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A bactéria mais comum dos oceanos tem seu DNA hackeado por um vírus

1 em cada 4 criaturinhas microscópicas nos oceanos é uma bactéria SAR11. O segredo do sucesso é que um vírus acelera a seleção natural entre elas.

Por Bruno Vaiano Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
13 jun 2020, 16h57

Imagine o número 24. Agora adicione 27 zeros. Fica assim: 24000000000000000000000000000. Pedi ao repórter da SUPER Guilherme Eler que desse um nome a esse número. Ele o batizou de “Jairo”, rs.

Jairo é um número ofensivo de tão grande. O número de segundos que se passaram desde o Big Bang, há 13,8 bilhões de anos, é 43 seguido de 16 zeros. São mais de dez zeros a menos. O Universo observável tem 93 bilhões de anos-luz de diâmetro, o que, em metros, dá 88 seguido de 25 zeros. Ainda são dois zeros a menos.

Mas acredite: esse é o número estimado de bactérias SAR11 presentes no oceano. Um Jairo de bactérias. Existem literalmente cem delas para cada metro de Universo. 1 em cada 4 seres vivos microscópicos nos oceanos são uma SAR11. É tão absurdo que vamos até deixar a fonte: artigo “SAR11 Bacteria: The Most Abundant Plankton in the Oceans”, publicado no periódico Annual Review of Marine Science.

Oceanógrafos da Universidade de Washington descobriram uma provável razão por trás do sucesso dessas criaturinhas endiabradas do papai Darwin.

E o lance é que esses vírus não só sequestram e destroem essas bactérias após se reproduzir (o que é a tática favorita da maioria dos vírus). Eles também estimulam as bactérias a se reproduzirem, gerando cópias de si mesmas que já nascem com o vírus à bordo. É uma tática de infecção bem mais sutil, chamada interação lisogênica. Para realizar tal feito, o vírus precisa inserir seu DNA no DNA da vítima. Se tornar parte dela.

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A questão é: por que sofrer uma infecção desse tipo daria à SAR11 qualquer vantagem na seleção natural – capaz de torná-la um dos seres mais abundantes dos oceanos? A resposta não está na interação lisogênica, e sim na interação lítica – que é quando o vírus assume seu lado cruel e começa a matar as hospedeiras em vez de se reproduzir pegando carona nelas.

De acordo com um artigo publicado pela equipe de Robert Morris na Nature Microbiology, conforme os vírus caminham de bactéria em bactéria, eles levam consigo pedacinhos de DNA de suas vítimas mais antigas para as vítimas mais novas, o que acabam funcionando como um método improvisado de transferência de tecnologia entre as bactérias SAR11. Elas ganham genes novos de suas companheiras mortas.

Isso aumenta a capacidade das bactérias SAR11 de concorrer com os demais seres vivos do ecossistema quando há privação de nutrientes. Afinal, conforme elas são infectadas, esses genes novos que vêm com os vírus podem conter instruções para codificar proteínas úteis, que aumentam as chances de sobrevivência de suas possuidoras em situações adversas.

A sobrevivência das bactérias SAR11 obviamente é de muito interesse para o vírus: quanto mais bactérias vivas, mais ele pode parasitá-las. Ou seja: paradoxalmente, a melhor estratégia para o vírus garantir seu suprimento de bactérias é matar algumas delas – acelerando a atuação da seleção natural sobre o grupo como um todo. Assim, ele garantir que a colônia de SAR11 evolua para sobreviver às adversidades. Nada como ter um parasita preocupado com você, não é mesmo?

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