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Caçadores de explosão

Cientistas intensificam a busca de detonações estelares que podem confirmar se as galáxias estão mesmo se afastando cada vez mais depressa. Eles acham que o Cosmo está em expansão e que o fim do mundo nunca acontecerá.

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h39 - Publicado em 29 fev 2000, 22h00

Cássio Leite Vieira, do Rio de Janeiro

Supernovas são catástrofes inimagináveis. Depois de queimar em reações nucleares todo o hidrogênio de que são feitas, as maiores estrelas torram os últimos restos do gás e explodem num clarão que, por duas ou três semanas, ofusca uma galáxia inteira. O brilho é maior do que o de 200 bilhões de astros reunidos.

O espetáculo é raríssimo. Em cada uma das 100 bilhões de galáxias existentes, aparece apenas uma supernova a cada 300 anos. Apesar disso, equipes de elite da Astrofísica mundial gastam todas suas noites numa perseguição implacável a essas explosões. Armados das melhores câmeras e dos melhores telescópios do planeta, eles esmiúçam esses faróis cósmicos em busca de segredos sobre a evolução do Universo.

A pesquisa iniciada em 1995 já fotografou e estudou mais de 200 estouros, chegando a uma conclusão surpreendente no final de 1997. Revelou que o Universo está em expansão acelerada – não apenas está ficando maior, como se sabia desde os anos 40, como vem crescendo cada vez mais depressa. Se essa descoberta for comprovada, será uma das maiores da ciência. Ela significa que nunca haverá o fim do mundo.

Há dois anos, a SUPER deu a notícia em primeira mão no Brasil (veja SUPERINTERESSANTE número 6, ano 12). Agora, decidimos voltar ao assunto para saber o que ocorreu de lá para cá. “A meta do projeto é descartar qualquer possibilidade de erro nas observações anteriores”, disse à SUPER o astrônomo americano Craig Hogan, da Universidade de Washington, nos Estados Unidos, membro de um dos times de investigadores, conhecido, em inglês, pelo nome de High-Z. Como a outra equipe, batizada de Projeto Supernova, a High-Z é composta de vinte craques de várias universidades e nacionalidades.

Nesta reportagem, você vai ver como trabalha a rede de telescópios que esses cientistas montaram animados por uma idéia fixa: vasculhar milhões de galáxias atrás daquelas que, num átimo, iluminam o céu com a fulguração excepcional de uma estrela agonizante.

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Um cerco vigilante às galáxias

As detonações estelares chamadas de supernovas são uma valiosíssima fonte de informações sobre o Universo, porque são visíveis mesmo quando espocam muito longe da Terra. Para detectá-las, montou-se uma operação de busca sem precedentes. Só observando ao mesmo tempo milhares de galáxias os pesquisadores podem ter certeza de que, em algumas delas, bem na hora da fotografia telescópica, quase sempre haverá uma estrela explodindo.

Trata-se de uma corrida contra o tempo. Para tanto, o telescópio Blanco, do Observatório Interamericano de Cerro Tololo, nos Andes chilenos, tira fotos, durante dias, como uma metralhadora. “Ele bate chapas de 10 em 10 minutos. Cada uma delas grava a imagem de até 5 000 galáxias por vez”, explica à SUPER um dos coordenadores, o astrofísico americano Robert Schommer. “Nesse ritmo, detectamos até uma candidata a supernova por hora.”

Como o Blanco não é capaz de analisar o flagrante de maneira inequívoca, todas as imagens processadas são enviadas para um computador que, por sua vez, está conectado ao telescópio Keck, no Havaí, o mais potente do mundo. Por satélite, o Keck recebe as coordenadas da galáxia fotografada pelo Blanco e, em apenas 1 hora, aponta suas lentes para ela. Uma vez captada, a detonação pode ser examinada com rigor. Cada segundo importa, pois o brilho da supernova dura apenas uns vinte dias. “Sem o Keck nada seria feito. Ele é vital”, diz o astrofísico americano Nicholas Suntzeff, também do Observatório de Cerro Tololo.

