Pela primeira vez, pesquisadores descobrem múmia egípcia grávida
Estudos baseados no corpo embalsamado podem ajudar cientistas a compreender os cuidados pré-natais do passado.
No século 19, uma múmia foi doada à Universidade de Varsóvia, na Polônia, e guardada no Museu Nacional da capital. Por muito tempo, pesquisadores acreditaram que aquele corpo pertencia a uma mulher, mas não foram feitos muitos estudos e a figura misteriosa foi deixada de lado. Um século depois, cientistas resolveram estudar o caixão e acabaram decifrando os escritos do sarcófago. Havia ali o nome de um homem, o provável falecido.
Agora, a incógnita foi esclarecida: estudos recentes envolvendo exames de imagem provaram que a múmia era de fato uma mulher, que em algum momento pode ter tido o caixão trocado. E ela não estava sozinha, mas com um feto na barriga, tornando-se a primeira múmia grávida já registrada por pesquisadores.
Em 2015, uma equipe de cientistas poloneses iniciou o Projeto Múmia de Varsóvia, que tinha como objetivo estudar corpos humanos e animais embalsamados que estivessem guardados no Museu Nacional de Varsóvia. Entre eles estava a grávida, que chamou atenção nas radiografias após apresentar uma anomalia na região da pelve – que nada mais era do que uma perna do feto. O estudo completo foi publicado no Journal of Archaeological Science.
De acordo com os pesquisadores, a moça teria entre 20 e 30 anos quando faleceu. Exames baseados na circunferência da cabeça do bebê sugerem que ela estava entre a 26ª e a 30ª semana de gestação. Os cientistas também estimaram a idade da múmia, que teria vivido em algum momento no século 1 a.C.
A múmia foi apelidada de “senhora misteriosa” devido a sua história ainda pouco compreendida. Ela foi entregue à Universidade de Varsóvia em 1826, sendo armazenada no Museu Nacional de Varsóvia. Na época, foi dito que o sarcófago havia sido retirado dos túmulos reais de Tebas, mas os cientistas não acreditam nisso. Isso porque, durante o século 19, era comum que as pessoas atribuíssem a origem de artefatos a locais famosos para aumentar seu valor.
Além disso, é comum encontrar corpos que não se encaixam nos caixões em que estão, provavelmente porque foram trocados de lugar por antigos traficantes de antiguidades. Isso parece ter acontecido com a “múmia misteriosa”, que teve os hieróglifos de seu caixão decifrados no século 20 e foi falsamente identificada. A grávida estava no sarcófago de Hor-Djehuty, um sacerdote egípcio. De toda forma, a moça parece ter tido sua importância. Os tecidos que envolvem seu corpo e o conjunto de amuletos que a acompanhavam sugerem uma mulher de alto status social.
O mistério não diz respeito apenas à origem dela; também envolve seu embalsamamento. Era comum que alguns órgãos do cadáver, como pulmões e fígados, fossem retirados e embalsamados separadamente, para depois serem devolvidos ao corpo. A grávida parece ter passado por esse ritual, mas ninguém encostou no feto. Os cientistas sugerem uma explicação física e outra religiosa para a falta de intervenção no útero.
Eles escrevem que a idade do feto pode ter dificultado sua retirada, já que nessa fase da gestação o útero se encontra mais espesso. Forçar a barra poderia danificar tanto o corpo da mãe quanto o de seu filho. A outra hipótese sugere que o feto foi visto como parte do corpo da mulher, já que ainda não havia nascido. De acordo com os pesquisadores, os egípcios podem ter acreditado que a vida após a morte do bebê só poderia acontecer se ele realizasse a passagem ainda no corpo de sua mãe.
Os estudos sobre a múmia não ajudarão apenas no entendimento de algumas crenças antigas relacionadas a gravidez, mas também na investigação dos cuidados pré-natais da época. Para ter mais respostas sobre a saúde da mulher e a causa de sua morte, os pesquisadores pretendem examinar pequenas amostras de sangue que foram preservadas nos tecidos moles da múmia. Os cientistas também esperam atrair com a descoberta pesquisadores de diversas áreas dispostos a estudarem a múmia, aprendendo juntos sobre antigos procedimentos médicos e desbravando a história da medicina.