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O inusitado acordo da Disney para recuperar o seu personagem mais antigo

Em 2006, a empresa trocou Al Michaels, narrador de futebol americano, pelos direitos do coelhinho Oswald, que estavam com a rival Universal. Entenda.

Por Rafael Battaglia
16 mar 2024, 10h00

O primeiro personagem da Disney não foi o Mickey Mouse.

Entre 1923 e 1927, Walt Disney produziu O País das Maravilhas de Alice, uma série baseada na obra de Lewis Caroll que mesclava animação com atores reais. Mas ele encerrou o projeto para focar em algo 100% animado.

O pedido veio do produtor Charles Mintz, que iria distribuir o novo desenho via Universal Pictures. Foi então que Walt e Ub Iwerks, animador e seu amigo de longa data, criaram Oswald, o Coelho Sortudo.

Disney produziu 27 curtas com Oswald. Mas o sucesso foi breve. Em 1928, Walt foi a Nova York renegociar um contrato mais lucrativo com a Universal, que detinha os direitos de Oswald. Então descobriu que o estúdio havia chamado quase todos os animadores da Disney para produzir os desenhos por conta própria. Walt saiu sem acordo, sem funcionários – e sem o coelho.

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Meses depois, Disney criou o Mickey – um ratinho com feições e personalidade bem similares às de Oswald. Mickey virou um ícone internacional, mas Oswald caiu no ostracismo. Nas décadas seguintes, ele estrelou mais alguns curtas (alguns feitos por Walter Lantz, criador do Pica-Pau) e histórias em quadrinhos. Mas, a partir dos anos 1960, passou a acumular poeira nos arquivos da Universal.

Cena da animação Oswaldo, O coelho Sortudo (1929).
(Wikimedia Commons/Reprodução)

A Disney só conseguiu reaver os direitos do personagem em 2006, 78 anos depois de sua criação. E o acordo aconteceu graças a uma disputa pelos direitos de transmissão do futebol americano.

Os donos do jogo

A NFL, principal liga de futebol americano dos EUA, é o campeonato esportivo mais assistido do mundo. Os direitos de transmissão são pulverizados entre as emissoras. Mas é claro: há horários mais nobres que outros. Dois dos jogos de maior audiência são o de domingo à noite (o Sunday Night Football) e o de segunda à noite (Monday Night Football).

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Por décadas, a emissora que detinha os direitos do Monday Night era a ABC, que, nos anos 1990, foi comprada pela Disney. Àquela altura, a ABC era o segundo maior canal aberto dos EUA.

Na época, a Disney investiu pesado em televisão. Comprou 80% da ESPN, canal a cabo que transmitia o Sunday Night. Mas decisões estratégicas nos anos 2000 fizeram com que a empresa do Mickey alterasse esse arranjo futebolístico. Afinal, não havia por que manter a própria cobertura em dois canais diferentes.

Em 2005, a ABC deixou de transmitir a NFL. O Monday Night, então, passou a ser da ESPN. Já o Sunday Night saiu da alçada do Mickey e foi para a rival NBC, que havia acabado de se fundir com a Universal (guarde essa informação).

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Naquele momento, a ESPN se viu com duas equipes de transmissão: o pessoal da casa e os renegados da ABC. Enquanto decidia quem participaria da cobertura do Monday Night, a NBC se antecipou e contratou vários nomes da ABC – entre eles, o comentarista e ex-treinador John Madden, uma das figuras mais famosas da NFL.

Quando Madden deixou a Disney, especulou-se que seu parceiro de transmissão, o locutor Al Michaels, faria o mesmo. E fez: Michaels, que trabalhou por mais de 30 anos da ABC, expressou o seu desejo de reincidir o contrato para trabalhar na NBC.

Restou ao então presidente da ESPN, George Bodenheimer, falar com o CEO de Disney, Bob Iger, sobre o caso de Michaels. E Iger teve uma ideia: disse a Bodenheimer que ele deveria negociar a saída do apresentador em troca dos direitos do coelho Oswald.

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Iger havia acabado de assumir a chefia da empresa e viu em Oswald uma oportunidade para resgatar o legado da Disney – e fazer uma média com os herdeiros de Walt. Na época, nem Bodenheimer nem os executivos da NBC Universal com quem conversou conheciam o coelho.

Mas deu certo. Michaels foi para a NBC e levou o acordo numa boa. A Disney montou uma festa, com direito a desfiles e almoços gratuitos, no dia que conseguiu oficialmente Oswald de volta. Hoje, Michaels segue narrando a NFL. E o coelho volta e meia aparece em desenhos e jogos de videogame (mais como um easter egg do que como personagem recorrente). Desde janeiro de 2023, a primeira versão do Oswald, bem como seus curtas mais antigos, viraram domínio público.

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