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Sexos opostos

Homens e mulheres são ainda mais diferentes do que se imaginava: a desigualdade começa na concepção

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h52 - Publicado em 31 ago 1988, 22h00

Lúcia Helena de Oliveira

Responda depressa: quais são as principais diferenças entre o homem e a mulher? A resposta provavelmente não é a que você está pensando ou, ao menos, não é apenas o que você pode estar pensando. Mas, se passou por sua cabeça a distribuição dos cromossomos no núcleo celular, o funcionamento do hipocampo cerebral, a velocidade das cordas vocais e da respiração, a largura da bacia, a proporção de gordura, a mucosa do estômago e a quantidade de suor e de lágrimas derramadas, então você acertou. Pois todas estas são grandes diferenças entre o homem e a mulher. E, claro, não são as únicas. Igualdade entre os sexos, ao pé da letra, nunca existiu. Desde a concepção, homem e mulher são diferentes. No óvulo existem 23 cromossomos, todos iguais, com a forma parecida à de um X, em quanto entre os 23 cromossomos do espermatozóide pode haver um cromossomo com a forma de Y. É o homem, portanto, quem determina o sexo: a união de um cromossomo Y com o X do óvulo gera um menino; X com X faz nascer menina. Mas a diferença também é quantitativa pois a loteria desse casamento de cromossomos parece favorecer os homens: estatisticamente, para cada 100 meninas que vêm o mundo são concebidos 105 meninos. Em compensação, meninos tendem a morrer mais que meninas — o que mantém o equilíbrio entre os sexos na população.

Em primeiro instante, o sexo cromossômico de uma pessoa só se manifesta no embrião entre a sétima e a décima semana de vida. Até então, menino e menina se parecem. Mas, nesse período, o cromossomo Y faz com que certos tecidos, cuja tendência seria formar ovários ou glândulas sexuais femininas, se transformem em testículos, as glândulas sexuais masculinas. “Uma pequena produção de hormônios no feto”, explica o endocrinologista Jairo Hidal, da Escola Paulista de Medicina, “de alguma maneira deixa no cérebro uma marca (ainda não localizada) que o faz trabalhar ou à maneira masculina ou feminina.” A forma de trabalhar, por sinal, é a única divergência entre o cérebro masculino e o feminino.

Durante muito tempo falou-se, para alegria dos homens, na diferença de tamanho: de fato, o cérebro da mulher pesa em média 1,150 quilo e o do homem chega a 1,400 quilo. Mas hoje os cientistas sabem que o tamanho do cérebro não documenta necessariamente inteligência. “Na realidade, nem homem nem mulher usam todos os seus neurônios, de maneira que o tamanho do cérebro dá e sobra tanto para um como para outro”, pensa o neurologista José Levy, da Faculdade de Medicina da USP. “A única diferença importante ocorre na região cerebral do hipocampo, que trabalha de forma contínua nos homens e ciclicamente nas mulheres.” Ou, como prefere o endocrinologista Hidal, “o hipocampo feminino atua de modo mais sofisticado”. O hipocampo governa a hipófise – a glândula-mãe situada no cérebro, na altura das sobrancelhas que comanda as demais glândulas do organismo. Todas elas, aliás, já funcionam na criança, com exceção das gônadas, as glândulas sexuais, para as quais a hipófise acorda num belo dia – é o início da puberdade. No caso do homem, começa então a haver uma comunicação contínua entre a hipófise e os testículos. A hipófise manda dois hormônios pela circulação até que os testículos comecem a produzir testosterona, o hormônio masculino. Já na mulher, a hipófise primeiro ordena que os ovários fabriquem uma série de hormônios do grupo chamado estrógeno. No pico dessa produção, há uma queda brusca; então, a hipófise determina que os ovários produzam um segundo hormônio, a progesterona. É como se existisse um relógio no organismo feminino: ao longo do mês, a taxa hormonal do homem é sempre a mesma; na mulher, varia conforme o dia do ciclo menstrual.

Pois o corpo feminino está continuamente se preparando para a gravidez. A diferença na regulação dos hormônios produz efeitos onde menos se espera. “A mulher tem a necessidade de respirar ligeiramente mais depressa que o homem”, informa o pneumologista Flávio Tavares Martins, do Hospital Albert Einstein, de São Paulo. Respirar mais rápido, porém, não significa ter mais fôlego. A capacidade pulmonar do homem é que é maior (de 25 a 33 por cento). Isso lhe garante um desempenho melhor, por exemplo, em exercícios aeróbicos.

