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Para historiador, só os japoneses vão se lembrar do terremoto

Por Redação Super
Atualizado em 21 dez 2016, 08h50 - Publicado em 22 mar 2011, 17h31

Por Felipe van Deursen


Kesennuma, Japão, após o terremoto. Foto: Getty Images

Por mais chocantes que sejam as cenas de desastre e horror que vemos desde sexta-feira passada, o terremoto de 9 graus de magnitude que assolou o Japão não ficará muito tempo na memória das pessoas. É o que afirma o historiador britânico Edward Paice, autor do livro A Ira de Deus, sobre o terremoto que destruiu Lisboa em 1755.

Apesar do maremoto, do número de mortos que já passa dos 9 mil, da crise nuclear, dos prejuízos colossais ao país, Paice afirma que a humanidade tende a esquecer rapidamente grandes tragédias. Um exemplo, segundo o historiador, é a Caxemira, região entre Índia e Paquistão que sofreu um terremoto há menos de seis anos e teve cerca de 10 vezes mais mortos.

Em seu livro, Paice defende a ideia que o terremoto de Lisboa teve impactos diretos na sociedade ocidental. Teólogos e filósofos se viram confrontados com a brutal realidade de uma cidade próspera e opulenta reduzida a um cenário destruído por cinco grandes temores (o maior beirando os 9 graus de magnitude), um tsunami que sacudiu todo o Atlântico e um incêndio de uma semana que deixaram cerca de 40 mil mortos. Estava difícil acreditar em Deus. Era difícil enxergar o lado cheio do copo. Tanto que Voltaire se baseou no terremoto para atacar a filosofia hegemônica da época, chamada de otimismo. “Foi o prenúncio do Iluminismo”, afirma Paice.

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Leia a entrevista com o historiador abaixo:

Certo, a gente sabe que há um espaço de 366 anos com grandes diferenças tecnológicas, científicas, religiosas e filosóficas entre o grande terremoto de Lisboa de 1755 e este do Japão. Mas podemos criar um paralelo entre eles?
É impressionante que a experiência das vítimas não foi diferente, seja em 2011 ou em 1755. E os terremotos têm vários pontos em comum. Ambos foram submarinos, de magnitudes e intensidades semelhantes. Os dois geraram teletsunamis, que são maremotos cujas ondas viajam mais de 1000 quilômetros. No mais, os terremotos atingiram potências globais de suas épocas, gerando uma preocupação, até mesmo um pânico, nos mercados financeiros.

O sr. afirma no livro que o terremoto de Portugal mudou a História, especialmente a do país e a de suas colônias. Ele também influenciou a filosofia e a teologia. Baseado na experiência portuguesa, o que se pode esperar das consequências do pior terremoto em uma nação acostumada a esse tipo de desastre?
Nenhum terremoto moderno pode alterar a filosofia e o pensamento humano como o de Lisboa pôde. Sob esse aspecto, o terremoto de 1755 é único na história dos desastres. Mas o terremoto de 1995 em Kobe, por exemplo, mostrou que os japoneses são capazes de se recuperar rapidamente (mesmo que a economia do país nunca mais tenha sido a mesma depois disso – o que também aconteceu com Lisboa).

Portugal, um dos países mais poderosos da época, enfrentava uma recessão econômica em 1755. Dependia bastante dos investimentos ingleses e tinha que lidar com o esvaziamento do ouro brasileiro. Hoje, o Japão, que há pouco perdeu o posto de segundo maior PIB do mundo para a China, também vive recessão e agora tem que lidar com o que já é apontado como a mais cara tragédia natural da história, com prejuízos que já teriam chegado a US$ 200 bilhões. Que lições o país pode tirar do terremoto português?
A consequência do terremoto apresenta desafios enormes, mas eles serão superados.  Muitos japoneses têm a esperança que o desastre chacoalhe os líderes políticos, vistos por muitos como egoístas e limitados. Assim como Lisboa em 1755, que proporcionou ao futuro marquês de Pombal [que conduziu a reconstrução da cidade] uma oportunidade de dar um silencioso golpe palaciano, o Japão precisa desesperadamente de liderança para ter uma recuperação rápida e organizada.

Como o senhor acha que o terremoto no Japão será lembrado no futuro?
Em 20 anos, não acho que o terremoto japonês será lembrado pelas pessoas comuns de fora do país. [O terremoto de] Kobe é pouco conhecido hoje em dia. Do de 2005 na Caxemira [onde cerca de 80 mil morreram] ninguém se lembra. Poucos europeus fora de Portugal sequer ouviram falar do terremoto de 1755. Talvez seja um sinal da humanidade, que nós rapidamente esquecemos algumas coisas.

Pode-se dizer que, dadas suas consequências na História, o terremoto de Lisboa foi o mais importante de todos os tempos?
Eu realmente acredito que de todos os desastres naturais da História, Lisboa é um dos poucos que tiveram um longo alcance, gerando consequências bem longe das fronteiras de Portugal. Isso porque foi o catalisador do pensamento ocidental. Foi o prenúncio do Iluminismo.

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