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Pela primeira vez, poluição do ar é apontada como causa de morte

O parecer judicial veio após uma série de análises que relacionavam os ataques asmáticos de uma menina de nove anos aos picos de poluição na região em que ela vivia em Londres. Entenda.

Por Carolina Fioratti
Atualizado em 17 dez 2020, 18h34 - Publicado em 17 dez 2020, 18h28

As mortes decorrentes de complicações respiratórias costumam ser atribuídas a vírus, bactérias ou simplesmente a outros problemas pré-existentes. A poluição do ar, apesar de tida como um agravante, nunca havia sido decretada como causa de um óbito. A história mudou nesta quarta-feira (16), quando o tribunal britânico Southwark Coroner’s Court decretou que Ella Adoo-Kissi-Debrah, uma londrina de nove anos, faleceu em 2013 devido a poluição do ar. 

Em 2010, quando tinha apenas seis anos de idade, Ella acabou contraindo uma infecção grave no peito, que resultou em três dias de coma induzido até que sua condição fosse estabilizada. Depois disso, os problemas não pararam mais. Nos três anos seguintes, a menina foi levada ao hospital 27 vezes, apresentando quadros asmáticos severos. O mesmo aconteceu no dia 14 de fevereiro de 2013, mas Ella não resistiu e faleceu nas primeiras horas do dia seguinte. 

O primeiro inquérito judicial sobre a morte da criança saiu em 2014, alegando síndrome respiratória aguda. O caso parecia fechado, e a mãe de Ella, Kissi-Debrah, abriu uma instituição de caridade chamada Ella Roberta Family Foundation para auxiliar outras famílias que vivem com crianças asmáticas. Com isso, a história da menina ganhou visibilidade e chamou a atenção de cientistas. 

Em 2018, Stephen Holgate, pesquisador do Conselho de Pesquisa Médica do Reino Unido, entrou em contato com Kissi-Debrah para mostrar a relação entre a poluição do local em que a família vivia e os ataques asmáticos da menina. Eles moravam a apenas 25 metros da South Circular Road, uma das principais avenidas de Londres, onde os níveis de emissão de dióxido de nitrogênio (NO2) e outros materiais particulados, como pedacinhos do motor de carro que se soltam na forma de poeira metálica, excedem constantemente o limite permitido pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

Holgate havia traçado um padrão sazonal, mostrando que as crises de Ella acompanhavam os períodos em que os níveis de poluição eram maiores. Isso fez com que o inquérito de 2014 fosse cancelado, dando início a um novo. Dessa vez, o legista Philip Barlow considerou os fatos e concluiu que Ella “morreu de asma, causada pela exposição à poluição excessiva do ar”.

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Kissi-Debrah chegou a afirmar que, caso tivesse recebido informações de que a poluição estava prejudicando a saúde de sua filha, teria se mudado imediatamente. Holgate chegou a citar em seu relatório um caso parecido na França, em que uma mãe se mudou com a filha por aconselhamento médico, o que melhorou consideravelmente o quadro da criança. A mulher chegou a processar o governo francês, alegando os impactos na saúde causados pela poluição da região em que morava. Ao final, ela ganhou o caso.

De acordo com a OMS, a poluição do ar mata cerca de sete milhões de pessoas por ano. Ela é relacionada a casos de Acidente Vascular Cerebral (AVC), doenças cardíacas, pulmonares, câncer de pulmão e infecções respiratórias agudas, entre outras complicações.

A OMS explica que os países mais expostos à poluição são aqueles de baixa e média renda. Por outro lado, famílias carentes que vivem em países desenvolvidos, como foi o caso de Ella, também são mais afetadas do que aquelas que possuem melhores condições. Jonathan Grigg, professor de respiração pediátrica e medicina ambiental na Queen Mary University London, disse ao The New York Times que “muitas áreas de Londres, com maior população de famílias carentes, são atravessadas por estradas principais”, indicando que “a poluição do ar está gerando desigualdade na saúde”.

Ativistas ambientais solicitaram uma ação emergencial para a situação. Além deles, Sarah Woolnough, executiva-chefe da Asthma UK e da British Lung Foundation, também pediu ao governo que fosse apresentado um plano de saúde pública para proteção imediata contra o ar tóxico. Frente ao veredito dado na quarta-feira, um porta-voz do governo britânico disse que as autoridades já estão entrando com um plano de 3,8 bilhões de libras (R$ 26,1 bilhões) para combater a poluição por NO2 e proteger a comunidade da poluição do ar.

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