Nostalgia brasileira: acervo reúne fotos de lugares que não existem mais
Conheça o catálogo de registros de lugares extintos, como o antigo Parque da Mônica e o Parque da Xuxa.
Você já teve a sensação de pensar em uma coisa, ou lugar, e não saber se você viveu, sonhou, se te contaram ou se você imaginou? Foi esse tipo de lembrança difusa que inicialmente motivou a designer Luísa Guarnieri a criar o Acervo de Lugares que Não Existem Mais.
O acervo já inclui fotos do antigo Parque da Mônica, do Parque da Xuxa, da Livraria Saraiva, do Mercado Ibirapuera e de outros locais extintos.
Luísa pesquisa sobre design e nostalgia, principalmente sobre estéticas das décadas de 1980, 1990 e 2000, e fala sobre o assunto em vídeos na sua conta do TikTok. Uma das abordagens é pesquisar estéticas específicas que, em geral, as pessoas nem sabem que têm nome.
Um exemplo: você se lembra de como era o design colorido e divertido da extinta Revista Recreio? Ou como era a decoração lúdica do Castelo Rá-Tim-Bum? Talvez você nem saiba como começar a descrever, mas muitos pesquisadores do design já se debruçaram sobre essas tendências. No caso da Revista Recreio, o nome da corrente é Wacky Pomo, e dá pra notar várias influências da corrente Whimsicraft na estética do Rá-Tim-Bum.
A classificação é do CARI Institute, um coletivo de centenas de designers que pesquisam “estéticas consumidoras”. Estudar essas estéticas, segundo eles, não serve só para inspirar outros trabalhos de design: é uma ferramenta para entender eventos sociais e econômicos daqueles momentos. “É fundamental observar e considerar a relação cíclica entre as atitudes coletivas de uma cultura e as qualidades visuais dos artefatos que ela gera”, diz o site do coletivo.
“Eu estava fazendo muitos vídeos no TikTok falando sobre essas estéticas antigas e muitas delas foram criadas e definidas para pessoas de outros países, e quando eu trazia para os meus vídeos, eu tentava buscar exemplos aqui no Brasil”, conta Luísa. Foi aí que ela se confrontou com a questão que motivou a criação do acervo: a dificuldade de encontrar referências brasileiras. “Eu percebi que tinha muitas fotos de espaços internos dos Estados Unidos, e isso começou a me incomodar, porque eu queria achar essas fotos de lugares do Brasil”, conta.
Ela falou sobre o assunto em um dos vídeos do TikTok e recebeu vários comentários de pessoas que também dividiam a mesma angústia ou nostalgia. Foi então que ela foi buscar nos seus álbuns de fotos familiares por lugares que não existiam mais. Ela encontrou cerca de 30 fotos que foram publicadas em um site, e abriu para contribuições públicas.
O projeto foi divulgado há duas semanas no TikTok e há uma semana no Instagram e já recebeu cerca de 30 colaborações. Mas cada pessoa manda quantas fotos quiser: uma seguidora chegou a mandar 40 de uma vez.
Agora as pessoas até fazem pedidos específicos. “Acho que recebi uns três pedidos de pessoas que queriam muito ver foto da lanchonete que tinha nas Lojas Americanas, acho que nos anos 80 ou nos anos 90”, conta. “Outro lugar que muita gente comenta mas ainda não recebi fotos é o Aeroclube Plaza Show, que ficava em Salvador.”
Ela espera que o arquivo sirva para inspirar o trabalho de outras pessoas que precisem de referências brasileiras, como pesquisadores, designers, artistas, arquitetos e até quem faz a direção de arte de cinema. “Por exemplo, a pessoa está fazendo algum filme de outra época, alguma coisa que se passa em outro momento e quer ver exatamente como era uma praça de alimentação de shopping dos anos 90. É algo super específico e provavelmente precisaria de uma pesquisa enorme”
Apesar das várias utilidades que o projeto pode ter, ela considera que inicialmente a principal motivação está sendo mesmo a nostalgia. Nas páginas da designer, as pessoas trocam ideias nos comentários sobre os lugares e parecem concordar, em geral, que os lugares ficaram mais neutros ou “chatos”, hoje em dia.
“Claro que quando a gente é criança, tudo parece maior, mais mágico. Mas, como designer, olhando essas imagens e tudo, eu acho que tinha um cuidado um pouco maior, uma parte mais craft [artesanal] maior, sabe? Ainda existem lugares muito cuidadosos e bonitos hoje em dia, mas eu acho que antigamente eles eram mais convidativos para você ficar lá e fazer coisas, e não só chegar, comprar e ir embora”, diz Luísa.
As colaborações para o Acervo de Lugares que Não Existem Mais podem ser enviadas através de um formulário disponível no site.