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Deu branco

Conheça os diferentes tipos de amnésia, as dificuldades de uma vida sem lembranças e de que maneira a memória pode ser cuidada

Por Mariana Sgarioni
Atualizado em 31 out 2016, 18h50 - Publicado em 19 Maio 2012, 22h00
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  • O narrador, introspectivo, mergulha um bolinho dentro de uma xícara de chá. Nesse momento, sente um aroma e um sabor que trazem as lembranças das manhãs de domingo de sua infância. “E toda minha vida passada saiu naquele momento, daquela xícara de chá”, escreveu Marcel Proust em sua mais famosa obra, Em Busca do Tempo Perdido.

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    A memória é assim mesmo: uma incrível biblioteca, com fileiras e fileiras de arquivos, que podem ser acessados imediatamente com base em um estímulo qualquer, como um som, um cheiro, um gosto, um toque. E nesses arquivos, formados por 100 bilhões de neurônios, sempre há espaço para novidades, como novas pessoas, ou até um número de telefone que somos capazes de lembrar – ou esquecer – num piscar de olhos.

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    O problema é que nosso maravilhoso sistema de arquivos pode ficar “lotado” ou simplesmente desaparecer. “O aspecto mais notável da memória é o esquecimento”, afirma James McGaugh, professor de neurobiologia da Universidade da Califórnia. Nós não guardamos a maior parte dos fatos que vivenciamos, dos livros que lemos, das imagens que vemos. Mesmo da nossa infância, quando fazemos mais descobertas, esquecemos quase todas as coisas.

    Até aí, normal. A formação e a evocação da memória mobilizam e ocupam muitas células, e é necessário liberar um espaço de vez em quando. Na verdade, é importante esquecer as coisas para que a cabeça não vire um depósito de lixo – ora inútil, ora traumático. Nada melhor do que se livrar de nossos sofrimentos. O problema é perder o controle do esquecimento. Esse fenômeno, conhecido como amnésia, é uma das questões mais intrigantes da medicina.

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    Na cabeça
    Para entender como a memória se apaga, é preciso lembrar antes como ela se forma. O processo é bastante complexo – trata-se de um fenômeno biológico e psicológico, que envolve uma aliança de diferentes sistemas cerebrais que funcionam em conjunto.

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    Não se sabem ao certo todas as várias partes envolvidas, mas os indícios são de que ele seja coordenado pelo hipocampo – responsável pela formação das memórias – e pela amígdala – associada às memórias emocionais. Tudo é ativado por sinapses cerebrais, que liberam determinadas substâncias químicas (neurotransmissores), dependendo do tipo de memória que é evocado no momento. Existem 3 tipos básicos: memória ultrarrápida (retida por alguns segundos, como um número de telefone), a de curto prazo e a de longo prazo.

    A amnésia acontece quando esse sistema entra em pane – por exemplo, por doenças neurodegenerativas, como o mal de Alzheimer, infecções e derrames, pancadas na cabeça, traumas psicológicos, alcoolismo e uso de drogas.

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    Isso é diferente de uma simples falha de memória, que ocorre o tempo todo devido à redução do número de sinapses cerebrais e de neurônios. Se essa redução acelerar, aí sim podemos falar em amnésia – que pode valer para informações novas (a amnésia anterógrada) ou para as antigas (amnésia retrógrada).

    Apesar de não existir um tratamento específico da amnésia, é possível recuperar pelo menos parte da memória, dependendo da extensão e da gravidade da lesão cerebral, com exercícios como a exposição dos pacientes a estímulos novos ou a fragmentos das memórias a serem evocadas, terapia ocupacional e, em alguns casos, medicamentos.

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    “Pesquisadores estão investigando diversos neurotransmissores envolvidos na formação da memória, que pode um dia levar a novos tratamentos. Mas a complexidade dos processos cerebrais envolvidos torna improvável que um só medicamento resolva todos os problemas de memória”, afirma Larry Squire, professor de psiquiatria da Universidade da Califórnia, em San Diego.

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    Mas o mais difícil mesmo é recuperar a capacidade de guardar novas informações – a amnésia anterógrada. Para isso, especialistas sugerem que o melhor tratamento é a prevenção. E aí valem as medidas clássicas, como não fumar, não beber, praticar exercícios físicos, manter uma dieta equilibrada e, principalmente, botar a cabeça para funcionar.

    “O melhor exercício é a leitura porque abrange todas as formas de memória: a memória visual, verbal, motora, a memória de curta duração e de longa duração, a memória de imagens”, afirma o neurocientista Ivan Izquierdo. “A pessoa lê ‘árvore’ e movimenta as cordas vocais de acordo com o som da palavra. Num instante, também, passam por sua cabeça todas as árvores que é capaz de lembrar. Lê ‘árvores secas’ e se lembra de um poema.” Segundo Izquierdo, a memória é a expressão mais acabada de que a função faz o órgão. Ela funciona melhor quanto mais se utiliza. Tanto que até a doença de Alzheimer é menos grave nas pessoas com cultura elevada. Quanto mais sinapses, menor o prejuízo.

    Nossa memória está diretamente ligada à nossa história, ao que somos – daí a importância de cuidar bem dela. Para o pensador italiano Norberto Bobbio, “nós somos aquilo do que nos lembramos”. Izquierdo acrescenta: “Somos também aquilo que escolhemos esquecer”.

     

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    Os tipos de memória…

    Processual
    Armazena o modo de fazer as coisas – por exemplo, como dar laço no cadarço.

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    Visual
    Registra imagens como rostos e lugares. Assim, você pode desenhar um elefante sem que ele esteja diante de você.

    Episódica
    Guarda acontecimentos da sua vida – desde o que você comeu de café da manhã até o seu primeiro beijo.

    Topo­cinética
    Grava a posição e o movimento do corpo no espaço. Graças a ela, você consegue caminhar automaticamente até a sua casa.

    Semântica
    Guarda palavras, raciocínios e o sentido das coisas.

     

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    …e de amnésia

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    Síndrome de Korsakoff
    É um tipo grave de amnésia, decorrente do alcoolismo. Seu portador não consegue reter novos acontecimentos.

    Amnésia traumática
    Quem sofre trauma no crânio pode esquecer o que ocorreu logo antes e depois do acidente. Quanto maior for o trauma, mais prolongada será a amnésia.

    Amnésia global
    Não se retêm informações novas nem antigas. Ocorre em demências, traumas muito graves e intoxicações por monóxido de carbono.

    Amnésia global transitória
    Dura apenas algumas horas, e a recuperação é quase total. A causa não está ainda esclarecida.

    Amnésia psicogênica
    É temporária e ocorre devido a traumas psicológicos. Pode ser tanto anterógrada como retrógrada. Raramente há a perda permanente de trechos de sua vida.

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    Para saber mais

    A Arte de Esquecer – Cérebro, Memória e Esquecimento
    Ivan Izquierdo, Vieira & Lent, 2010.

    Memória
    Ivan Izquierdo, ArtMed, 2002.

     

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