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Brasileiros podem ter encontrado a solução para o 16º problema de Hilbert

O desafio proposto pelo matemático alemão David Hilbert ficou 124 anos sem resposta. Agora, pesquisadores da Unesp acreditam ter solucionado o problema.

Por Maria Clara Rossini
3 out 2024, 10h00

Um dos problemas matemáticos mais desafiadores da história, proposto há 124 anos, parece ter finalmente uma solução. Pesquisadores da Universidade Estadual Paulista (Unesp) deram um passo importante na resolução do 16º problema de Hilbert. A descoberta pode mudar nosso entendimento sobre sistemas dinâmicos e sua aplicação em áreas como criptografia quântica e segurança de dados.

David Hilbert foi um dos matemáticos mais influentes da história. Sua formulação mais famosa é provavelmente o Paradoxo do Hotel de Hilbert: em um hotel com infinitos quartos lotados, sempre é possível acomodar mais um hóspede ao mover todos os ocupantes para o quarto seguinte. O primeiro hóspede muda do quarto 01 para o 02; o do quarto 02 vai para o 03 e assim por diante. Esse exemplo demonstra a natureza bizarra dos conjuntos infinitos – e por que alguns deles são maiores que outros. 

Além de paradoxos, Hilbert se interessava por problemas matemáticos que ainda não estavam resolvidos. Em 1900, o matemático alemão apresentou uma lista de 23 problemas em aberto que moldariam o futuro da matemática no século 20. O problema 2, por exemplo, resultou nos Teoremas da Incompletude de Gödel. Alguns desses problemas foram provados algumas décadas depois. Outros ocupam as cabeças e lousas dos matemáticos até hoje.

Entre esses, a segunda parte do 16º problema, relacionada aos ciclos-limites em sistemas dinâmicos, permaneceu uma das mais difíceis de resolver. Agora, três pesquisadores brasileiros anunciaram um avanço significativo que pode finalmente encerrar o enigma. O estudo publicado na revista Entropy detalha o método utilizado na resolução do problema.

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O que é o 16º problema de Hilbert?

O 16º problema pode ser dividido em duas partes, pertencentes a áreas diferentes da matemática. A primeira, a grosso modo, consiste em entender quantas curvas ovais podem aparecer em certas circunstâncias no plano, e como elas estão dispostas. A segunda parte do problema pode ser expressa com a seguinte pergunta: quantos ciclos-limites podem existir em um sistema dinâmico descrito por equações diferenciais polinomiais de grau n?

Antes de explicá-lo, vale relembrar alguns conceitos. Aprendemos na escola que a equação ax + by = c  (em que a, b e c são valores fixos, e x e y são variáveis) resulta em uma linha no plano cartesiano. Já uma equação com elementos elevados ao quadrado é representada por uma curva – parábola, elipse, círculo ou hipérbole. Se elevarmos os elementos ao cubo, obteremos outro tipo de curva. Nesse contexto, chamamos essas equações de polinômios.

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Ciclos-limites, por sua vez, são basicamente trajetórias fechadas e isoladas, em que o movimento se repete após certo tempo. Eles podem ser usados para modelar o comportamento de sistemas naturais e artificiais – como as interações entre presa e predador na ecologia, ou o controle de temperatura em data centers ou osciladores em sistemas de comunicação. Como muitos fenômenos no mundo exibem comportamentos cíclicos e previsíveis, estudar ciclos-limites é uma maneira de compreendê-los e prever seu comportamento.

Já os sistemas dinâmicos são sistemas que evoluem no tempo. O estudo deles é feito por meio de equações diferenciais. 

Assim,  a pergunta central do nosso amigo alemão é: quantos desses ciclos podem existir em um sistema polinomial dinâmico e onde eles estão? Até recentemente, não havia uma resposta.

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Como o problema foi resolvido?

“Até então, os métodos usados para resolver o problema eram capazes de confirmar a existência de ciclos-limites, mas não diziam quantos ciclos existiam ou onde eles estavam. Ou seja: não resolviam a questão proposta por Hilbert originalmente. Isso, por sua vez, nos motivou a pensar diferente”, diz Vinícius, um dos autores do trabalho.

A inovação veio com o uso da Teoria Geométrica de Bifurcações (TGB), uma abordagem inovadora que permite explorar o comportamento de sistemas dinâmicos de maneira mais precisa. A TGB utiliza métricas geométricas e a curvatura escalar Riemanniana para identificar o número de ciclos-limites.

 “O que verificamos no trabalho é  que o número máximo de ciclos-limites em uma equação diferencial polinomial pode ser determinado pelo número de divergências da curvatura escalar para o infinito”, diz Vinícius. Os autores verificaram esse resultado para mais de 20 sistemas dinâmicos diferentes e com números variados de ciclos-limites.

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Quais são as implicações da descoberta?

Ciclos-limites são ferramentas poderosas para modelar e prever o comportamento de sistemas em diversas áreas da ciência e da tecnologia. Na biologia, eles são usados para entender dinâmicas populacionais e reações químicas periódicas. Na engenharia, são aplicados no desenvolvimento de sistemas de controle mais eficientes.

A aplicação mais importante do 16º problema de Hilbert está na cibersegurança, principalmente em sistemas bancários e financeiros. As oscilações periódicas e a sincronização de sistemas dinâmicos são a base para novos sistemas de comunicação seguros e criptografia quântica, fundamentais para a segurança de dados.

Os próximos passos da pesquisa, segundo os autores, incluem a extensão desses resultados para sistemas dinâmicos de dimensões superiores e a aplicação da TGB a problemas envolvendo mais variáveis e interações complexas, como os encontrados na mecânica quântica e em redes neurais.

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O estudo foi feito em conjunto com João Peres Vieira e Edson Denis Leonel, docentes dos departamentos de matemática e física da Unesp, respectivamente.

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