Desde quando existem absorventes? Como as mulheres se viravam antes deles?
Em todas as sociedades, o assunto sempre foi tratado como tabu, então é difícil investigá-lo – mas temos algumas pistas. Confira.

Ao longo da história, vários povos desenvolveram tecnologias para lidar com a menstruação. Algumas se pareciam com absorventes contemporâneos, outras nem tanto. Ou seja: não faz sentido dividir a História entre antes e depois do Modess. Além disso, o assunto foi (e ainda é) tratado como tabu, o que torna difícil investigá-lo.
Feitas essas ressalvas, vamos à resposta: os gregos já enrolavam fiapos de pano em pedaços de madeira para usar como O.B. Entre indígenas da América do Norte, tiras de pele de búfalo cumpriam o papel de absorventes externos. Já na Roma Antiga, os tampões eram feitos de lã e podiam ser embebidos em ópio para aliviar cólicas – uma combinação que foi vendida em farmácias até o século 19.
Os produtos que encontramos na farmácia hoje em dia são bem mais recentes. Na virada do século 19 para o 20, a preocupação com higiene e o aumento da produção industrial permitiu que os países industrializados criassem novas soluções.
Em 1896, a Johnson & Johnson lançou as Lister’s Towels, calcinhas com o forro trocável e lavável. Era uma cinta sanitária, que ainda precisava ficar presa ao redor do corpo. Entretanto, o produto foi retirado do mercado já que a moralidade norte-americana impedia a publicidade desses produtos.
Alguns anos depois, durante a Primeira Guerra Mundial, enfermeiras francesas descobriram que o material de celulose usado para enfaixar ferimentos absorvia melhor o sangue menstrual do que as fraldas de pano. A marca Kotex foi a primeira a comercializar absorventes descartáveis feitos desse material, em 1918.
Ao contrário da invenção da Johnson, essa pegou. Tinha tudo a ver com aquele momento de crise – as mulheres começaram a trabalhar fora de casa para substituir os homens que estavam na guerra e, aos poucos, conquistavam autonomia financeira e sobre o próprio corpo. Já não era sem tempo.
(A variação que é usada hoje, que pode ser grudada diretamente nas calcinhas com um adesivo, só começou a circular em 1969, lançados pela Stayfree.)
Os absorventes internos surgiram em 1931, feitos de algodão compacto e acompanhados de um aplicador de papelão parecido com uma seringa, que ainda é utilizado hoje em dia, em versões de plástico. Eles começaram a ser comercializados em 1936, quando a patente foi comprada pela marca Tampax.
O produto foi polêmico: de um lado, houve quem defendesse que eles eram mais higiênicos do que os absorventes externos e menos suscetíveis a provocar infecções (o que ainda gera debate, diga-se). De outro, muita gente, inclusive de igrejas cristãs, consideravam que a inserção de algo na vagina era uma ameaça à pureza e à virgindade.
Mas a popularidade venceu a discussão: as vendas de Tampax quintuplicaram nos primeiros sete anos no mercado e, mesmo quando as fábricas norte-americanas precisaram focar em produzir curativos cirúrgicos e bandagens para a Segunda Guerra Mundial, a produção dos absorventes internos não diminuiu.
O famoso nome O.B. só veio mais tarde, cunhado pela ginecologista alemã Judith Esser-Mittag nos anos 1940. A sigla vem do alemão, ohne Binde, ou “sem bandagem” e serviu para nomear o primeiro absorvente interno sem aplicador.
Alternativas
Embora os absorventes internos e externos sejam os mais utilizados até hoje, outras tecnologias são utilizadas para tornar a menstruação mais confortável e menos agressiva ao meio ambiente (afinal, absorventes descartáveis produzem muito lixo e não são biodegradáveis).
Uma das mais famosas é o coletor menstrual, um copinho de silicone inserido na vagina. Depois de jogar o sangue coletado fora, é possível esterilizá-lo para reutilização.
O copinho começou a ganhar popularidade no Brasil nos últimos anos, mas está longe de ser novidade. A primeira patente para um coletor menstrual foi instituída em 1937 nos EUA, criada pela atriz, empresária e autora norte-americana Leona Chalmers. Duas décadas depois, ela atualizou o design para um produto de borracha, muito parecido com o que temos hoje. Mais uma vez as guerras entraram no caminho: a escassez de borracha durante a Segunda Guerra fez a tecnologia cair em desuso.
Bem depois, ao longo da década de 1980, os coletores voltaram a circular entre a comunidade mais alternativa norte-americana. Mas não se engane: falar abertamente sobre menstruação ainda era tabu no Ocidente. A primeira vez que a palavra period foi utilizada com o significado de menstruação na TV dos EUA foi em 1985, quando a atriz Courtney Cox estrelou uma propaganda de Tampax.
Mas se engana quem pensa que o problema está resolvido. Segundo a Unicef (1), quatro milhões de meninas sofrem com pelo menos uma privação de higiene nas escolas do Brasil, ou seja, sem acesso a absorventes, banheiros ou sabonetes.
Outra pesquisa (2) mostra que uma em cada quatro brasileiras já precisou utilizar panos, papel higiênico ou jornal por falta de dinheiro. São soluções improvisadas – e inseguras. Os tempos de “se virar” sem absorventes ainda não ficaram para trás.
Pergunta de Oriane N. Baum, via e-mail
Fonte: (1) Pobreza Menstrual no Brasil: desigualdade e violações de direitos, Unicef; (2): “A relação das brasileiras com o período menstrual e o fenômeno da pobreza menstrual”, 2022, Instituto Locomotiva e P&G. Livros The Curse: A Cultural History of Menstruation e The Hippocratic Oath and the Ethics of Medicine.