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Quibi, o streaming 100% voltado para smartphones que ainda não decolou

Lançada em abril, a plataforma prometia de fornecer conteúdo padrão Netflix em episódios curtos. Mas a pandemia e brigas internas minguaram o projeto.

Por Rafael Battaglia
Atualizado em 16 jul 2020, 16h22 - Publicado em 10 jul 2020, 20h23

Faça um pequeno exercício: abra a tela do seu celular e conte quantos serviços de streaming você tem. Logo de cara, as chances de haver ícones para Netflix e YouTube são altas. Em alguns aparelhos, haverá também outras opções, como Amazon Prime Video e Globoplay. Se você estiver nos EUA, então, a lista aumenta: Disney+, HBO Max, Hulu…

Pois é. O mundo do streaming já vem sendo a bola da vez na indústria do entretenimento há algum tempo – e a pandemia só intensificou esse fenômeno. E apesar das dezenas de plataformas existentes, desde abril há um novo concorrente na praça: o Quibi.

Idealizado por Jeffrey Katzenberg, que já comandou a Walt Disney Studios e co-fundou a DreamWorks, o Quibi é um serviço de streaming 100% voltado para celulares. Nada de smart TVs ou computadores: todo o conteúdo da plataforma é pensado para ser consumido na tela do smartphone.

A proposta está até no nome do app: “Quibi” é um acrônimo para quick bites, que em inglês significa “mordidas rápidas” (ou “beliscadas”). A ideia é que o Quibi seja visto naqueles momentos você, normalmente, acessaria o YouTube ou o TikTok, como na fila de um restaurante ou no transporte público.

Por essa razão, todos os conteúdos (filmes, séries, notícias, etc.) duram, no máximo, 10 minutos. As produções podem ser únicas, como um episódio de reality show, ou integrarem algo maior: Most Dangerous Game, por exemplo, é um filme de ação estrelado por Liam Hemsworth e Christopher Waltz dividido em 15 capítulos.

A estreia

O Quibi estreou no dia 6 de abril. Nos EUA, há dois tipos de assinatura mensal: US$4,99 (com anúncios) e US$7,99 (sem anúncios). Na época, quem se inscrevia podia assistir aos conteúdos sem pagar nada por 90 dias – hoje, o teste gratuito dura 14.

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No Brasil, o serviço também está disponível – mas de maneira, digamos, torta. A assinatura custa R$32,90 por mês, mas todo o conteúdo do app está em inglês, e ainda não há legendas ou dublagens no nosso idioma.

As expectativas para o lançamento eram altas. Para criar o app, Katzenberg se uniu a Meg Whitman, que além de trabalhar como executiva na Disney e na DreamWorks, comandou empresas do ramo da tecnologia, como a HP e o eBay. Juntos, eles atraíram investidores como Sony, Warner Bros. e a própria Disney. No total, o Quibi angariou US$1,75 bilhão para ir ao ar.

Na estreia, o aplicativo chegou a ficar em terceiro lugar na lista dos mais baixados da Apple. Na época, o Quibi possuía 50 produções originais, com planos de lançar mais 175 até o fim do ano. Os conteúdos chamavam a atenção pelos nomes de peso por trás dos projetos. After Dark, por exemplo, será uma série de terror de Steven Spielberg – e só poderá ser vista de noite. Sam Raimi, diretor da primeira trilogia do Homem-Aranha, já lançou a sua 50 States of Fright, também de terror.

Jennifer Lopez, LeBron James, Sophie Turner, Reese Whiterspoon e Anna Kendrick são outras celebridades presentes na plataforma, que aposta também na interatividade do celular: a tecnologia Turnstyle permite que o conteúdo se adapte à orientação da tela (vertical ou horizontal). Quem planeja se aproveitar disso é a série Wireless, que mostra um homem perdido nas montanhas, apenas com um celular – se o usuário colocar o smartphone na vertical, a visualização mudará para a tela do aparelho do personagem.

