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Alain de Botton – a filosofia no dia a dia de todo mundo

Paixão, amor, trabalho, moradia, religião, viagens, notícias nos jornais... O cotidiano é a grande fonte de reflexão de Alain de Botton.

Por Thale de Menezes
Atualizado em 8 fev 2021, 09h46 - Publicado em 30 out 2019, 18h57

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SI_FilósofosPop_Botton_capuíço de nascença, britânico por opção e contingência, Alain de Botton deve muito do reconhecimento mundial de sua obra a um francês. Brincadeiras de nacionalidade deixadas de lado, é inegável que Marcel Proust propiciou a De Botton a chance de redefinir seu futuro como escritor.

Em 1993, um ano depois de obter seu mestrado em filosofia no King’s College London, a publicação de seu primeiro livro, Ensaios de Amor, expunha De Botton como experimentador de uma mescla de narrativa ficcional e ensaio. A história de um casal que se conhece ocupando poltronas lado a lado numa viagem de avião era um inteligente e ligeiro romance, com a peculiaridade de exibir análises das emoções vividas pelos enamorados.

A bagagem intelectual e acadêmica do escritor estava naquelas páginas, é evidente, mas não de uma maneira incisiva, que mostrasse ao mundo que De Botton estava iniciando sua jornada numa mistura entre romance e ensaio filosófico.

Essa maneira de injetar filosofia de forma quase camuflada em livros de ficção continuou nas obras seguintes, O Movimento Romântico (1994), sobre um triângulo amoroso, e Nos Mínimos Detalhes (1995), que conta a vida de uma mulher numa fluida desordem de fatos.

Foi necessário a De Botton abandonar completamente uma narrativa romântica para que as pessoas pudessem descobrir a força de sua vocação para levar filosofia às massas. E essa constatação veio com Como Proust Pode Mudar Sua Vida, em 1997, sua primeira obra de não ficção

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O título com viés de livro de autoajuda causa certa estranheza, porque quem conhece um mínimo sobre Marcel Proust custa a acreditar em potenciais conselhos benéficos que possam estar encerrados na vida e na obra do criador do monumental Em Busca do Tempo Perdido.

Com sagacidade e bom humor, De Botton faz um garimpo de bons resultados nos textos e na vida de Proust. Há na obra do escritor francês uma razoavelmente escondida vocação para aproveitar a vida, com a carga de excentricidades que a mente singular de Proust oferece.

Surpreendente best-seller mundial, principalmente no mercado americano, que historicamente rechaçou a grandiosidade de Proust, o livro deu a De Botton a certeza de vislumbrar um caminho aberto à sua frente que permitiria espaço suficiente para uma obra direcionada a popularizar a filosofia. Nasceu ali mais um pensador pop.

A Consolação na Filosofia veio em seguida. Mais um livro acessível, este ainda mais didático, sobre o que é ser um filósofo. Suas palestras e outros eventos com o público cada vez mais levavam as discussões à busca pela felicidade. De Botton então tratou de associar essa demanda às situações mais corriqueiras. Estava ganhando então o epíteto que não deixaria mais de acompanhá-lo, “o filósofo do cotidiano”.

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Ele provavelmente decepcionou um ou outro leitor que comprou A Arte de Viajar na esperança de encontrar um guia de turismo moderninho. De Botton escreveu um livro vivencial em que tenta assimilar as motivações das pessoas quando decidem viajar e sair da zona de conforto por algum tempo. Mais do que o charme cosmopolita dos aeroportos ou o espírito aventureiro de parar num bar empoeirado na beira de uma estrada, é um livro sobre sublimes descobertas e sérias decepções diante do novo, e fala de como isso afeta a vida das pessoas.

Relativizar o valor do sucesso, afastando esse conceito dos limites da simples recompensa financeira, foi o caminho seguinte, com Desejo de Status (2004). O autor aponta cinco causas responsáveis pelo desejo de subir na vida a qualquer preço. Ele elenca a expectativa muito elevada desenvolvida por cada pessoa a respeito de suas metas, um esnobismo depreciativo da parte dos outros, a falta de relações amorosas que forneçam sustentação emocional e associa a meritocracia radical a uma sociedade que é dependente de fatores externos para o sucesso profissional.

