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Modelitos celestiais

Trinta anos de alta-costura espacial não deixaram os astronautas elegantes. Mas pelo menos eles já sabem exatamente o que usar em Marte.

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h34 - Publicado em 31 mar 1999, 22h00

Thereza Venturoli e Ivani Vassoler, de Washington

Fui caminhar. O ar fesco era agradável. Voltei para casa são e salvo. Amor e saudade. Papai.” Quando o americano Jerry Linenger escreveu essa mensagem telegráfica ao filho, em seu diário, em abril de 1997, não estava falando de um passeio qualquer. A caminhada à qual ele se referia aconteceu 300 quilômetros acima da superfície terrestre. A casa era a estação espacial Mir. E a brisa ligeira, imagine, vinha do sistema de ventilação do seu macacão pressurizado. Há dois anos, Linenger passou 132 dias a bordo da estação russa e fez várias excursões no espaço exterior. Sempre voltou ileso, graças a esse sofisticado e compacto equipamento de sobrevivência: o traje espacial.

Tudo bem. O modelito para passeios no vácuo não tem caimento perfeito. Nem corte que valorize as curvas do corpo. Porém, em termos de tecnologia, é uma pequena maravilha aperfeiçoada ao longo das últimas três décadas. Tem muito pouco a ver com a roupa usada por Neil Armstrong para desfilar na Lua pela primeira vez, em 1969 – a não ser pelo desconforto, que continua a gerar muitas queixas. “A gente volta dos passeios no espaço banhado de suor”, disse à SUPER o astronauta Jerry Ross, que ajudou a instalar o primeiro módulo da Estação Espacial Internacional na órbita da Terra, em dezembro de 1998. “A pele chega a ficar esfolada pelo atrito com o uniforme.” Com a experiência de quem já fez sete passeios no céu e passou 44 horas e 9 minutos fora das naves, Ross garante: “Passar 8 ou 9 horas embrulhado naquele uniforme não é nada fácil”.

Agora, a moda espacial vai mudar. A Nasa está testando vários protótipos desenhados para as futuras viagens a Marte. Um dos mais cotados é o modelo M, da empresa ILC Dover (veja ao lado). Além de proteger o homem no ambiente inóspito, a nova coleção celestial promete aproveitar a tecnologia acumulada em trinta anos para produzir um guarda-roupa mais confortável e adequado à aridez das planícies e montanhas marcianas. Quem sabe, até bonitinho.

Lua, 1969

O traje das missões Apolo, nos anos 60 e 70, tinha juntas de borracha embutidas para facilitar o movimento dos joelhos, cotovelos e quadris. Era feito sob medida e durava quatro anos.

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EM órbita, 1999

A roupa dos tripulantes dos ônibus espaciais têm mangas, luvas e as partes de cima e de baixo encaixadas. Com isso, a mobilidade melhorou. Novos tecidos e fibras ultraleves e super-resistentes aumentaram a durabilidade para oito anos.

Marte, 2014

O primeiro traje humano a pisar em outro planeta será muito mais leve do que os atuais. Mas terá de oferecer proteção contra as fortes tempestades de areia do planeta, que podem desgastar o tecido e deixar o astronauta vulnerável.

Um trambolho pelo menos mais flexível

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Uma roupa espacial custa os tubos. O traje completo chega a 12 milhões de dólares. Só não vale mais porque hoje são fabricadas peças unissex e modulares, em série. “Só as luvas continuam feitas sob medida”, disse à SUPER Frank Mossman, diretor da empresa ILC. As demais partes já vêm em tamanhos-padrão.

A criação de novos tecidos sintéticos ultra-resistentes e superleves aliviaram o fardo carregado pelos astronautas. A fibra Kevlar, usada na superfície externa do uniforme, torna impossível rasgar o macacão. Um quilo do produto é quatro vezes mais resistente que 1 quilo de aço. “Com isso, praticamente dobramos a durabilidade do traje e ganhamos maior flexibilidade”, comenta Phillip Spampinato, gerente da ILC.

Flexibilidade é o que os rapazes de Marte vão precisar. “Nos ônibus espaciais, o trabalho é feito em gravidade zero e exige muito mais dos braços do que das pernas”, diz Spampinato. “Quem explorar o planeta vai ter de caminhar, dirigir veículos, escalar montanhas e realizar pesquisas geológicas sob uma força gravitacional 2,5 vezes maior que a da Lua.” Para se ter uma idéia do que isso significa, o traje atual, que na superfície terrestre pesa quase 130 quilos, não é sentido na órbita da Terra; na Lua, pesa 19 quilos; em Marte, chegaria a quase 50 quilos.

