvimento de energias limpas e sua utilização simultânea. 

A transição para fontes de energia renovável e sustentável é essencial para enfrentar os desafios ambientais e climáticos globais. Nesse sentido, as metas estabelecidas pelas Organizações das Nações Unidas (ONU) através dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) desempenham um papel fundamental, promovendo ações voltadas para a produção e consumo sustentáveis, o combate às mudanças climáticas e a promoção de energias renováveis. Portanto, é fundamental que o Brasil e outros países invistam em políticas, pesquisa, tecnologia e inovação que impulsionem a transição energética e contribuam para um futuro mais limpo e sustentável.

Geoquímica forense para monitorar acidentes

Determinar a proveniência do petróleo derramado no ecossistema é uma tarefa desafiadora para os cientistas especializados em geoquímica de hidrocarbonetos. Tais investigações, no entanto, têm avançado consideravelmente nos últimos anos, envolvendo técnicas analíticas em diferentes materiais e amostras (rocha, sedimento, fauna, flora, petróleo cru).

Entre as técnicas mais usadas encontra-se a cromatografia em fase gasosa, na identificação do perfil (ou fingerprint) de n-alcanos e isoprenóides (compostos orgânicos) de amostras de petróleo e derivados. Essa análise fornece uma “impressão digital” geoquímica característica para cada tipo de petróleo e derivados produzidos nas mais distintas regiões da Terra.

Quando um derramamento de petróleo ocorre no mar, o óleo está sujeito a diferentes processos de alteração, os quais podem ocorrer simultaneamente, mas a diferentes velocidades. A velocidade e a extensão desses processos dependem das propriedades físicas e químicas do óleo original e de condições ambientais, como temperatura, velocidade e direção dos ventos e das correntes marinhas.

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A geoquímica forense do petróleo foi aplicada para identificar o tipo e a origem de material oleoso coletado em praias do Nordeste do Brasil em 2019. Esse trágico acidente alcançou uma faixa litorânea de 4.334 km em 11 estados do Nordeste e Sudeste, 120 municípios e 724 localidades até 22 de novembro de 2019, contaminando essa região em diferentes graus.

Esse desastre tem sido considerado o maior derramamento de óleo bruto da história do país e um dos mais extensos registrados no mundo. As análises revelaram que o material oleoso apresentava características geoquímicas compatíveis com petróleo venezuelano, indicando que estava altamente intemperizado ou era um produto feito com óleo pesado. Tais estudos foram realizados pelo Centro de Excelência em Geoquímica: Petróleo, Energia e Meio Ambiente (LEPETRO) do Instituto de Geociências (IGEO) da Universidade Federal da Bahia (UFBA). 

O estudo auxiliou a Polícia Federal Brasileira a apontar a responsabilidade ambiental do desastre por empresa/navio que adquiriu o petróleo na Venezuela e o estava transportando-o para comercialização em outros países, quando o acidente aconteceu. Os impactos à natureza foram significativos, causando danos ao ecossistema estuarino (em especial aos manguezais) incluindo a fauna e flora locais. As implicações sociais, econômicas, produtivas e de consumo de alimentos das famílias marisqueiras expostas ao acidente também foram severas, causando consequências na segurança alimentar, hídrica e nutricional.

A Rede cooperativa de desenvolvimento de protocolos para avaliação de zonas costeiras impactadas por derramamento de óleo e aplicação de biotecnologias para remediação (REBICOP), apoiada pelo CNPq em colaboração com a Marinha do Brasil, está focada no desenvolvimento de biotecnologias para a degradação de óleo em matrizes ambientais. Pesquisadores do Grupo de Pesquisa “Petróleo e Desenvolvimento Sustentável – PETRODES”, onde se insere a REBICOP, estão explorando novos protocolos para a produção de bioprodutos eficazes na recuperação de áreas afetadas por derramamentos de petróleo. 

Transição para uma matriz energética sustentável

Agenda 2030 e seus Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) instituídos pela Organização das Nações Unidas (ONU) são fundamentais para orientar a comunidade, a nível internacional, em direção a um futuro mais sustentável. A diversificação da matriz energética, investindo em fontes renováveis e reduzindo o consumo de energia fóssil, é crucial para enfrentar os impactos ambientais causados pela matriz fóssil. A transição energética envolve a mudança estrutural de um sistema energético baseado em combustíveis fósseis para fontes de energia renováveis de baixo carbono.

Além da geração de energia, essa transição abrange aspectos como consumo, eficiência energética e gestão de resíduos, visando a sustentabilidade ambiental e social. É um processo gradativo que requer a mudança de paradigmas, o incentivo de políticas públicas, a maximização da eficiência dos recursos e o acesso ampliado à energia. A transformação energética é essencial para garantir um futuro sustentável e enfrentar os desafios ambientais atuais.

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