A vantagem no fôlego tem lógica: o homem possui mais massa muscular, que precisa de oxigênio para trabaIhar. A massa muscular é fruto da ação, na puberdade, dos hormônios masculinos, os andrógenos. Tão essenciais são esses hormônios que até as mulheres os têm, embora em proporção consideravelmente menor— cerca de 6 por cento do total masculino. Sem eles, não haveria academia de ginástica capaz de proporcionar às damas músculos mais desenvolvidos. Aos 17 anos, pouco mais da metade do peso do rapaz corresponde aos músculos; já na moça, a massa muscular eqüivale a 40 por cento do peso. A mulher, em compensação, tem mais tecido gorduroso concentrado principalmente na região das coxas e dos quadris.

Uma das hipóteses para explicar o fato de a mulher ter mais gordura e o homem mais músculo é a de que em tempos primitivos a função do sexo feminino era exclusivamente a maternidade. A gordura, supõem os cientistas, seria uma fonte adicional de energia, necessária para levar uma gestação até o final. Já o homem precisava ter mais força para correr em busca de alimento e literalmente lutar pela vida da família. Com tanto músculo, é natural que um homem adulto seja mais consumista: ele deve ingerir 2 700 calorias diariamente, enquanto a mulher precisa somente de duas mil. Essa diferença eqüivale a uma xícara cheia de açúcar.

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O homem, portanto, sente mais fome—a não ser quando a fome feminina é apenas fruto de ansiedade. “Mas as mulheres têm mais necessidade de comer carne do que os homens”, nota a nutricionista Midore Ishii, da Faculdade de Saúde Pública da USP, “porque elas precisam mais de ferro, um mineral essencial à formação de glóbulos vermelhos, para repor as perdas da menstruação.” Engana-se, porém, quem pensa que as formas femininas são determinadas exclusivamente pela distribuição de gordura no corpo. É que os ossos também têm sexo. “A bacia da mulher é bem mais larga que a do homem, porque um bebê deve passar por ela”, explica o antropólogo Daniel Munoz, da Faculdade de Medicina da USP.

A abertura infrapúbica na mulher fica em torno de 90 graus e no homem se limita a 60. No homem, o sacro— osso da parte de trás da bacia—é mais retilíneo, de forma que, ao se observar a sua bacia por cima, vê-se que o canal pélvico é quase fechado. Na mulher não existe a barreira do sacro, que se curva para trás, conferindo-lhe por tabela um bumbum mais arrebitado. “Como a distância entre os joelhos é a mesma em homens e mulheres, o fêmur também passa a acusar o sexo”, aponta Munoz. Na verdade, como a bacia da mulher é mais larga, o fêmur acaba ficando inclinado; no homem, porém, sua posição é mais reta.

O crânio também difere conforme o sexo, embora não se saiba por quê. A mulher tem o osso frontal da testa mais reto, o ângulo nasal mais aberto. Já o homem tem uma protuberância na altura das sobrancelhas e arcos nasais mais fechados.

O hormônio masculino, provavelmente pelo mesmo motivo que provoca o desenvolvimento de músculos, torna os ossos mais fortes nos homens. Além disso, comparando-se um homem e uma mulher da mesma altura, pode-se notar que o homem tem pernas e braços mais longos—talvez porque a mulher devesse reservar espaço no tronco para a gestação. Os ombros femininos são estreitos, o que deixa os braços da mulher naturalmente mais encostados na cintura—um trejeito usado e abusado por atores quando interpretam personagens femininas.

Mas o fato de o corpo do homem ter proporções maiores que o da mulher acaba resultando numa diferença que só pode ser percebida pelo ouvido: a voz. Por uma lei da Física, quanto maior for o chamado trato vocal— o tamanho da laringe, das caixas de ressonância e das articulações—mais grave será a voz. “Podemos comparar a voz do homem a um violoncelo e a da mulher a um violino”, diz a fonoaudióloga Leny Cristina Kyrillos. Até a adolescência, as vozes masculinas e femininas têm um mesmo tom. Mas depois os hormônios provocam o desenvolvimento da laringe e das cordas vocais—e aí o tom é outro.

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Nos rapazes, o período da muda vocal, como é chamada, demora cerca de cinco meses e causa a formação do pomo-de-adão—que na verdade é o ângulo das cordas vocais—, além de alterar uma oitava a tonalidade da voz. Ou seja, após a muda, a voz masculina fica oito notas musicais mais grave. Nas mulheres, a muda dura apenas três meses. No final do processo, a voz só estará duas ou três notas mais grave. Por mais fino que um homem fale, porém, suas cordas vocais vibram, no máximo, 130 vezes por segundo. Já por mais grossa que seja a voz, as cordas vocais femininas vibram, no mínimo, 190 vezes por segundo. “O tom das vozes do homem e da mulher só torna a se encontrar na velhice, quando se aproxima ao do sexo oposto”, explica Leny.

