Eduardo Szklarz
Erro – Divulgar e vender a substância como remédio capaz de curar qualquer mal.
Quem – Laboratórios, químicos, médicos e farmacêuticos da Europa e dos EUA.
Quando – Entre as décadas de 1880 e 1920.
Consequências – Um número incalculável de viciados em uma droga letal.
O neurologista austríaco Sigmund Freud, no início da carreira, receitava cocaína para pacientes e amigos. E não era o único. Na década de 1880, muitos doutores recomendavam-na como uma panaceia. “Ela era usada para curar males como indigestão, flatulência, cólica, histeria, dor nas costas e dores musculares”, diz o médico americano Howard Markel, autor do livro An Anatomy of an Adiction (Anatomia de um Vício, inédito no Brasil).
Durante as 3 ou 4 décadas seguintes, pôde-se comprar cocaína em farmácias dos EUA e da Europa sem receita médica. Até que, ainda no início do século 20, os governos perceberam o estrago que o “remédio” tinha causado na população. Tacharam-no de “droga” e proibiram sua venda. Pouco a pouco, a proibição foi dando origem a um mercado clandestino, que se sofisticou e hoje é dominado por narcotraficantes e pelo crime organizado (leia mais nas reportagens das pág. 21 e 58).
A cocaína despertou a atenção do Ocidente no século 16, durante a conquista do Peru pelo espanhol Francisco Pizarro. O explorador ficou intrigado ao ver que seus soldados mal aguentavam marchar pela selva, enquanto os índios corriam alegremente. Além de acostumados com a altitude, eles passavam o dia todo mascando a folha do arbusto Erythroxylum coca, que ajudava a manter todo mundo bem disposto. Os espanhóis decidiram que a planta era coisa do demônio, o que atiçou ainda mais a curiosidade dos aventureiros.
Euforia nos Andes
Um desses desbravadores foi o médico italiano Paolo Mantegazza, que retornou do Peru em 1859 dizendo ter descoberto uma planta medicinal incrível. Naquele ano, o químico alemão Albert Niemann isolou o alcaloide contido na folha. Daí em diante, a substância passou a ser usada como princípio ativo em bebidas de todo tipo.
“O primeiro milionário da cocaína talvez tenha sido o químico francês Ângelo Mariani”, diz Markel. “Ele combinou folhas de coca com bourdeaux e vendeu com o nome de Vinho Mariani”. A bebida fez sucesso até no Vaticano, conquistando o paladar do papa Leão 13.
MÚLTIPLAS VIAS
O estimulante era vendido na forma de pó, solução injetável, cigarro e tônico.
SEM CONTRAINDICAÇÃO
Numa campanha de cocaína medicinal feita em 1885, o laboratório americano Parke & Davis garantia aos consumidores que a substância era capaz de:
• Controlar o apetite e substituir a comida.
• Transformar o covarde num homem corajoso.
• Fazer do silencioso uma pessoa eloquente.
• Libertar do vício do álcool e do ópio.