O que são os teoremas da incompletude de Gödel?
Eles são fonte de uma imensa angústia existencial: provam que algumas coisas, na matemática, nunca poderão ser provadas.
Existe um fantasma na matemática chamado Conjectura de Goldbach. Foi batizada em referência a seu autor, Christian Goldbach, um matemático alemão do século 18. Goldbach propôs que todo número par maior que 2 é a soma de de dois números primos. Bem simples, qualquer leigo, até este Oráculo, consegue entender. E embora essa propriedade já tenha sido verificada no braço em todos os números pares até 4 sextilhões – isto é, 4 seguido de 18 zeros –, ainda não há uma prova elegante de que ela valha para todos eles. Quando uma conjectura é provada, ela recebe uma promoção e se torna um teorema.
Alguns teoremas, como o de Fermat, levaram 350 anos para serem provados. Outros, como o de Pitágoras, têm mais de 350 provas. Por muito tempo, acreditou-se que toda conjectura verdadeira teria no mínimo uma prova e poderia ser promovida a teorema eventualmente. Isso ajudaria a provar que a matemática como um todo é uma estrutura consistente, que não dá origem a contradições.
O que os teoremas da incompletude de Gödel dizem – e perceba: se eles são teoremas, é porque estão provados, o que dá um toque assustador à coisa toda – é que podem existir conjecturas que são sim verdadeiras, mas que não podem ser provadas. Quais são essas provas impossíveis? Essa é a parte mais cruel: ninguém sabe. Talvez, centenas de matemáticos estejam se dedicando em vão a provar conjecturas que não têm prova. Talvez a de Goldbach seja uma delas. Como saber?
Ironicamente, o austríaco Kurt Gödel chegou a seus teoremas quando estava resolvendo uma espécie de lista de supermercado escrita por seu colega David Hilbert na virada para o século 20: uma coleção de 23 desafios que a matemática precisaria encarar nos próximos cem anos. O item três da lista era “provar que a matemática é consistente”, e Gödel provou que não era, para agonia geral.
No canal do YouTube Numberphile, o matemático Marcus du Sautoy, professor de Oxford, explica o raciocínio de Gödel da seguinte maneira. Na matemática, existem axiomas, que são um nome bonito para obviedades. Por exemplo: 2 + 4 = 4 + 2. Ou seja, A + B = B + A. A ordem das parcelas não altera a soma. Axiomas são como as regras do xadrez. Não precisam de prova. A matemática aceita os axiomas como verdades de antemão, e se constrói em cima deles.
Até o comecinho do século 20, acreditava-se que, caso houvesse na matemática algo verdadeiro que não pudesse ser provado, bastaria promover este algo ao cargo de axioma – inserir uma nova regra no xadrez dos números – e tudo ficaria bem. Ou seja: os matemáticos só precisavam provar que há um conjunto de axiomas do qual é possível deduzir todas a matemática. Absolutamente toda. Talvez nós ainda não tenhamos descoberto todos esses axiomas, mas eles estão lá.
Para provar o contrário, Gödel usou uma versão bem mais sofisticada de um paradoxo antigo e bastante simples de entender. Imagine que você tem uma plaquinha e ela diz “A frase que está escrita do outro lado é verdade.” Aí você vira a plaquinha e do outro lado está escrito “A frase que está escrita do outro lado é mentira.” E aí? Qual das duas é a correta?
Por décadas, muitos matemáticos entraram em negação – consideraram que Gödel era só um espertinho, mas que esses loopholes lógicos não eram uma ameaça verdadeira. Só em 1977 chegou a comprovação cabal de que os teoremas eram um problema na prática, e não só o exercício de um gênio.
Pergunta de @rubens.ibenevides, via Instagram.