Além da voz, o olfato também parece não ser o mesmo em homem e mulher. Uma pesquisa realizada no ano passado revelou que as mulheres não só acreditam que sentem cheiros melhor como do fato sentem. Como a sensação de sabor é parcialmente proporcionada pelo cheiro da comida, seria natural que a mulher também tivesse um paladar mais refinado. No entanto, os maiores cozinheiros do mundo são homens.

Outra diferença marcante entre os sexos é a distribuição de pêlos. Os pêlos pubianos na mulher formam um triângulo e no homem um losango. E, como é notório, o homem é bem mais peludo, possuindo até barba, graças à ação de hormônios. “Conseqüentemente, sua pele tende a ser mais oleosa”, explica o dermatologista Mauro Yoshiaki Enokihara, da Escola Paulista de Medicina, “pois cada pêlo está ligado a uma glândula sebácea.” Recentemente, um estudo com atletas americanos provou que os homens também transpiram mais.

Parece vantajoso, mas não é: as mulheres, suando menos, conseguem manter o equilíbrio da temperatura corporal em climas quentes. Daí os cientistas concluíram que o organismo feminino deve ter controles de temperatura mais eficientes, embora não se saiba o motivo.

Também mais eficiente parece ser o sistema imunológico feminino—ao menos a julgar pelos números das reações a transplantes: em pacientes mulheres é de 55 por cento; em pacientes homens cai para 28 por cento. Em compensação, as mulheres tendem mais a sofrer de doenças auto-imunes, como a artrite, que faz cinco vezes mais vítimas femininas. De qualquer forma, a mulher vive em média de quatro a dez anos mais que o homem – um bom motivo para falar em sexo forte no feminino. Talvez haja uma predisposição genética para isso, segundo recentes hipóteses levantadas nos Estados Unidos. A cada dia, por sinal, surgem novos estudos para explicar o fato.

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Fala-se, por exemplo, no papel desempenhado pelos hormônios. Por causa deles, o homem teria mais colesterol — uma comprovada causa de infartos. Mas as aparências podem enganar: embora os homens tenham sete vezes mais infartos que as mulheres, a razão pode estar no comportamento. “Quanto mais moderna a sociedade, mais a mulher começa a adquirir hábitos como fumar e beber, entrando na dança dos problemas cardíacos”, observa Charles Mardy, cardiologista do Incor. Uma coisa é certa: os hormônios masculinos estimulam a acidez no aparelho digestivo, deixando os homens mais sujeitos a úlceras.

“Ao contrário, os hormônios femininos comprovadamente protegem a mucosa do estômago”, explica o gastrenterologista Moacir da Pádua Vilela, da Escola Paulista de Medicina. Mas as mulheres, após os 45 anos, têm uma tendência muito maior a engordar do que homens da mesma idade. “Uma mulher em cada cinco mulheres nessa faixa etária desenvolve um problema de tireóide em que o metabolismo diminui. Isso é raro em homens”, compara o endocrinologista Geraldo Medeiros. Além de afetar tanto a fisiologia quanto a anatomia de ambos os sexos, os hormônios exercem marcada influência sobre o comportamento. “Os andrógenos, atuando no cérebro, deixam os homens naturalmente mais agressivos”, diz Medeiros. “Todos sabem que um cavalo castrado é dócil, comparado a um garanhão”, observa.

Já nas mulheres, parece que a progesterona pode provocar irritabilidade ou melancolia, daí a chamada tensão pré-menstrual quando esse hormônio entra em ação. Uma pesquisa do bioquímico americano William Frey revelou que a prolactina—hormônio que estimula a produção de leite—deixa as mulheres mais choronas: é que a prolactina também estimula as glândulas lacrimais (embora em matéria de risos e sorrisos homens e mulheres tenham a mesma capacidade).

Sendo assim tão diferentes, como homens e mulheres conseguem viver juntos? Alguém poderia sentir-se tentado a responder que não conseguem mesmo—mas não seria exato. A resposta certa está na ação dos andrógenos, horrnônios que têm a notável propriedade de provocar algo em comum em homens e mulheres: o desejo sexual. E homens e mulheres quase sempre desejam o sexo oposto — aquele que Ihes é tão diferente.

