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Alexandre Versignassi

Por Alexandre Versignassi Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO
Blog do diretor de redação da SUPER e autor do livro "Crash - Uma Breve História da Economia", finalista do Prêmio Jabuti.

Chorar é bom, sim

  Escrever é tão gostoso quanto expelir pedras do rim – só tem graça quando termina. Acabei de dinamitar um mês de férias para terminar um livro. Um paralelepípedo renal, no caso, formado por três anos de apuração. Criei uma UTI privativa para dar conta do processo todo. Uma unidade intensiva com os equipamentos ideais […]

Por Alexandre Versignassi Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 21 dez 2016, 09h48 - Publicado em 1 jul 2014, 13h31

 

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Escrever é tão gostoso quanto expelir pedras do rim – só tem graça quando termina. Acabei de dinamitar um mês de férias para terminar um livro. Um paralelepípedo renal, no caso, formado por três anos de apuração. Criei uma UTI privativa para dar conta do processo todo. Uma unidade intensiva com os equipamentos ideais para produzir um livro de não-ficção: computador novo, notebook rápido, dois iPads, para ter pelo menos dois livros-fonte ao alcance dos olhos ao mesmo tempo, mais a minha biblioteca de livros de verdade atrás de mim, a uma esticada de braço de distância. Foi a minha Copa particular. Só me desligava desses tubos de vez em quando, para respirar  (e a Copa de verdade ajudou bem nesses momentos…).

Mas uma hora deu tilt. Depois de uns 20 dias nessa, as pedras deixaram de fluir. Também não estava contente com as que já tinham saído.

Estava a um passo de jogar fora os três anos que já tinha gasto no livro. Mais do que isso: de jogar fora boa parte dos próximos trinta, quarenta anos que tenho para gastar de vida. Seria o meu momento Barbosa: uma falha que redefine o resto da existência. Irreversível.

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No dia em que eu senti isso para valer, saí para correr à noite, ver se arejava as sinapses. Mas faltou combinar com os músculos das pernas: depois de tanto tempo parados na minha UTI, eles respondiam a cada passada com uma dor mais paralisante que a outra. Forcei mesmo assim. Não aguentei. Forcei de novo. E a dor muscular se juntou com a da cabeça. Aí que ferrou de vez.

Comecei a chorar no canteiro da Avenida Sumaré. Mas não parei de correr. E uma hora as coisas começaram a clarear. A endorfina do esforço estava aliviando a dor nas pernas. A do choro, suavizando a da cabeça. E o livro começou a tomar uma forma nova lá dentro. A história que eu queria contar apareceu na minha frente, com começo, meio e fim. Voltei para casa e fui amarrando as pontas que estavam soltas. Tudo encaixava. A catarse fez a minha cabeça fundida pegar no tranco.

Não foi a primeira vez que isso aconteceu comigo, claro. Todo mundo precisa desse tipo de momento para retificar o motor dos neurônios, principalmente quando o peso do sonho começa a paralisar a realidade. Chorar é bom para quem vive de tirar pedras dos rins. E, no fundo, todo mundo vive disso.

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No futebol não é diferente. Como o Tostão escreveu na coluna dele hoje: o que salva a seleção é o envolvimento emocional dos jogadores. De fato. Neymar e Thiago Silva, os que mais choram, são também os que mais jogam – dentro ou fora das condições normais de pressão. Se não chorassem, aí é que o barco já tinha afundado mesmo.

O jogo agora é contra o melhor time da Copa. O motor da Colômbia está tinindo. O nosso não: ainda precisa de retífica. Que a emoção sirva de óleo para as engrenagens do time, então. Ganhar pela competência pura, sem a dúvida interna que as lágrimas escancaram, não teria a mesma graça. Não seria uma história intensa, uma narrativa com começo, meio e fim capazes de nos envolver, de realmente espelhar as emoções que movem as nossas vidas. E é só para isso que o futebol serve. É só para isso que todas as formas de arte servem.

 

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