Nova maneira de ver buracos negros
Astrônoma gaúcha descobre uma prova convincente de que esses astros exóticos existem mesmo. Não são apenas teoria.
João Steiner
Os buracos negros, que são os astros mais densos existentes, aparecem na natureza em duas categorias. Os menores têm massa entre três e dez vezes a massa do Sol e os maiores variam de 1 milhão a 1 bilhão de vezes a massa solar. Isso é o que dizem os especialistas, mas é um desafio conseguir provas concretas porque esses estranhos objetos não emitem luz. Por terem massa tão grande e tão concentrada, eles geram imensa força gravitacional, que é capaz de aprisionar até a luz que fosse emitida por sua superfície.
Mas há um meio de detectar a presença de um deles. É que, se houver gás nas vizinhanças, ele será atraído com violência para o astro escuro e, ao precipitar-se em sua direção, formando espirais em alta velocidade, se aquece e emite luz. Essa luz consegue escapar à gravidade porque é emitida antes que o gás alcance os limites do buraco.
Com isso abre-se uma possibilidade interessante: será que essa luz não teria características peculiares, isto é, que só aparecessem no brilho desses gases aquecidos? A vantagem é que, se essas características existirem, elas servirão como meio de identificar os buracos negros. Uma espécie de impressão digital desses astros.
Foi exatamente isso que Thaísa Storchi-Bergmann, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, descobriu no centro de uma galáxia chamada NGC 1097. Ao analisar certos feixes de luz vindos de lá, a astrônoma gaúcha percebeu que eles eram emitidos pelo gás hidrogênio, que é o elemento químico mais comum do Universo, e também achado nas vizinhanças dos buraco negros. Neste último caso, o estudo mostra que o hidrogênio gira numa órbita oval, com a forma de uma elipse.
E o mais interessante é que essa elipse também vai mudando de lugar, ao longo dos anos. É como se fosse uma pista de Fórmula 1 giratória. Se algo assim existisse, os carros dariam voltas pela pista e, ao mesmo tempo, a pista daria voltas em torno de si mesma. Seguindo essa analogia, o gás gira em torno do buraco negro numa órbita que também circula o astro.
Há dois anos, Thaísa previu esse movimento do hidrogênio a partir do estudo da luz emitida por ele. De lá para cá, ela entrou em campo e passou a observar o núcleo da NGC 1097 até demonstrar que suas conclusões estavam corretas.
Esse tipo de acontecimento é comum em ciência. Descobre-se alguma coisa, consegue-se uma boa explicação e, com base nisso, faz-se uma previsão. Se ela, em seguida, não puder ser confirmada, a explicação precisa ser revista. Mas, se houver confirmação, a credibilidade da explicação aumenta tremendamente. Nesse caso, a idéia de que a NGC 1097 tem um buraco negro em seu centro ficou muito forte. Na opinião deste articulista, trata-se de uma das evidências mais claras sobre a existência desses astros na natureza.
Professor de Astrofísica do Instituto Astronômico e Geofísico da USP