Ciência e saberes ancestrais se unem para restaurar a Mata Atlântica
Nove anos após rompimento da barragem de Fundão da Samarco, em Mariana (MG), são vários avanços em ações de reflorestamento e recuperação da Bacia do Rio Doce

A restauração de ecossistemas é uma meta global, estabelecida pelo programa da Organização das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) e pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO). A campanha global valoriza todos os esforços possíveis capazes de recuperar ambientes naturais, com benefícios amplos, tanto para a humanidade quanto para os ecossistemas.
E foi neste contexto que ganhou escala o trabalho da Rede de Sementes e Mudas da Bacia do Rio Doce, comprometida a ampliar a cobertura florestal da Mata Atlântica, com ações em pesquisa e tecnologia que levam inovação para a produção de sementes florestais nativas.
A iniciativa até então foi conduzida pela Fundação Renova, criada após o rompimento da barragem de Fundão, em Mariana (MG), em 2015. Desde o rompimento, R$ 38 bilhões foram destinados em diversos programas de reparação e compensação, incluindo a indenização para cerca de 430 mil pessoas.
A partir da assinatura do Novo Acordo da Bacia do Rio Doce em outubro de 2024, que envolve recursos de R$ 170 bilhões, a Samarco, mineradora responsável pela barragem de Fundão, com o apoio de suas acionistas Vale e BHP Brasil, passa a conduzir esta iniciativa, além da entrega de uma série de outras ações.
As ações de reflorestamento têm como objetivo alcançar a reabilitação ambiental da Bacia do Rio Doce. Até o momento, foram destinados R$ 11,6 milhões para produtores rurais na bacia do Rio Doce recuperarem áreas de proteção permanente em suas propriedades. Além de outros R$ 10 milhões na aquisição de sementes. Além disso, com o Novo Acordo, estão previstos mais R$ 16,13 bilhões em ações para o meio ambiente.
Comunidades indígenas e quilombolas
“Temos 54 mil hectares para reabilitar, com o suporte da rede, que disponibiliza mudas e sementes, em alinhamento com o programa da ONU sobre a década da Restauração de Ecossistemas. Esta é uma ação ambiental, mas também social, que leva uma nova oportunidade de renda para pequenos produtores e para comunidades indígenas e quilombolas, muitas delas lideradas por mulheres”, explica o engenheiro florestal Antônio Sergio Cardoso Filho, coordenador da iniciativa.
Para garantir o sucesso do trabalho, os produtores recebem capacitação anual. “São 51 núcleos em toda a Bacia do Rio Doce, que já ultrapassaram a marca de 80 toneladas de sementes coletadas, de cerca de 350 espécies florestais nativas da Mata Atlântica”, complementa a engenheira florestal Flavia Osório José, que atua no projeto há dois anos.
“O objetivo é que a rede de coleta se torne independente da Fundação Renova e da Samarco e possa participar de outros projetos de restauração, de maneira que os produtores se tornem especializados em um mercado que está em expansão. Eles já mudaram sua relação com o entorno, já passaram a enxergar com maior clareza as vantagens de manter a floresta em pé”, descreve a agrônoma Monique Alves, que chegou à Rede de Sementes e Mudas em 2022.
A base teórica da iniciativa é fruto de uma parceria entre a Fundação Renova e o Centro de Pesquisas Ambientais do Nordeste (Cepan), com a colaboração da Associação Rede de Sementes do Xingu (ARSX) e da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Os pesquisadores oferecem suporte técnico e científico, enquanto as comunidades locais complementam as orientações técnicas com conhecimentos locais, transmitidos por gerações.
Avanço para a ciência
As mudas são produzidas em 11 viveiros familiares, sendo nove em Minas Gerais e dois no Espírito Santo. “Temos capacidade para produzir 13 milhões de mudas por ano”, informa a engenheira florestal Ana Caroline de Oliveira Herculano, que atua no projeto há dois anos e meio.
A experiência também traz benefícios para a pesquisa na área. “O controle de qualidade começa no campo e passa pela Casa das Sementes, onde elas são armazenadas, e por um laboratório onde elas são avaliadas em sua qualidade, do ponto de vista genético, físico, fisiológico e sanitário”, diz Kamila Antunes Alves, engenheira agrônoma e supervisora do laboratório da análise de sementes da rede, que fica em Linhares (ES).
“A maior parte dos dados que geramos são inéditos, sem nenhuma referência anterior na literatura científica. Estamos produzindo conhecimento para todo o setor de reflorestamento”.