E o conforto? Bem, esse é o ponto fraco. O macacão pressurizado é mesmo um trambolho. Os designers espaciais prometem que tudo vai melhorar. Mas os astronautas não se iludem. Jerry Ross, que encara seu trabalho com valentia, resigna-se: “Levando em conta que o traje proporciona tudo o que você precisa, estar dentro dele até que não é tão ruim assim.” Claro, nada como uma carapaça no espaço.

Para saber mais

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Na Internet: quest.arc.nasa.gov/space/teachers/suited

Um brasileiro com macacão inflável

Nem todos os viajantes do Cosmo vestem o traje espacial. Quem não desce da nave usa só um macacão protetor para uma eventual despressurização da nave, na subida e na descida. A roupa também evita os efeitos da aceleração sobre a circulação sanguínea. ”O revestimento interno é feito de câmaras de ar que comprimem o corpo, ajudando o coração a bombear sangue para a cabeça”, explicou à SUPER o astronauta brasileiro Marcos Cesar Pontes, que está na Nasa há quase um ano. “Sem isso, durante a aceleração o sangue não chegaria ao cérebro e o viajante perderia a consciência.”

Para embarcar, em 2003, na Estação Espacial Internacional, que vai ficar em órbita da Terra a 400 quilômetros de altitude, o major-aviador da Força Aérea Brasileira passa os dias malhando em simuladores de vôo e treinamentos de sobrevivência. Uma rotina nada monótona que confirma que o hábito não faz o monge. É preciso muito mais que um uniforme para ser astronauta.

Sina de caramujo

Como o molusco com a casa nas costas, o astronauta carrega tudo o que é preciso para sobreviver.

Sanduíche de gente

O tecido externo é feito de fibras sintéticas que não pegam fogo e que impedem o macacão de se rasgar. Abaixo dele, há treze camadas de proteção contra violentas variações de temperatura, falta de pressão e eventuais choques com micrometeoritos.

Sempre seco

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Na hora do xixi, não tem aperto. Eles usam um fraldão, com um gel especial, superabsorvente, para reter a urina. E fazem na calça.

Usina portátil

Aqui fica o centro nervoso do uniforme: baterias, sistemas de alarme e de comunicação, tanques de oxigênio, filtros para purificação do ar e rádio para comunicação com a nave, tudo junto. Os equipamentos são acionados por um painel no peito.

Ceroulão climatizado

Por baixo do macacão, os astronautas usam uma espécie de malha, parecida com os tip-tops infantis, só que percorrida por tubos cheios de água fria. É a chamada vestimenta de refrigeração e ventilação. A circulação do líquido equilibra a temperatura do corpo. Exaustores retiram o suor e o gás carbônico tóxico exalado na respiração.

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Capuz e óculos escuros

O visor é recoberto por uma camada de ouro. O metal deixa passar a luz visível, mas barra a radiação ultravioleta lançada pelo Sol.

Tudo à mão

Para garantir mobilidade, as luvas são desenhadas considerando-se várias posições das mãos. Na manga, uma caderneta traz anotações sobre as tarefas a serem executadas durante as missões externas.

Queimada geral

Lá em cima – longe da atmosfera e dos oceanos que refletem parte da energia solar de volta ao espaço – os raios ultravioleta do Sol oferecem mais risco de causar mutações genéticas e, daí, tumores.

Lixo orbital

Pequenos grãos e restos de cometas e de asteróides perambulam pela órbita terrestre a mais de 100 000 quilômetros por hora. Sem a “blindagem” protetora do macacão, os astronautas poderiam ser feridos por esses estilhaços.

Operação entra-e-sai

Um astronauta não veste um traje de passeio espacial. Entra nele. Primeiro, salta para dentro das “calças”, presas à parede da nave. Depois, enfia-se na “camisa”, põe as luvas e, por fim, o capacete. A operação demora cerca de meia hora. Além de alinhar perfeitamente a parte de cima à de baixo, é preciso checar os equipamentos de comunicação e ventilação.

Pressão zero

No espaço não existe praticamente gás nenhum. É vácuo. O traje funciona como uma bolsa de ar inflado que reproduz lá dentro a pressão atmosférica. Sem isso, o organismo entraria em colapso. A pele se esticaria e o corpo acabaria explodindo como balão de aniversário.

Do forno ao freezer

O ônibus espacial passa 45 minutos sobre a face da Terra iluminada pelo Sol e 45 no lado escuro, onde é noite. As variações de temperatura são absurdas. Na área ensolarada, ela chega a 120 graus Celsius. Na sombra feita pela Terra, a 100 graus negativos.

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