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Ondas gravitacionais “graves” de buracos negros levam 30 anos para cruzar a Terra

O ronronar retumbante dos buracos supermassivos no centro de galáxias, que ecoa no tecido do espaço-tempo, foi detectado pela primeira vez indiretamente, pela maneira como ele interferem com os pulsos de luz de 67 estrelas de nêutrons.

Por Bruno Vaiano Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 3 jul 2023, 14h44 - Publicado em 29 jun 2023, 14h04

Todo interessado em astronomia já leu a expressão “tecido do cosmos” – seja aqui na Super, seja em algum livro do Carl Sagan. A metáfora é boa: embora o espaço seja, obviamente, um vazio tridimensional, é mais fácil explicar algumas coisas quando partimos do pressuposto de que o Universo é um mapa, uma representação achatada de si mesmo.

Uma dessas coisas é a gravitação de Einstein. O bigodudo concebeu o espaço e o tempo não como um oco infindável, mas como um tabuleiro em que se apoia a realidade. A massa de corpos como estrelas e planetas deforma o espaço-tempo, da mesma forma que seus pés deformam a superfície de uma cama elástica.

Quando isso acontece, a trajetória dos corpos ao redor se altera – afinal, as coisas se movem no espaço, e se o espaço muda, o movimento muda também. Essa é a gravidade. A Terra se move no espaço-tempo deformado pela presença do Sol. E você se move na deformação menor causada pela presença da Terra.

Alguns eventos cósmicos, como a colisão de buracos negros, são tão cataclísmicos que fazem o espaço-tempo oscilar, como se você estivesse sacudindo um lençol para cima e para baixo. Tudo que está apoiado no Universo (como a Terra) sofre uma ligeira sacudida conforme esse soluço no tecido da realidade se propaga.

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Essas são as ondas gravitacionais. Einstein previu sua existência no comecinho do século 20 um século depois, em 2015, elas foram detectadas pelo observatório americano Ligo (um par de gigantescos sensores chamados interferômetros, que usam cada um dois raios laser com 4 km de comprimento dispostos em “L”).

Se pudéssemos ouvi-las, elas seriam mais graves ou mais agudas, exatamente como notas musicais. Essa é uma característica que depende da frequência e do comprimento de uma onda: as mais longas e lentas são graves, as mais curtas e rápidas são agudas.

Até hoje, o Ligo e um observatório-irmão europeu chamado Virgo haviam detectado apenas colisões entre buracos negros pequenos, com menos de duas vezes a massa do Sol. Elas geram ondas agudas, de frequência mais alta.

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Agora, os astrônomos detectaram, pela primeira vez, ondas mais graves e dispersas. Elas provavelmente resultam da colisão de buracos negros supermassivos, com milhões ou bilhões de vezes a massa do Sol (a mesma lógica por trás do fato de que baixos são maiores que guitarras). São tão longas que um único pulso demora 30 anos para atravessar a Terra.

Esses monstros funcionam como âncoras gravitacionais localizadas no centro de galáxias, e esse grunhido cósmico não é oriundo de uma única colisão, e sim o resultado difuso da combinação de incontáveis colisões rolando no Universo ao longo de 8 bilhões de anos. Algo como estar em um estúdio, com várias bandas tocando em salas diferentes, ouvindo apenas um resquício abafado do som de cada uma delas.

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O resultado foi possível graças a uma coleta de dados que durou quinze anos e envolveu 190 cientistas de várias universidades mundo afora, bem como três telescópios que captam ondas de rádio, ou seja: ondas de luz compridas demais para serem vistas por nossos olhos.

Não, o Ligo e o Virgo não participaram: a detecção, desta vez, foi feita de maneira indireta. Em vez de coletar diretamente a perturbação causada pela passagem das ondas gravitacionais, que seria virtualmente imperceptível, os pesquisadores mediram a maneira como elas interferem com os pulsos de luz emitidos por 67 estrelas de nêutrons distantes.

A colaboração se chama Observatório Norte-Americano de Detecção de Ondas Gravitacionais em Nanohertz, conhecida pela sigla em inglês NANOGrav. Os resultados foram publicados hoje no periódico especializado Astrophysical Journal Letters e não têm paywall: você pode ler o artigo aqui gratuitamente se quiser (e conseguir, rs).

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Os astrônomos avaliam que a chance do fenômeno ser uma flutuação aleatória nos dados é de apenas uma em dez mil (o que já é espetacular, mas ainda não alcança o padrão-ouro para decretar uma observação entre físicos, que é de uma em um milhão).

Ou seja: é bem provável que o Universo não seja um palco estático para nossa existência, e sim algo mais próximo de um gigantesco gatinho ronronando um cenário provavelmente infinito que vem reverberando, há bilhões de anos, o rumor grave e discreto dos atores que estão interagindo lá em cima.

Para agradecer aos leitores que chegaram ao fim do texto, eis o gato:

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