Prova dos noves

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Aí, então, entra o telescópio Hubble, que está no espaço. Acionado do Havaí, o Hubble toma uma imagem da explosão enquanto ela está se processando. Um ano mais tarde, toma outra, da galáxia, depois que o brilho desapareceu. A diferença na luminescência permite aumentar a acuidade da observação. Assim, nos últimos dois anos os pesquisadores conseguiram registrar e analisar catorze supernovas. Fresquinhas.

A descoberta ainda espera confirmação

Poucos duvidam, atualmente, de que o Universo está mesmo em expansão acelerada. Todos os cuidados foram tomados para eliminar erros de observação. Dezenas de especialistas já avaliaram os dados sem achar defeito nenhum. Das 200 supernovas encontradas até agora, pelo menos metade foi descartada por não corresponder ao rigoroso controle de qualidade de imagem criado com o objetivo de afastar enganos. Mesmo assim, a descoberta é tão chocante que os pesquisadores continuam a busca tentando achar falhas ou uma explicação alternativa.

“Os resultados são muito sugestivos e interessantes”, diz à SUPER o físico Lawrence Krauss, da Universidade Case Western Reserve, no Estado americano de Ohio. “Mas não são de modo nenhum conclusivos”, alerta. A principal causa de todo esse cuidado é uma pergunta intrigante: que tipo de força poderia estar empurrando as galáxias para longe umas das outras? Krauss imagina que os empurrões misteriosos poderiam vir do próprio vácuo, onde existiria uma forma de antigravidade, batizada por ele de quintessência. Só que sua teoria não dá indicação de como medir essa energia. Ela permanece apenas como uma sugestão. Não chega a ser uma resposta.

Quebra-cabeça teórico

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“A natureza dessa energia exótica é um mistério”, confirma à SUPER o físico e matemático americano Alan Guth, do Instituto de Tecnologia de Massachusetts. Por isso a pesquisa continua. Em resumo: se os teóricos não conseguem resolver o quebra-cabeça, cabe à própria equipe que o descobriu encontrar mais pistas que ajudem na solução.

Além disso, há uma variável perturbadora. Existe pelo menos um tipo de erro que ainda não foi suficientemente estudado. Ocorre que os astrônomos avaliam a aceleração do Universo medindo o brilho das supernovas. Eles consideram que as mais distantes devem aparecer mais fracas aqui na Terra, mas não tão apagadas como verificaram durante as suas observações. Deduzem, assim, que a luz enfraqueceu porque o Universo cresceu além do que se calculava durante os 13 bilhões de anos de sua existência. Ou seja, ele se acelerou.

Esse raciocínio parece impecável, mas só vale se as estrelas sempre produzirem a mesma luminescência ao estourar. Caso contrário, as mais afastadas podem estar mais pálidas porque reluzem mesmo com menor intensidade. Será, então, que pode haver supernovas diferentes das que conhecemos? É possível, admitem os astrônomos. Eles insistem em que se trata de uma hipótese muito pouco provável. Mas não custa checá-la.

Diversos grupos de pesquisa estão empenhados nisso. Inclusive as equipes caçadoras de explosões. “Estamos passando a limpo todas as propriedades das supernovas que estudamos”, afirma Nicholas Suntzeff, do Observatório Interamericano de Cerro Tololo. Essa revisão pode até ofuscar o brilho da descoberta de 1997. Mas o líder da equipe High-Z, o astrofísico Brian Schmidt, do Observatório de Monte Stromlo, na Austrália, não acredita que a caça às explosões vai perder o esplendor. “Eu sou um dos mais céticos”, confessou ele à SUPER. “Mas nossos dados parecem capazes de resistir a todas as provas.”

