A dança das águas
O mar inspira tranqüilidade, é certo. Mas nunca, nem mesmo nas profundezas, ele está parado.

Por Araci Queiroz
A vida nos oceanos é mais agitada do que na terra. A água espelha o balanço do mundo. Ondula livremente com o vento. Gira com a rotação do planeta, a atração da Lua e o calor do Sol. Até as diferenças de salinidade e de temperatura provocam movimento.
Os passos mais visíveis dessa dança são as ondas que quebram na praia. Mas, seja em alto-mar ou nas profundezas, nada fica parado no mesmo lugar. As correntes de superfície e as correntes submarinas carregam as águas dos pólos ao equador e do equador aos pólos, num eterno bailado. Enquanto isso, as marés marcam o ritmo do encontro com a terra.
Conheça aqui os principais passos desse espetáculo grandioso.
“Não precisa do destino fixo da terra, ele que, ao mesmo tempo, é o dançarino e sua dança.” Cecília Meireles (1901 – 1964)
Como o vento arrasta o mar até a praia
Elas vêm chegando de longe. De repente crescem, dobram e se quebram, espalhando um tapete de espuma sobre a areia. Na arrebentação, as ondas lançam sua força na praia. Na verdade, a energia pertence ao vento e não à água. No mar, ele encontra espaço para soprar continuamente.
O que a água faz é acolher e propagar o impulso que vem do ar (veja os infográficos ao lado).
Grandes tempestades no meio do oceano produzem os chamados swells, ondulações muito longas que alcançam até 600 metros de comprimento.
Os swells podem viajar milhares de quilômetros pelo mar e, conforme se propagam, vão ganhando velocidade. “Eles carregam uma grande quantidade de energia e acabam produzindo fortes arrebentações na praia”, explica Eloi Melo Filho, oceanógrafo da Universidade Federal de Santa Catarina.
Os “tubos” tão esperados pelos surfistas na Califórnia são swells formados do outro lado do mundo, perto da Nova Zelândia. As famosas ondas havaianas também vêm de longe. Nascem nas tempestades que ocorrem mais ao norte, no Pacífico.
Nas praias do Atlântico, as ondas costumam ter menos tempo de vida. Formadas nas imediações da costa por ventos fracos, elas são mais curtas. Produzem um efeito de arrebentação mais suave que o swell, o que não diminui a sua beleza. Mas quando surgem em tempestades ou frentes frias, as ondas do Atlântico também quebram com violência.
Receita de onda
Entenda como elas nascem, crescem e morrem.
Desliza
A onda se aproxima da costa e “sente” o fundo da praia aos poucos. As ondulações mais profundas são barradas progressivamente, enquanto a parte superior da onda mantêm a velocidade. Com isso, ela se curva e quebra suavemente, como nas praias de Sergipe (foto).
Rola
Em costas muito abruptas, as camadas de água do fundo freiam bruscamente, bem na beira da praia. A água da superfície rola sobre si mesma, formando um turbilhão. Boiçucanga (foto), em São Paulo, é uma praia que costuma apresentar esse tipo de onda.
Arrebenta
Em praias com inclinação média, a onda se choca contra o fundo gradualmente, mas sem perder a força. Como a praia ainda está distante, ela encontra espaço para lançar a crista para a frente, produzindo os “tubos” ideais para o surfe, como se pode ver em praias como a de Campeche (foto), em Santa Catarina.
O vai-e-vem da garrafa
Ao contrário do que parece, uma onda não carrega objetos.
Se você pular de um barco em alto-mar, não espere que as ondas o empurrem em alguma direção. Elas se deslocam como a ondulação de uma corda. Não carregam nem a própria água. Conforme a onda passa, as partículas se movem em círculos e voltam para o mesmo lugar em que estavam. Uma garrafa em alto-mar sobe e desce, mas quase não sai do lugar. Quando se move, é um deslocamento lento e aleatório. Na praia é diferente porque a onda se curva e quebra, criando seu próprio movimento.
O sopro inicial
É do ar que vem a força da onda.
O vento bate na superfície do mar, tensiona a água e provoca pequenas ondulações. Se ele continua soprando e criando pressão, as ondas ficam mais compridas e altas. Quando o vento pára, o efeito é uma ondulação regular que continua “caminhando” pelo mar.
A eterna ciranda do planeta
Um grande rio dentro do mar – foi assim que o capitão de um navio baleeiro inglês definiu a Corrente do Golfo, no século XVIII. As embarcações que cruzavam o Atlântico Norte em direção à América demoravam para chegar ao seu destino porque encontravam um enorme cinturão de água se movendo em sentido contrário.
Hoje as correntes de superfície já são conhecidas (veja mapa ao lado). Impulsionadas pelo vento, pelo calor do sol e pela rotação da Terra, elas cruzam os mares em grandes giros. No hemisfério Norte, deslocam-se em sentido horário. No hemisfério Sul, em sentido contrário. Algumas têm mais de 80 quilômetros de largura e viajam até 200 quilômetros por dia.
Enquanto isso, nas profundezas, outro tipo de corrente repõe a água deslocada na superfície. São as correntes submarinas, que se movimentam de acordo com a diferença de densidade e de temperatura das águas.
Termômetro global
Correntes marítimas regulam a temperatura da Terra.
Imagine se o mar não se movesse e todo o calor do sol se acumulasse em torno da linha do equador. Os verões tropicais seriam insuportavelmente quentes. E o inverno nos pólos, muito mais gelado. As correntes marítimas garantem o equilíbrio climático da Terra. Elas carregam a energia solar concentrada nas águas do equador até as latitudes em que o sol incide com menos intensidade. Muitas delas têm influência direta também sobre o clima regional. A corrente quente do Golfo proporciona temperaturas mais amenas ao inverno inglês. A de Humboldt incide sobre a costa oeste da América do Sul, trazendo águas frias e ricas em plâncton. Por causa dela, as praias chilenas e peruanas são ruins para o banho, mas ótimas para a pesca.
O poder dos astros
Saiba como a Lua e o Sol alteram o nível dos mares.
A Lua é a rainha das marés. Enquanto gira em volta da Terra, vai atraindo as águas e fazendo o oceano subir e descer. O Sol é 26 milhões de vezes maior do que ela, mas está 400 vezes mais afastado e tem apenas a metade da sua influência. O ciclo das marés coincide com o ciclo da Lua. Como a Terra roda em torno de si mesma, a cada momento uma metade está voltada para o satélite. Por causa disso, os mares sobem e descem todos os dias, a cada seis horas. Há também um outro ciclo, de 29 dias. Nesse ciclo alternam-se períodos em que existe uma grande diferença entre a maré alta e a maré baixa, no mesmo dia, e períodos em que essa variação é menos acentuada.
1 – Quarto Crescente
A Lua e o Sol formam um ângulo reto em relação à Terra. A atração gravitacional do Sol compensa parcialmente a força da Lua. Resultado: a diferença de nível entre a maré alta e a baixa é pouco acentuada
2 – Lua Cheia
O Sol e a Lua estão alinhados com a Terra, um de cada lado. As águas são atraídas em sentidos opostos, gerando uma grande diferença entre as marés
3 – Quarto Minguante
A Lua e o Sol voltam a formar um ângulo reto em relação à Terra. Como no quarto crescente, há pouca variação entre as marés.
4 – Lua Nova
O Sol e a Lua estão novamente alinhados com a Terra. Desta vez, os doia astros atraem as águas no mesmo sentido. Mas a rotação da Terra faz com que os mares do lado oposto também subam. A diferença entre as marés é grande