10 pensadores para você entender o mundo
O tsunami de novidades dos últimos anos trouxe à tona uma nova leva de pensadores que não abre mão de propor transformações
A seguir apresentamos alguns desses autores, agrupados por afinidades. Escolas? Não, isso é muito século 20.
Estrela solitária
Zygmunt Bauman, o desencantado que encanta
“Em nossa sociedade, Expor o privado é uma virtude e um dever público.”
O sociólogo polonês conhecido por criar o conceito de “modernidade líquida”, que usa para definir os dias de hoje e os que vêm pela frente. A ideia colou: volta e meia, seus livros aparecem entre os mais vendidos – um feito e tanto pra um pensador que não é dos mais fáceis de ler.
A modernidade líquida parte do pressuposto de que, no passado, tudo era sólido. Por exemplo: uma família tinha um pai, uma mãe e um punhado de filhos. Agora o mundo estaria mais líquido. Ou, pelo menos, os conceitos, mais frouxos. E aí, seguindo o mesmo exemplo, as famílias “líquidas” passaram a ser aceitas com naturalidade. Hoje em dia, até mesmo um bando de solteiros que mora junto pode se considerar uma família.
Para Bauman, não são apenas as famílias que estão mais líquidas, mas o mundo. Na vida profissional, um desses sintomas é a instabilidade das carreiras. A liquidez interfere até na hora de ter medo: em vez de um inimigo nítido, surge o terrorismo, que pode atacar em qualquer lugar.
De qualquer maneira, não é só porque Bauman entendeu o mundo que ele passou a concordar com tudo isso que está aí. Pelo contrário: crítico do consumismo exacerbado, o sociólogo reclama que a fluidez também tornou mais flexíveis valores importantes, como a relação humana, o amor e o comprometimento. O curioso é que é justamente a defesa dos valores sólidos que fazem de Bauman um dos pensadores de maior sucesso.
Pró-futuro
Chris Anderson, o aglutinador de ideias mirabolantes
“A tecnologia sempre vem. Estamos programados para criar o futuro, seja ele mal ou bom.”
Se o futuro tem uma igreja, é a revista americana Wired. E o pastor, quer dizer, editor da Wired é Chris Anderson. Misturando ciência, tecnologia e economia, ele cria teses mirabolantes – e, quase sempre, polêmicas.
Foi na revista que, em 2004, Anderson publicou um artigo sobre a importância dos mercados de nicho. Esse texto deu origem a seu primeiro livro, Cauda Longa, que saiu dois anos depois e fala da capacidade que a internet tem de dividir o mesmo bolo em mais fatias. Ou seja: em vez de um Michael Jackson ter seu milionário rancho Neverland, milhares de bandas de garagem vão viver de fazer shows no fim de semana.
Certo de que a internet pode realmente mudar a economia, Anderson lançou neste ano Free – O Futuro dos Preços. O livro fala sobre a quantidade de dinheiro que as coisas grátis (ou muito baratas) conseguem movimentar. Um exemplo disso é o Google, uma corporação bilionária que oferece seus serviços gratuitamente para os consumidores – que aceitam ver anúncios em seus produtos para pagar as contas. Resumindo: para o Anderson, a forma de ganhar dinheiro daqui para a frente é fazer muita gente pagar muito pouco pelo que você vende.
Henry Jenkins, não basta assistir, tem que participar
“Nenhum estudioso jamais vai saber metade do que os fãs sabem sobre cultura pop.”
Esse estudioso da mídia defende que o modelo de entretenimento mais eficaz nos dias de hoje é aquele que acontece em muitas plataformas: livro, filme, games e até a participação do público.
Ou seja: não basta ver Lost, tem que discutir na internet. E ser fã de Crepúsculo é ter carta branca para criar fanfics (ficções dos fãs, baseadas no original). Ele batizou esse conceito de cultura de convergência, e deu origem a um livro de mesmo nome.
Nicholas Negroponte, informação gera riqueza
Mais conhecido hoje por seu projeto de produzir e distribuir notebooks de US$ 100 para estudantes de países pobres – para ele, o melhor jeito de deixarem de sê-lo. Antes, como diretor do MediaLabs, o laboratório de mídia do MIT, foi dos primeiros gurus tecnológicos.
Na década de 1990, seu livro A Vida Digital virou moda. Entre outras coisas, o professor dizia que gravar cds de música em formato analógico era um desperdício de memória. E que o fax era um processo demorado e custoso – que deveria ser substituído por ferramentas digitais.
Brasil 2000
Ronaldo Lemos, novas regras no novo mundo
“A batalha contra a pirataria vai ser vencida com novos modelos para o novo consumidor.”
Nem filósofo nem sociólogo: esse mineiro é advogado. É que as leis também precisam ser repensadas para os novos tempos, e é isso que Ronaldo Lemos faz.
