Como tomar decisões? Use a razão
Ela cuida do seu futuro e faz as contas para que as decisões só tenham resultados positivos. Mas é limitada — nem sempre a lógica dá conta de nossos dilemas
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Como tomar decisões
Lá vem dor de cabeça. É o que pensamos quando tomamos uma decisão importante, como mudar para uma nova casa. Aliás, casa ou apartamento? Em qual bairro? Com ou sem área de lazer? Processar todos esses cálculos parece um martírio para o cérebro. Mas nós temos um método bem bom para matar essa leva de trabalho, desenvolvido pelo córtex pré-frontal (a área do cérebro que fica logo atrás da testa e raciocina em cima dos nossos problemas). O sistema é simples: comparar tudo.
Se estamos indecisos entre alugar ou comprar um imóvel, o cérebro compara todas as consequências das duas opções. Ele não quer saber se você está prestes a realizar o sonho da casa própria — vai analisar, dado a dado, se o negócio vai ser mais vantajoso. Como um contador olhando um balanço.
Essa frieza toda é parte do papel que a razão tem nas escolhas. Ela está olhando para o nosso futuro — quer garantir sucesso no longo prazo, mesmo que a escolha pareça menos prazerosa no presente. É o contraponto aos sentimentos irracionais, como emoções e instintos, que se preocupam com o resultado imediato das nossas escolhas.
As primeiras decisões racionais do homem aconteceram entre 200 e 100 mil anos atrás, segundo Vitor Haase, médico e professor de psicologia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG): “Aconteceram por causa da evolução social”. Nessa época, o homem passou a fazer escolhas para preservar o clima de cooperação no bando. A primeira decisão racional pode ter ocorrido quando um homem conteve o impulso de roubar a esposa de outro. Ou evitou agredir um companheiro. E assim começamos listas de prós e contras para tudo.
COMIDA X RAZÃO
Há cerca de 15 mil anos, o homem aprendeu que deveria guardar comida. Era a razão avisando que tempos difíceis poderiam vir – e vencendo o instinto de sobrevivência. “Evoluímos em um ambiente de escassez. Nosso instinto nos manda usufruir os recursos quando eles aparecem”, diz Vitor Haase, da UFMG. Quem sofre com dieta passa pelo mesmo. É preciso ter muito foco na razão para barrar a vontade de comer.
A ciência passou a entender exatamente como a razão opera graças a um grave acidente. Aconteceu em 1848, com o americano Phineas Gage, então com 25 anos. Gage trabalhava na construção de estradas de ferro nos Estados Unidos, quando se descuidou ao preparar uma explosão. A pólvora foi acionada antes do tempo e fez tudo ir aos ares — inclusive uma barra de ferro que atravessou o crânio de Gage.
Ele sobreviveu, mas teve uma sequela esquisita: ficou excessivamente racional. Não demonstrava emoções e não tomava decisões que fugissem à simples lógica de uma soma matemática. Na época, seu caso não pôde ser explicado pelos médicos. Só na década de 80 o neurologista português António Damásio, hoje professor da Universidade do Sul da Califórnia, descobriu que o problema de Gage era o mesmo de pacientes que haviam passado por cirurgia para a retirada de tumores no cérebro. Como “Elliot”, cujo caso Damásio relata em O Erro de Descartes. “Não havia nunca sinal de seu próprio sofrimento”, escreveu. “Eu sofria mais quando ouvia as histórias de Elliot do que ele próprio.”
Como o trabalhador americano, os pacientes de Damásio escolhiam tudo com a razão. Passavam horas debatendo o que era melhor para escrever: caneta azul ou caneta preta. Damásio descobriu que Gage e seus pacientes haviam perdido uma área do córtex pré-frontal que interpreta emoções primitivas, fundamental para que o cérebro faça uma conferência entre nosso lado racional e nosso lado irracional. E que, sem sentimentos, escolhas banais ou complexas podem se tornar impossíveis. É o que você vê (ou será que já viu?) nas outras páginas desta reportagem.
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Se já leu sobre as 3 engrenagens, aprenda a usá-las aqui.
A RAZÃO NO COMANDO
O que é: O cérebro, graças ao córtex pré-frontal, pensa no bem do nosso futuro. E usa a lógica para julgar as consequências das decisões.
Quando usar: Quando o resultado da escolha impõe mudanças drásticas ou tem impacto no seu futuro. Como na hora de definir se você vai comprar um imóvel ou só alugar.
Quando não usar: Em situações que não são definitivas para seu futuro. Você pode, por exemplo, usar as emoções para decidir se vai ao bar com os amigos.