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Tubarões-brancos voltam a habitar costa do nordeste dos EUA

Medidas de conservação conseguiram salvar a espécie, que estava quase sumida da região. Mas isso levanta preocupações sobre ataques contra humanos.

Por Bruno Carbinatto
Atualizado em 5 ago 2020, 18h26 - Publicado em 5 ago 2020, 18h04

No dia 27 de julho, o estado do Maine, no extremo nordeste dos Estados Unidos, registrou a primeira morte causada por um tubarão-branco em toda a sua história. Uma mulher de 63 anos, natural de Nova York, foi atacada enquanto nadava na praia da Ilha Bailey. O episódio, apesar de raro, evidencia o retorno gradual da espécie aos mares da região nordeste do país nos últimos 20 anos, que indica um sucesso das recentes medidas de conservação, ao mesmo tempo que impõe um novo desafio de segurança pública.

Tubarões-brancos não são estranhos nas águas dos Estados Unidos, aparecendo nas regiões costeiras do oeste e do leste do país. Mas, em geral, esses peixes se concentram mais no sul do país, em estados como Flórida e Califórnia, e são menos presentes nas regiões frias do norte. Na águas atlânticas da Nova Inglaterra (subdivisão que contém os estados do nordeste dos EUA, como Maine e Massachusetts), a presença de tubarões-brancos vinha caindo vertiginosamente nas últimas décadas. Um estudo de 2014 estimou que, na década de 1980, a população de tubarões-brancos no Atlântico norte do país correspondia a apenas 27% do número dos bichos existentes na década de 1960.

Essa diminuição drástica se deu principalmente pelo aumento da caça de tubarões, tanto na modalidade esportiva quanto na chamada pesca acidental (bycatch) – quando tubarões acabam sendo capturados por redes de navios comerciais que estão pescando peixes menores. Tubarões-brancos são especialmente vulneráveis a intervenções humanas porque a espécie se reproduz muito pouco em relação a outros animais marinhos.

A situação ficou tão feia que, em 1972, o governo americano decidiu agir para evitar que a espécie sumisse de vez da região. Uma das medidas foi proibir a caçada de focas na região – esses animais eram mortos indiscriminadamente por pescadores porque se alimentavam de vários peixes de interesse comercial. E focas são as presas mais comuns de tubarões-brancos, o que significa uma maior disponibilidade de comida para os predadores prosperarem.

Mas foi só em 1997 que, com registros alarmantes sobre as populações de tubarões, o governo baniu definitivamente a pesca deliberada desses animais. Combinadas, as medidas ajudaram os tubarões a voltarem à região aos poucos. O primeiro local a ver seu número de tubarões-brancos aumentar foi o Cabo Cod, no estado de Massachusetts, ainda nos anos 2000. Em 2004, a captura acidental de uma fêmea de tubarão-branco ganhou o noticiário da região por ser um episódio raro na época. Nos anos seguintes, porém, isso começou a ficar cada vez mais comum, e agora a espécie está se espalhando para o resto das praias do nordeste do país.

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Não há dados concretos sobre o número de tubarões-brancos na região da Nova Inglaterra. Mas um programa de identificação dos animais e de implementação de pequenos chips para rastreá-los liderado belo biólogo Gregory Skomal, da Divisão de Pesca Marítima de Massachusetts, indica que o número vem crescendo muito nos últimos anos. Somente em 2019, a equipe do pesquisador registrou mais de 50 espécimes do animal na região do Cabo Cod, um recorde desde que o programa começou, em 2009. Além disso, avistamentos dos tubarões por pescadores e cadáveres de focas com marcas de mordidas também estão em ascensão.

Uma outra forma de evidenciar o retorno dos tubarões-brancos à costa nordeste do país é através de ataques a humanos. Apesar de extremamente raros, eles acontecem quando a população do animal é grande o suficiente. Desde 2012, houve seis casos de ataques na região – cinco em Massachusetts e o novo ataque em Maine, que é o primeiro da história do Estado e também um dos dois que terminaram na morte da vítima. Antes disso, o último ataque a um humano na região aconteceu em 1936. Um aumento tão significativo em termos proporcionais e em tão pouco tempo indica que o desafio de conservação da espécie parece ter sido vencido, mas um novo problema de segurança da população surgiu.

Apesar de temidos pelo imaginário popular e explorados em filmes de terror, os tubarões-brancos não são monstros assassinos de humanos. Os ataques acontecem, em geral, porque os animais nos confundem com focas nadando na superfície. Prova disso é que, na enorme maioria dos casos, o tubarão só dá uma mordida e solta ao perceber que não somos um bom almoço. O problema é que, se tratando de um animal que pode chegar a 6 metros e pesar mais de uma tonelada, apenas uma “mordidinha” causa danos severos que podem levar a morte pela perda de sangue ou a amputações de membros.

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O novo ataque registrado em Maine, bem como os ataques recentes em Massachusetts, criaram um grande medo na população local, e houve quem propusesse a caçada dos bichos para proteger os banhistas – algo que vai claramente contra os esforços de conservação das últimas décadas. A preocupação se esplahou também para a região da Nova Escócia, na costa leste do Canadá (e portanto logo ao norte de Maine), onde não houve nenhum ataque registrado, mas tubarões-brancos foram avistados e focas mortas já foram encontradas recentemente.

Felizmente, é possível conviver com relativa segurança em locais onde há tubarões, e não é preciso matar as populações dos bichos, como provam países como África do Sul, Nova Zelândia e Austrália, e até mesmo outras regiões dos Estados Unidos, como Califórnia e Flórida, que são considerados hotspots desses animais. Medidas de segurança, que vão desde placas alertando sobre a presença de tubarões em praias até o uso de roupas de mergulho e de surf listradas – que deixam bem claro para os tubarões que nós não somos focas. Há até tecnologias que utilizam campos elétricos para criar “repelentes” contra tubarões nas águas de praias turísticas, embora ainda não estejam sendo usados em grande escala.

Todos os anos, a humanidade mata quase 100 milhões de tubarões, segundo estimativas. Além da pesca ilegal, o que explica toda essa matança é a demanda pela carne e pelas barbatanas do animal – consideradas iguarias em países como China e Vietnã. Não é exclusividade da Ásia: aqui no Brasil, o “cação” também é consumido, embora o termo se refira a várias espécies de peixe, e não necessariamente a tubarões.

 

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