Afinal, ele é o coordenador do projeto Creative Commons Brasil, um tipo de licença de direito autoral onde quem determina o que pode ou não pode é o autor. Foi no Centro de Tecnologia e Sociedade da Escola de Direito da FGV-RJ que o Creative Commons foi adaptado para as leis brasileiras.
Lemos também estuda a cultura brasileira. Ao lado do antropólogo Hermano Vianna e de outros colaboradores, fundou o Overmundo, site que divulga fontes de informação alternativas. Seu trabalho sobre o tecnobrega mostra como o Pará, sem grandes recursos, montou uma rede de produção e distribuição de música independente e lucrativa, usando até camelôs como pontos-de-venda.
Ciber França
Pierre Lévy, virtual desde analógico
“Ninguém sabe tudo, todo mundo sabe algo. Formar e reformar coletivos inteligentes é a arma do conhecimento.”
Ele nasceu na Tunísia, tem nacionalidade canadense, diz que tem coração brasileiro, mas é de Paris que espalha suas ideias. E, convenhamos, seu trabalho não é difícil de espalhar: consideravelmente mais prático do que seus obtusos colegas Baudrillard e Maffesoli, Lévy vê seu trabalho repercutir bem além da academia. E isso desde O Que É o Virtual? (1998), escrito quando a internet ainda estava na creche. É citado como referência até por blogueiros brasileiros quando passa por aqui.
O motivo é simples: em vez de se queixar sobre um futuro apocalíptico dominado por máquinas, Pierre Lévy está mais interessado em mostrar como usar essas máquinas para a humanidade pensar, se organizar e agir melhor.
Um exemplo disso é seu estudo de ciberpolítica – ou seja, como os eleitores podem usar a internet não só para votar mas também para acompanhar e cobrar os políticos. Hoje em dia, Lévy tenta desenvolver uma linguagem comum que possa integrar todas as redes sociais. Segundo ele, elas são uma ótima plataforma para desenvolver a inteligência coletiva.
Bernard Stiegler, o lado negro da nova era
É um filósofo francês que estuda o impacto da técnica sobre o homem. Diferentemente do otimista Pierre Lévy, ele acredita que, com o aumento da participação das máquinas no cotidiano, ficou mais difícil para o ser humano sentir prazer pelo conhecimento e pela vida. Por enquanto, a obra de Stiegler é inédita no Brasil. Uma curiosidade: ele ficou 5 anos preso por assalto à mão armada, e conheceu a filosofia em um curso por correspondência.
Futuristas
Cory Doctorow, histórias da nossa história
“A função da internet é compartilhar. Leitores baixando textos de graça é uma boa notícia para os escritores.”
Jornalista e blogueiro canadense que publica seus romances sob licença Creative Commons (ver Ronaldo Lemos). No mesmo dia em que seu romance chega às livrarias, o cara publica o livro inteirinho em seu site – e permite que qualquer um o distribua por aí. Claro, ele aposta que pouca gente tem paciência pra ler um romance inteiro na tela do computador – e que, se essas pessoas quiserem, elas vão piratear de qualquer jeito.
Mas não é só na forma de vender o livro que Doctorow inova. Seus textos são cheios de criações que têm como base o mundo contemporâneo. Um exemplo disso é o Paranoid Linux – um sistema operacional para quem tem certeza de que o governo está monitorando toda a internet e tenta proteger seus dados a qualquer custo. Apesar de o conceito ter aparecido no livro Little Brother, atualmente há um grupo de programadores empenhados em trazê-lo para a vida real.
Assim como Julio Verne e Isaac Asimov, Doctorow usa a ficção científica para mostrar, extrapolando, o que está acontecendo na vida real. E é daí que os autores costumam adivinhar como vai ser o futuro.
Warren Ellis, crowdsourcing em quadrinhos
É um autor de histórias em quadrinhos. Na série Frequência Global (incompleta no Brasil), criou um time de combate ao crime que usa pessoas normais do mundo inteiro. Afinal, em alguns casos, melhor que ter um superpoder é estar perto do problema – é o crowdsoursing (ver abaixo) de super-heróis.
J.J. Abrams, tudo ao mesmo tempo agora
É o criador de Lost, de Fringe e da versão reformulada de Star Trek, o que faz dele um dos nomes mais disputados de Hollywood. Mais que séries e filmes, suas criações são narrativas que se desenvolvem em muitos lugares: na TV, claro, mas também nos livros, nos jogos virtuais, nos fóruns de internet. Ou seja: põe em prática a cultura da convergência defendida por Henry Jenkins.
Crowdsourcing, em inglês: “usar a galera como fonte”
Nessa lista, não podia faltar o “pensamento coletivo”. A ideia aqui é usar a internet para reunir pessoas que, juntas, resolvem problemas complicados ou muito trabalhosos. O crowdsourcing tem resultados visíveis – como a Wikipedia e o sistema operacional Linux. Mas a noção de que esse “pensamento coletivo” melhora a sociedade é recorrente.