Algo mais

A expressão inglesa High-Z significa Z elevado. A letra Z, em Astrofísica, dá uma medida da distância e da velocidade dos astros. Se um objeto celeste tem o Z muito alto, é porque se encontra muito longe e está se distanciando em alta velocidade. Justamente o que acontece com as galáxias estudadas nessa pesquisa.

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Energia pura

Quando uma grande estrela se estilhaça, ela brilha mais do que toda a galáxia em que está. A energia liberada neste momento é equivalente à de uma bomba nuclear de 10 000 000 000 000 000 000 000 000 000 megatons

Agulha no palheiro

Como os astrofísicos vasculham o Cosmo para captar supernovas, as explosões estelares.

1. Flagrante

Na primeira etapa, o telescópio Blanco monta um cerco às supernovas. Como elas só acontecem uma vez a cada 300 anos em cada galáxia, ele precisa fotografar milhões de galáxias para flagrar um estouro. Cada chapa batida grava a imagem de 5 000 galáxias.

O telescópio Blanco, do Observatório Interamericano de Cerro Tololo, no Chile, capta luz com um espelho de 4 metros de diâmetro

2. Galáxias aos montes

Um mês depois, o Blanco examina as mesmas regiões do céu. Se alguma galáxia estiver mais brilhante, a causa pode ser o advento de uma supernova, uma grande explosão estelar.

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3. Estouro confirmado

O segundo passo cabe ao telescópio Keck, o mais potente do mundo. Acionado dos Andes, por satélite, ele foca as lentes e confirma se o brilho é de uma supernova. Outros telescópios no Chile, na Austrália, na Europa e nos Estados Unidos também dão apoio nessa tarefa.

O telescópio Keck, no Havaí, possui espelhos de aumento de 10 metros de diâmetro e a visão mais aguçada da Astronomia

4. Checagem orbital

Por último, o telescópio espacial Hubble fotografa a galáxia duas vezes. Uma na hora da explosão e outra um ano mais tarde, quando o brilho extra já sumiu. A comparação mostra a intensidade da catástrofe com mais nitidez.

Quando o brilho indica distância

Entenda como as explosões estelares revelam que o Universo está em expansão acelerada.

1. Você sabe que, quanto mais longe uma lâmpada está, mais fraca é a sua luz. Com as detonações cósmicas acontece algo parecido, pois todas elas têm o mesmo brilho, independentemente do tamanho do astro. As que parecem mais fracas estão mais distantes.

2. Assim, se o carro 1 passa por um guarda a 60 quilômetros por hora, ao fim de 1 minuto ele está a 1 quilômetro e o brilho da sua lanterna traseira diminui. Imagine agora que o carro 2 passa logo depois do primeiro, à mesma velocidade, mas o guarda observa, com nitidez, que a sua lanterna brilha muito menos que a do primeiro veículo. Só pode ser porque, depois de passar pelo guarda, o segundo carro acelerou, avançando mais que o primeiro.

3. O mesmo se observa com os estouros das estrelas. Os cientistas verificaram que os mais distantes estão mais fracos do que deveriam estar. Daí, deduziram que, ao longo dos seus 13 bilhões de anos, o Universo acelerou a sua expansão, ampliando a distância entre as galáxias.

Força desconhecida

A gravidade está perdendo o jogo para a expansão.

O Cosmo pode ser comparado a um balão sobre o qual ficam as galáxias. À medida que ele se expande, elas se afastam umas das outras. Só que, com o tempo, ele deveria perder o impulso de crescimento, porque a gravidade tende a atrair as galáxias entre si.

Como isso não está acontecendo, segundo as observações recentes, então deve haver uma força ainda desconhecida se contrapondo à atração gravitacional. Os teóricos que examinam essa possibilidade não descobriram até agora uma explicação aceitável.

Para saber mais

Hiperespaço, Michio Kaku, Editora Rocco, Rio de Janeiro, 2000.

Corações Solitários do Cosmo, Dennis Overbye, Editora Mercuryo, São Paulo, 1993.

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