Nessa obra o caráter de autoajuda é muito suavizado. De Botton critica as sociedades que criam pessoas infelizes, decepcionadas com seu trabalho e com sua posição social. Ele não trata de oferecer no volume soluções simples e eficazes. Defende uma nova compreensão das metas almejadas e mecanismos de aprimoramento pessoal que possam atenuar essa insatisfação.

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As reflexões em Desejo de Status têm muita influência na criação de um dos projetos mais ambiciosos e declaradamente favoritos do filósofo, a School of Life.

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Fundada em Londres, a Escola da Vida surgiu em 2008 para fazer seus alunos pararem e refletirem sobre questões emocionais. A ideia sugerida por De Botton é preencher lacunas sobre aspectos da vida profissional e pessoal que não ganham a devida atenção nas universidades e ficam à margem do aprendizado técnico em outras instituições.

A Escola da Vida se espalhou por uma dezena de países. Desde 2013 existe uma unidade no Brasil, em São Paulo, que trabalha em vários espaços diferentes que recebem suas atividades. Está aberta a qualquer pessoa que queira se desenvolver emocionalmente.

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O que estudar? As propostas da escola podem abarcar questões do tipo encontrar um amor, lidar com o fracasso, ser mais gentil, se tornar mais eficaz no trabalho ou tomar decisões profissionais acertadas. A própria escola se define dessa forma em seu site: “Fornecemos novas maneiras de explorar a vida em diferentes questões, entre pessoas com o mesmo pensamento, desde inteligência emocional, passando por ensinos das humanidades (literatura, filosofia, história, psicologia e arte), e não temos dogma”.

Enquanto começava o trabalho na escola, De Botton foi selecionado por agentes literários britânicos para o projeto de “escritor residente” no aeroporto de Heathrow, em Londres. Durante uma semana de 2009, ele ficou sentado numa mesa no terminal 5 do aeroporto, observando passageiros e conversando com eles. O resultado é o livro Uma Semana no Aeroporto, um de seu best-sellers.

No mesmo ano, produziu outra obra que também nasceu de observação e entrevistas, Alegrias e Tristezas no Trabalho. Em busca das motivações e circunstâncias da escolha profissional de operários, visitou empresas tão díspares como uma fábrica de biscoitos e uma montadora de peças tecnológicas para aviões.

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De Botton direcionou suas reflexões para assuntos atraentes ao grande público. Em 2007, Religião para Ateus se mostrou um volume muito peculiar. O autor lista os benefícios que as religiões podem proporcionar a quem não acredita nelas. “É claro para mim que as religiões são, no final das contas, muito complexas, interessantes e, às vezes, sábias para serem aproveitadas apenas por aqueles que acreditam nelas”, disse De Botton.

Em 2012, para atrair atenção da mídia para a Escola da Vida, publicou um livro numa série de seis volumes dedicados a questões emocionais, bancados pela empresa. O título não poderia ser mais incisivo: Como Pensar Mais Sobre Sexo. Provocativo, o filósofo afirma que tanto homens como mulheres pensam em sexo de forma inadequada, o que faz com que poucas pessoas acreditem ser “normais” em seu comportamento sexual. Para ele, as relações sexuais neste século estão inseridas “num jogo que opõe amor e desejo, aventura e comprometimento”.

Seu trabalho seguinte teve um caráter prático, propondo um exercício partilhado com o leitor. Em Notícias: Manual do Usuário (2015), ele seleciona 25 notícias de temas diversos e diferentes fontes jornalísticas para analisar cada uma em detalhes e discutir como elas podem ter efeitos sobre o leitor.

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Em seu livro mais recente, O Curso do Amor (2017), De Botton retoma a fórmula de sua estreia literária. Em Ensaios de Amor ele elegeu um casal jovem no despertar da paixão. Agora, seus novos personagens formam um casal em Edimburgo, que tem filhos. O autor volta à ficção para discutir os aspectos de um relacionamento duradouro. As pressões do cotidiano vão aos poucos minando os ideais românticos, e os dois lutam para manter seu amor vivo.

De Botton vai inserindo na história seus comentários. Para um filósofo que ainda não chegou aos 50 anos, De Botton amadurece sob o olhar de seu público. Com fôlego para manter sua aura de pensador do cotidiano.

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