Falsas diferenças

Muitas vezes, quando falam de sexo, as pessoas citam diferenças onde o que existe é igualdade ou então trocam as bolas — geralmente em prejuízo da mulher. São as falsas verdades que aparecem ao se comparar características masculinas e femininas. Alguns exemplos: Meninas adoecem mais do que meninos As estatísticas mostram o contrário: os meninos não só adoecem mais (embora não se saiba exatamente por quê) como estão mais sujeitos a acidentes (o que é fácil de entender). Mulheres têm mais tendência a engordar do que homens Antes dos 45 anos, a mulher tem tanta tendência a ganhar quilos quanto o homem. Quem come mais do que precisa e não faz exercícios engorda—sexo não tem nada com isso .A mulher tem menos sensibilidade ao calor nas mãos A quantidade de sensores de temperatura na pele do homem e da mulher é equivalente. Se o homem mexesse tanto com panelas como a mulher, também suportaria mais o contato com objetos quentes. O organismo da mulher tem mais água A mulher, na época da menstruação, retém mais água, por causa do aumento de hormônio progesterona. Ora, esse hormônio também conduz sal para o intestino. E, como se sabe, sal retém água. Mas, na verdade, o organismo masculino possui 10 por cento mais de água do que o feminino, por causa da maior massa muscular.

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Onde o homem é mais homem

coração: mais sujeito a infarto, porque a taxa de colesterol é maior

pulmão: a capacidade é entre 25 e 33 por cento maior

glândula sudoríparas:produzem mais suorpele:tende a ser mais oleosa

músculos: são mais robustos e sua massa corresponde a mais da metade do peso do corpo

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pernas: são mais longas

O argumento da força

Nos Jogos Olímpicos de Los Angeles, em 1984, dois recordes foram quebrados na prova de 200 metros rasos: a americana Valerie Hooks cobriu o percurso em 22s03; o americano Carl Lewis, porém, marcou 19s80. Nenhuma originalidade nisso. As marcas masculinas são sempre melhores do que as femininas. Por quê? “Porque os homens são mais fortes, mais rápidos e mais resistentes”, responde o professor de Educação Física José Medalha, vice-técnico da seleção de basquete masculino que disputa as atuais Olímpiadas de Seul A resposta pode parecer sumária. É disso mesmo, porém, que se trata.

Em média, a força muscular da mulher corresponde a 70 por cento da força do homem. A maior diferença está no músculo flexor do antebraço, que nos permite erguer pesos. Sua força, na mulher, eqüivale a menos da metade da força no homem. Já a menor diferença—22 por cento—está nos músculos envolvidos na mastigação, o que, infelizmente para as mulheres, não faz diferença nenhuma na vida esportiva. Que as mais fracas desculpem, mas a força é fundamental no esporte. “No basquete, por exemplo, é preciso ter força nos músculos para correr na quadra. Por isso as equipes não podem ser mistas”, comenta o professor Medalha.

Para correr, aliás, o homem conta com outra vantagem: seus ossos são proporcionalmente maiores, e ossos servem de alavanca para os músculos. O fato de também a capacidade respiratória ser diferente não pode ser esquecido. Mas, embora a do homem seja maior, as mulheres atingem o auge de sua capacidade cerca de três anos antes dos homens, aos 14-16 anos. Por isso, acreditam alguns pesquisadores, as adolescentes se saem melhor em provas de natação do que os rapazes com a mesma idade. A mulher tem ainda muito mais flexibilidade e coordenação motora. “Por mais que um homem se esforce, nunca chegará a alcançá-la”, acredita Medalha. Daí porque, nas modalidades esportivas em que a força não predomina, a mulher pode sair-se melhor: por exemplo, na patinação ou na ginástica olímpica, que, ao requerer jogo de cintura, beneficia a mulher, por causa de sua bacia larga.

Onde a mulher é mais mulher

cérebro: o hipocampo funciona a intervalos regulares, por comandar a produção de hormônios diferentes

glândulas lacrimais: produzem mais lágrimas

voz:a freqüência das cordas vocais é maior

estômago: possui mucosa mais resistente

bacia:é mais larga

coxas:além de uma concentração maior de gordura nessa região, o osso fêmur é mais inclinado

Para saber mais:

Os verdadeiros segredos do sexo

(SUPER número 3, ano 4)

Anos rebeldes

(SUPER número 11, ano 6)

Tentação em dose dupla

(SUPER número 10, ano 7)

O curto-circuito do orgasmo

(SUPER número 11, ano 7)

Como ele pensa. Como ela pensa

(SUPER número 7, ano 8)

A ciência do desejo

(SUPER número 6, ano 10)

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