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Os problemas

Tudo parecia ir de vento em popa com a nova empresa – mas aí o tempo fechou. No início de junho, o Quibi caiu da 3ª para a 284ª posição na App Store. A baixa popularidade, inclusive, foi tema de piada do apresentador Jimmy Kimmel em um programa do canal ABC.

Em uma extensa reportagem da New York Magazine, publicada na última segunda (6), o jornalista Benjamin Wallace investiga os bastidores do Quibi, e apresenta algumas razões para o começo nada animador da plataforma. A primeira delas é óbvia: a pandemia. Com todo mundo em casa, a premissa original do app, de ser visto naqueles intervalos de tempo durante a rotina, foi para o espaço. De quarentena, todo mundo pode ligar a TV ou o computador e assistir pela tela grande.

A pandemia, inclusive, é a resposta oficial da empresa para a sua atual situação. Mas ela não é a única explicação – afinal, mesmo dentro de casa, ainda usamos o celular. Wallace defende que os altos índices de desemprego nos EUA, especialmente entre a parcela da população que é nativa digital (o público-alvo do Quibi), também explicam a baixa adesão – afinal, em uma crise, quem se dispõe a assinar mais um serviço de streaming?

Além desse cenário, o Quibi também enfrenta alguns problemas internos – em parte, pela personalidade de Katzenberg. Segundo funcionários e ex-funcionários do Quibi, seu estilo autoritário de comandar teria desanimado produtores, afastado executivos das mais diversas áreas e até criado uma richa com Whitman, com quem divide as funções administrativas.

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Katzenberg, vale dizer, é uma figura importante em Hollywood há décadas. Nos anos 1990, foi um dos responsáveis pelo “Renascimento da Disney”, período no qual o estúdio lançou seus clássicos modernos, como Rei Leão, A Bela e a Fera e A Pequena Sereia. Na DreamWorks, ele só saiu em 2016, quando a Comcast-Universal comprou o estúdio de animação por US$3,8 bilhões. Nessa transação, Katzenberg levou US$ 420 milhões para casa.

Mas é justamente essa experiência que parece estar complicando as coisas nos bastidores. De acordo com funcionários do Quibi, Katzenberg confia mais em sua intuição do que em outros indicativos e, não raro, recebe críticas por não entender o mercado que se dispôs a entrar. Benjamin Lee, que escreveu o review do app para o The Guardian, foi enfático: “o Quibi é uma ideia surgida em uma sala de reuniões da Los Angeles que, provavelmente, não irá sobreviver no mundo real.”

Parte do conteúdos também sofreu má recepção. Apesar de encabeçados por artistas reconhecidos, os projetos, na visão de alguns produtores, acabam indo parar no Quibi como uma segunda opção por não terem sido escolhidos por outras plataformas que dominam o mercado, como a Netflix e a HBO.

Sobram críticas até para a parte técnica. O app, totalmente pensado para celulares, tem uma ótima navegação – mas alguns usuários enfrentaram problemas com vazamento de informações graças a um problema durante a verificação de e-mail. Nem o Turnstyle escapou: a startup de vídeos Eko acusou o Quibi de ter plagiado a tecnologia.

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O que esperar?

O Quibi, assim como a maioria das plataformas de streaming, não divulga números de audiência. Dessa forma, é difícil medir o sucesso de suas produções. Até agora, o app registrou 5 milhões de downloads – destes, 1,5 milhão fizeram o cadastro para, de fato, usar a plataforma.

Nesse mês, encerra-se o período gratuito de 90 dias daqueles que se registraram em abril. É a partir de agora que a empresa verá quem, de fato, vai se manter na plataforma.

Apesar do início conturbado, os executivos se mantém otimistas. O Quibi ainda tem mais de US$ 750 milhões em caixa para gastar, e pretende conseguir mais US$ 200 milhões até o final de 2021. Resta saber se a pós-quarentena será mais amigável com o projeto – ou se servirá para sepultá-lo de vez.

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