Três curiosidades sobre a restauração de Notre-Dame
A catedral mais famosa do mundo abriu as portas esta semana, cinco anos após o incêndio de 2019. Saiba o que foi feito com as esculturas, o órgão e a coroa de espinhos de Cristo.
No fim da tarde do dia 15 de abril de 2019, um dos principais cartões-postais de Paris começou a queimar. A Catedral de Notre-Dame de Paris passava por pequenas obras de restauro quando o incêndio teve início. Embora a causa ainda não seja conhecida, presume-se que o acidente esteja relacionado à reforma.
Na época, o presidente Emmanuel Macron prometeu que a igreja seria reconstruída e reaberta ao público em apenas cinco anos. E de fato: cinco anos, sete meses, 22 dias e uma pandemia depois, Notre-Dame reabriu ao público no último sábado, 7 de dezembro.
A restauração da catedral envolveu o trabalho de duas mil pessoas, 250 empresas e U$900 milhões (R$5,5 bilhões) em doações. Abaixo, confira três curiosidades que você provavelmente não sabia sobre a reforma.
1. Esculturas haviam sido retiradas para restauração dias antes do incêndio
O telhado da catedral foi a região mais atingida pelo incêndio. Em especial, o pináculo (torre) que colapsou com as chamas. Ao redor dele ficavam esculturas em cobre dos doze apóstolos de Jesus. Elas estavam dispostas em quatro cantos da torre, em grupos de três. Na frente de cada grupo, havia estátuas de animais representando os quatro evangelistas. No total, 16 esculturas rodeavam o pináculo.
Nenhuma delas foi danificada no incêndio. Isso porque elas haviam sido retiradas da catedral para restauração dias antes do desastre. As estátuas estavam no workshop da empresa Socra, especializada na conservação de obras de arte. A coincidência acabou salvando as esculturas de serem consumidas pelo fogo.
2. O órgão foi afinado no silêncio da noite, ao longo de seis meses
O órgão de Notre-Dame é um dos maiores instrumentos musicais da França. Ele sobreviveu ao incêndio, mas seus 8 mil tubos e outros componentes musicais foram cobertos por fuligem. Ele teve que ser desmontado e retirado da catedral para limpeza e manutenção.
Poucas oficinas no mundo são qualificadas para renovar um órgão desse calibre. Após meses desmontando o órgão, suas peças foram enviadas em sigilo para três ateliers franceses.
Finalizada a limpeza, chegou a hora de montar e afinar o instrumento. Para isso, foi necessário silêncio absoluto – o que seria impossível de conseguir em meio à obra. A solução foi afinar o órgão de madrugada, depois que a barulheira havia terminado.
Os artesãos noturnos foram acompanhados de quatro organistas que trabalharam por anos tocando o instrumento da catedral gótica. Os ouvidos treinados identificaram os sons e timbres do órgão, garantindo que ele soasse da mesma forma que estava antes do incêndio.
Todo o processo demorou seis meses. A empreitada precisava ser feita dentro de Notre-Dame, já que o órgão é afinado de acordo com o ambiente acústico da catedral. O instrumento voltou a ser tocado na missa do dia 7 de dezembro.
3. Coroa de espinhos de Cristo foi transferida para o Hôtel de Ville
A coroa de espinhos presumivelmente usada por Jesus na crucificação ficava guardada em em Notre-Dame desde 1806. Os pedaços de madeira estão protegidos por um relicário transparente, que é exibido todos os anos ao público na Sexta-feira Santa, relembrando o dia da morte de Cristo na cruz.
No dia do incêndio, o padre e bombeiro Jean-Marc Fournier organizou o resgate das relíquias sagradas junto ao corpo de bombeiros de Paris. O capitão dos bombeiros Franck recebeu um mapa com a localização das relíquias dentro da catedral. Mas faltava a coroa de espinhos. “A ideia era que ela era tão preciosa que não queriam mostrar exatamente onde estava a coroa. Não constava em nenhum documento”, disse Franck no documentário Mistérios da Fé (2023).
Ele entrou na catedral e procurou pela coroa em meio ao incêndio. Ele encontrou algo que se parecia com a coroa de espinhos, e saiu em segurança. No entanto, era apenas uma réplica para exibição. A verdadeira permanecia em Notre-Dame, guardada em um cofre.
O gestor da catedral chegou ao local, mas o choque não o deixava explicar onde estava o cofre. Franck lembrava de ter visto uma caixa cinza, que parecia um transformador – e era lá que a coroa estava. O cofre só podia ser aberto com um código, que pouquíssimas pessoas conheciam. Após se acalmar, o gestor passou a senha e os bombeiros resgataram a coroa.
Durante a reforma de Notre-Dame, a relíquia ficou guardada na Salle Jean, uma câmara histórica dentro do Hôtel de Ville, a prefeitura de Paris. Agora, ela retornará a Notre-Dame e ficará guardada em um novo relicário projetado pelo arquiteto Sylvain Dubuisson.