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População de anfíbio raro é descoberta no sul da Bahia

A ideia, agora, é batizar a L. viridis com um nome popular – para aumentar a conscientização do público sobre a espécie, tão desconhecida que sequer havia informações sobre seu risco de extinção.

Por Guilherme Eler
Atualizado em 14 out 2020, 16h48 - Publicado em 9 out 2020, 21h21

A Lista Vermelha da IUCN (União Internacional para a Conservação da Natureza) é a principal referência do planeta no que diz respeito à situação de animais ameaçados de extinção. Em seu banco de registros online, que você pode acessar clicando aqui, há dados sobre uma infinidade de espécies que correm o risco de sumir do mapa como a localização mais comum, os artigos científicos que as descrevem e a quantidade estimada de indivíduos que ainda restam na natureza.

Por lá, é possível puxar a ficha de espécies brasileiras quase desconhecidas, como o saium de coleira (Saguinus bicolor), sagui albino que vive na região de Manaus, ou o pato-mergulhão (Mergus octosetaceus), ave aquática endêmica do Brasil e que está entre as mais raras do mundo –  e cuja existência é considerada “criticamente ameaçada” pela IUCN.

O problema é que, por vezes, o sistema esbarra na falta de dados: há espécies que, de tão raras, não possuem informações organizadas. É o que acontece com a Leptodactylus viridis, rã nativa do sul da Bahia e que já foi encontrada também no norte de Minas Gerais. Em seu perfil no banco da IUCN, não dá para saber, por exemplo, quantos exemplares ainda restam na natureza. Não à toa, a IUCN se limita a classificar o anfíbio na categoria “dados deficientes”.

Um projeto organizado por pesquisadores da UESC (Universidade Estadual de Santa Cruz) em parceria com uma empresa da região, porém, pode ser uma chance de diminuir essa carência de informações. Após um levantamento da fauna de vertebrados na região da Mata Atlântica ao redor da fábrica da Avatim, companhia de cosméticos com sede em Ilhéus, no sul da Bahia, cientistas encontraram a maior população de L. viridis de que se tem notícia atualmente.

Bastou uma expedição de campo para que o grupo, que conta com três professores e dois pesquisadores da UESC, encontrasse 18 espécies de anfíbios na área da fábrica. Na segunda visita, foram mais duas e, de acordo com estimativas dos pesquisadores, há chances de que pelo menos 40 morem na região, que soma 17 hectares.

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Nesse balaio havia desde espécies conhecidas, como o sapo ferreiro (Boana faber), a perereca-de-moldura (Dendropsophus elegans) ou a perereca-de-folhagem (Phyllomedusa burmeisteri), mas também bichos com distribuição mais restrita como Adenomera thomei, Scinax juncae e Sphaenorhynchus prasinus, por exemplo, que não têm nome popular. Mas um dos barulhos que os cientistas ouviram destoava completamente do produzido por todas essas espécies.

“Já na primeira saída, ficamos intrigados com um canto que não conhecíamos. Logo descobrimos que quem o produzia era a L. viridis. Na primeira noite, conseguimos encontrar três indivíduos e, na segunda, mais dois”, diz em entrevista à SUPER Mirco Solé, professor da UESC que coordena o projeto. Alemão de nascimento, Solé pesquisa sapos, rãs e pererecas no Brasil há 22 anos e, desde então, assinou a descoberta de seis espécies de anfíbios nacionais inéditas.

Como você, leitor da SUPER, talvez se lembre, esse trabalho começa quando cientistas se deparam com um exemplar exótico durante uma visita de campo. No caso de anfíbios, explica Solé, poças e riachos costumam ser os ambientes mais promissores.

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“[Na expedição ao redor da fábrica] procuramos em poças, claro, pois é nelas que se reproduzem a maioria dos anfíbios brasileiros, mas também investigamos a serrapilheira das cabrucas (plantações de cacau sombreadas por árvores nativas da Mata Atlântica), pois algumas espécies colocam ovos diretamente no chão da floresta”, conta. Outra técnica comum é o uso de gravadores para captar o canto das espécies cada anfíbio tem uma voz única forma como a L. viridis se revelou ao grupo.

Encontrada em 1973 e descrita pela primeira vez num artigo científico publicado em 1979, a L. viridis costumava dar as caras na região de Itagibá, sul da Bahia. Mas existe a suspeita de que a espécie esteja desaparecida por lá também. “Ela precisa de um tipo de ambiente que está sumindo: poças abertas em áreas bem próximas de florestas. Inclusive, diversos especialistas têm visitado as poças na localidade tipo em Itagibá durante as últimas décadas e não têm mais encontrado a espécie por lá”, diz Solé. “A poça na Fazenda Avatim pode representar uma das últimas populações desta espécie”.

A ideia é que que os dados reunidos ao longo do projeto permitam aos cientistas recomendar uma categoria de ameaça [da Lista Vermelha da IUCN] para espécie. E também colocar a L. viridis de vez no mapa de pesquisadores e ambientalistas. Para isso, um passo importante é a criação de um nome popular, que aproxime o bicho ao local de onde ele vem e facilite a comunicação com a sociedade sobre a importância de sua conservação.

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Apesar de ser natural do Brasil, a L. viridis é mais conhecida entre a comunidade científica como “Jim’s white-lipped frog” (rã-de-lábios-brancos de Jim, em tradução livre do inglês). Trata-se de uma homenagem ao cientista Jorge Jim, falecido em 2011, que estava no grupo que primeiro identificou a espécie na natureza e teve grande contribuição para a herpetologia ramo dedicado ao estudo de répteis e anfíbios – brasileira.

O objetivo dos pesquisadores, agora, é que um novo nome popular, mais simples, seja escolhido por um concurso de taxonomia cidadã “no qual pessoas da região participam da sugestão de nome via redes sociais, por exemplo, e posteriormente da votação”, explica Solé. Ainda não há uma data para a realização do concurso, mas nós, da SUPER, já temos uma dica: por que não aproveitar a região de origem da rã e fazer uma homenagem à obra de Jorge Amado? Ou, ainda, uma referência ao cacau, fruto que gerou décadas de fartura ao sul da Bahia, quem sabe? Referências não faltam.

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