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4 coisas que te ensinaram errado sobre a Inconfidência Mineira

A verdade ainda que tardia: os objetivos, as influências – e até a aparência – de Tiradentes e outros inconfidentes não eram as que você aprendeu na escola

Por Ingrid Luisa
Atualizado em 12 mar 2024, 09h17 - Publicado em 20 abr 2018, 16h25

A Inconfidência Mineira é uma das conspirações mais conhecidas do Brasil. Apesar do nome injusto – “inconfidente” significa “traidor”, foi um título posto pelos portugueses que acabou pegando –, intelectuais de Minas Gerais lutaram contra impostos abusivos e pela libertação do País já em 1789 (33 anos antes da nossa independência oficial, em 1822). Mas será que foi isso mesmo? Acredite, no colégio adaptam (e omitem) muitos fatos só para o assunto ficar mais simples. E aqui estão alguns erros comuns que podem ter te contado sobre um dos movimentos de revolta mais famosos do Brasil:

“Os inconfidentes lutavam pela independência do Brasil”

Um erro compreensível, mas não deixa de ser erro. Não, a inconfidência não queria a libertação do País. Ela lutava pela emancipação de Minas Gerais e do Rio de Janeiro. Só. Minas porque, lógico, os intelectuais do movimento eram de lá, e Rio de Janeiro porque eles precisavam de uma saída para o mar – e a cidade homônima era a capital federal na época. O conceito de “nação brasileira” praticamente não existia naquele período, e o regionalismo dava as cartas. Se a Inconfidência tivesse dado certo, poderíamos, hoje em dia, ter um País à parte no meio de nosso atual território.

A ideia de que eles são heróis nacionais não surgiu do nada: com a Proclamação da República, em 1889, o Brasil precisava de heróis – a República, imposta de cima para baixo, sem nenhuma participação popular, precisava ser legitimada e aclamada, e não havia forma melhor de fazer isso do que por meio da figura de alguém que, na nossa história, morreu por esses ideais. Foi aí que a Inconfidência Mineira, esquecida por 100 anos, veio à tona da maneira que a temos hoje. Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, virou mártir antimonarquista e ganhou até feriado – único brasileiro cuja data de morte é celebrada com um feriado nacional. E, assim, uma conspiração fracassada virou referência nacional de luta, coragem e, claro, República.

“A Inconfidência foi influenciada pela Revolução Francesa”

O erro aqui é matemático: apesar dos dois eventos terem ocorrido no mesmo ano, 1789, os inconfidentes foram presos em maio, e a Queda da Bastilha, marco inicial da Revolução Francesa, aconteceu em 14 de julho – quase dois meses depois. Não há como a segunda ter influenciado a primeira. Tiradentes só foi morto em 21 de abril de 1792, depois de um logo processo conhecido como Devassa. Mas, para não dizer que essa confusão de datas é totalmente absurda, os dois movimentos foram influenciados pelas mesmas ideias: o Iluminismo, corrente filosófica que regeu todas as grandes revoluções do século 18, lutando contra o poder absoluto dos reis e propondo novos ideais de liberdade – tanto os Inconfidentes quanto os jacobinos, certamente, leram Montesquieu.

Mas a Inconfidência teve sim um grande movimento que a influenciou: a Revolução Americana, que culminou na independência dos Estados Unidos em 1776. Tanto que Tiradentes andava com um exemplar da Constituição Americana debaixo do braço pelas ruas de Vila Rica (atual Ouro Preto).

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“A Inconfidência era coisa da maçonaria”

Talvez o seu professor de história do cursinho, que passou míseros 10 minutos explicando a Inconfidência, não tenha dito isso, mas esse é um “erro” recorrente em muitas aulas. Digo “erro”, entre aspas, porque é difícil fazer afirmações conclusivas sobre a atuação da maçonaria no movimento. Mas aqui também podemos usar a cronologia para esclarecer os fatos: a primeira loja maçônica documentada no Brasil, chamada de Cavaleiros da Luz, foi fundada entre 1795 e 1797, em Salvador. A Inconfidência ocorreu anos antes, em 1789. O único ponto para apoiar a teoria da influência maçônica no movimento de Tiradentes são livros que afirmam haver lojas em Minas antes da Cavaleiros da Luz – essas sedes da maçonaria seriam clandestinas, já que a organização não era aceita no Brasil.

Outra teoria diz que os intelectuais inconfidentes teriam sido iniciados maçons enquanto estavam foram do Brasil, em lojas francesas. Mas, ainda assim, não há provas disso. Uma  teoria conspiratória chega a afirmar que Tiradentes, supostamente maçom, não foi morto: a maçonaria o teria substituído por outra pessoa no dia do enforcamento, e ele teria fugido do País. Nesse caso, a mentira fica com pernas curtas de cara: Tiradentes era o único inconfidente que nunca tinha pisado fora do Brasil. Nem falava outras línguas, ou seja, certamente não havia sido iniciado em uma loja estrangeira.

Tiradentes parecia Jesus

Essa é clássica, mas é sempre bom reforçar que não tem nada de verdade: certamente, em todas as imagens que você viu de Tiradentes ele está barbudo, com cabelo comprido e uma expressão heroica no rosto, fazendo referência direta à imagem – também construída – de Cristo. Seu primeiro retrato oficial, uma litografia feita por Décio Villares, em 1890 – mais de 100 anos após a Inconfidência –, já mostrava isso.

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(Décio Villares/Domínio Público)

Outra imagem conhecida dele é o quadro de Pedro Américo, Tiradentes esquartejado, que transforma a base da forca em uma cruz e com a imagem de Jesus crucificado ao lado de sua cabeça. Esta, assim como outras obras históricas de Pedro Américo, foi minuciosamente pensada: o braço caído faz referência a obras heroicas clássicas como Pietà, de Michelangelo, ou A Morte de Marat, de Jacques-Louis David. Além disso,  as partes do corpo (perna estendida, tronco, braço e pé) formam a silhueta do mapa do Brasil, legitimando Tiradentes como um herói nacional:

(Pedro Américo/Domínio Público)

Relatos da época contam que Tiradentes era alto, magro e não muito bonito. Como alferes (o correspondente a tenente hoje), Joaquim José da Silva Xavier não podia usar cabelos nem barba longos – o máximo permitido era um bigodinho. Quando enforcado, no Rio de Janeiro, estava de barba feita e cabelo raspado.

 

Colaboração: Ciro de Moura Ramos, professor do Colégio Objetivo

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